O Estado de S. Paulo
Pressionado pela concorrência chinesa, o governo federal prepara estímulo à produção nacional de ônibus elétricos. Verbas do BNDES e do PAC serão usadas. Haverá também exigências de conteúdo local – pré-requisito que ganhou força com a nova política industrial da gestão petista. Dos 107 mil ônibus que rodam hoje no Brasil, só 444 são elétricos. No Chile, são 2.043. Na Colômbia, 1.590. O principal entrave é o preço: um ônibus com essa tecnologia custa de R$ 2,5 milhões a R$ 3 milhões, ante R$ 700 mil a R$ 900 mil da versão a diesel.
De olho na “pauta verde” e na crescente concorrência chinesa, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva prepara medidas de estímulo à produção nacional de ônibus elétrico. As iniciativas vão contar com verbas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e terão exigências de conteúdo local – pré-requisito que voltou a ganhar força com a nova política industrial defendida pela atual gestão.
O objetivo é estimular a produção de veículos voltados ao transporte público dentro do País, tendo como principal mercado os médios e grandes municípios que estejam em processo de renovação das frotas, segundo apurou a reportagem.
Baixa participação
Dos 107 mil ônibus que rodam atualmente no Brasil, apenas 444 são elétricos, de acordo com dados da plataforma E-bus Radar, que monitora o transporte público na América Latina. Na região, o País ocupa o terceiro lugar, bem atrás do Chile (2.043) e da Colômbia (1.590).
O principal entrave à expansão desse tipo de veículo é o preço: um ônibus com essa tecnologia custa na faixa de R$ 2,5 milhões a R$ 3 milhões, ante R$ 700 mil a R$ 900 mil da versão a diesel. “Embora o investimento seja três vezes maior, e ainda tenha o gasto com subestação (estrutura necessária para o carregamento de baterias), isso é compensado pelo custo menor de manutenção e da energia elétrica (na comparação com o combustível fóssil) ”, afirmou ao Estadão a diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Mudança Climática do BNDES, Luciana Costa.
Segundo ela, esse aporte adicional tende a se pagar em um período de 10 a 15 anos. Já pela ótica ambiental, cada ônibus elétrico significa cerca de 100 toneladas de CO2 a menos na atmosfera por ano. Pelo Acordo de Paris, o Brasil terá de zerar a emissão líquida desses gases do efeito estufa até 2050 – ou seja, buscar o equilíbrio entre a emissão e a captura do carbono.
São Paulo
A cidade de São Paulo, que transporta 7,3 milhões de passageiros por dia útil e concentra a maior parte da frota de ônibus elétrico do País, foi a primeira a obter financiamento do BNDES com o objetivo de aumentar a eletromobilidade.
O banco aprovou, no fim de 2023, R$ 2,5 bilhões para a Prefeitura de São Paulo com o custo da TLP (Taxa de Longo Prazo, ou seja, sem subsídio), mas com prazos mais alongados, de 15 anos, mais um de carência. O montante vai bancar a compra de até 1,3 mil veículos, o equivalente a 10% da frota paulistana.
Os veículos só poderão ser adquiridos das quatro montadoras que têm produção local e são certificadas pelo BNDES: Eletra (empresa que nasceu no ABC paulista), Mercedes-Benz (alemã), BYD (principal fabricante chinesa de veículos elétricos, que ultrapassou a Tesla nas vendas mundiais) e Marcopolo (companhia que iniciou os negócios em Caxias do Sul, no RS).
Luciana admite que se trata de um gargalo: “Nós temos só quatro montadoras (de ônibus elétrico no País) e elas ainda estão começando. O início é um pouco mais lento, mas, depois, é uma curva exponencial. Nós gostaríamos de escalar rapidamente (a troca das frotas), mas depende da cadeia de suprimentos e da capacidade de produção dessas empresas”.
De acordo com o BNDES, essas montadoras têm apontado um potencial de produção de 4 mil veículos por ano, mas o número é considerado otimista e visto com cautela.
A expectativa do governo e da equipe econômica, segundo apurou a reportagem, é de que as indústrias automobilísticas já instaladas no País acelerem a conversão de suas plantas, atualmente focadas nos motores a combustão – bem como haja um maior interesse de empresas estrangeiras, inclusive chinesas, de produzir esse tipo de veículo localmente.
Fundo clima
Para dar volume a esses financiamentos, o BNDES aposta no Fundo Clima, que está no guarda-chuva do banco de fomento e tem cerca de R$ 10 bilhões em caixa. O dinheiro foi captado em novembro do ano passado, na primeira emissão brasileira de títulos soberanos verdes. Dentro do fundo, já há um subprograma de mobilidade urbana, mas ainda sem valor definido.
“É uma corrida contra o relógio. A expectativa é de que, no primeiro trimestre deste ano, já tenhamos os recursos disponíveis”, afirma Luciana. Segundo ela, as linhas abastecidas pelo Fundo Clima terão juros subsidiados, além de contarem com prazos mais longos do que a média do mercado. (O Estado de S. Paulo/Bianca Lima e Anna Carolina Papp)