Hidrogênio verde passa no Senado com incentivo de R$ 18,3 bilhões

O Estado de S. Paulo

 

O projeto de lei que cria incentivos tributários para os produtores de hidrogênio verde foi aprovado ontem no Senado, criando incentivos fiscais no valor de R$ 18,3 bilhões entre 2028 e 2032. Além disso, a partir do ano que vem as empresas poderão abater tributos como PIS e Cofins para a instalação de unidades produtivas, o que deve somar mais R$ 5,5 bilhões por ano, segundo estimativas do governo.

 

Durante a tramitação, o relator do texto, senador Otto Alencar (PSD-BA), ampliou as fontes de energia que terão acesso a benefícios tributários, incluindo o etanol e as hidrelétricas.

 

A articulação ocorre no momento em que o Executivo federal questiona as renúncias tributárias da União – que somaram R$ 646,6 bilhões em 2023, o equivalente a 5,96% do Produto Interno Bruto (PIB) – e defende compensação para cada incentivo aprovado. O texto aprovado exige apenas que o Executivo preveja os incentivos no Orçamento.

 

Pelo texto aprovado na Câmara, no fim do ano passado, a produção de hidrogênio seria abastecida por fontes renováveis como solar e eólica, além de biogás e biomassa. Durante a tramitação no Senado, Alencar acolheu emendas contemplando o etanol e outros biocombustíveis, além de hidrelétricas – essas últimas por pressão de geradores, como a Eletrobras, e das PCHs (pequenas centrais hidrelétricas).

 

O relator no Senado também afrouxou a exigência para que essas fontes de energia para o hidrogênio reduzam as emissões de gases que provocam o efeito estufa a partir de 2031. O projeto de lei prevê que só poderão ser fontes de energia para o novo combustível as que emitirem até quatro quilos de gás carbônico por quilo de hidrogênio. Pelo texto aprovado na Câmara, esse limite seria obrigatoriamente reduzido a partir de 2031. O relatório aprovado no Senado, no entanto, diz que esses limites de emissão poderão ser revistos por regulamentação, retirando a imposição de redução a partir de 2031. Com incidência solar e vento em abundância, o Brasil pode produzir um hidrogênio verde competitivo se comparado com o resto do mundo.

 

Emenda

 

Um benefício extra concedido a empresas instaladas em ZPEs (zonas de processamento de exportações) acabou provocando forte debate entre o senador Cid Gomes (PSB-CE) e o líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA).

 

O texto inicial do Senado previa que as empresas sediadas em ZPEs tivessem benefícios extras, permitindo que pudessem comprar energia de produtores instalados em qualquer lugar do País, sem recolher impostos, em um conceito novo batizado de “ZPE expandida”.

 

Empresas sediadas em ZPEs contam com benefícios tributários como a isenção de IPI, PIS e Cofins na compra de equipamentos, matéria-prima e insumos importados. O trecho inserido no projeto do hidrogênio propõe que, na compra de energia para a produção de hidrogênio, ela possa ter o mesmo benefício, ainda que a geração seja feita a quilômetros de distância.

 

Isso pode permitir, segundo técnicos e políticos governistas, que uma empresa no Ceará possa ter como fornecedor de energia uma fazenda solar em Goiás ou uma eólica no Rio Grande do Sul, sem pagar imposto. Isso pode fazer a diferença em termos concorrenciais na escolha onde as empresas vão se instalar.

 

A única ZPE em atividade hoje é a do Ceará. A emenda, que beneficia as empresas do Estado, foi inserida por iniciativa de Cid Gomes, que presidiu a comissão especial que discutiu o projeto no Senado.

 

Segundo Cid, 14 empresas já firmaram protocolo de intenção de se instalar no Estado. “Não estou defendendo os interesses do Ceará, mas do País. A ZPE facilita a vida do investidor, que não tem que pedir compensação de créditos tributários, é só mais burocracia. Para que complicar se posso fazer algo mais simples?”, questionou o parlamentar, ao Estadão.

 

A emenda chegou a ser acolhida pelo relator Alencar, mas foi retirada sob pressão do governo. Cid Gomes, então, propôs a reinclusão do trecho no texto por meio de uma votação em separado, o que deve ocorrer na próxima sessão.

 

Nos Ministérios da Fazenda e da Indústria, a medida foi condenada por desincentivar a produção local de equipamentos para atender a uma indústria nascente, além de estimular uma corrida para a ZPE – o que tende a alargar as renúncias fiscais do governo com potencial de deteriorar a arrecadação. Isso porque esses equipamentos poderiam ser adquiridos no exterior sem recolher tributos.

 

Gomes afirma que a arrecadação do governo não existirá se a fábrica de hidrogênio não se instalar no País e não comprar energia produzida de uma fonte renovável. Ou seja, os benefícios da ZPE seriam necessários para incentivar os investimentos. “É uma tempestade em copo d’água. Se o governo está insatisfeito, ele pode vetar”, disse.

 

No plenário, Wagner afirmou que a ZPE provocaria distorções concorrenciais, uma vez que unidades instaladas nessa área partiriam na frente. “A extensão (do benefício), trazendo para dentro da ZPE a energia produzida no Piauí ou em qualquer outro Estado, criará uma concorrência equilibrada entre os diversos Estados? Não teremos”, disse. (O Estado de S. Paulo/Mariana Carneiro e Daniel Weterman)