Zona Franca e regime automotivo vão concentrar disputa, prevê relator

O Estado de S. Paulo

 

A segunda votação da reforma tributária na Câmara, prevista para ocorrer na próxima semana, deve ter dois temas centrais, na avaliação do relator do projeto na Casa, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Ele prevê que a extensão dos benefícios tributários a montadoras instaladas na região Norte, Nordeste e Centro-Oeste e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) da Zona Franca de Manaus vão provocar disputas acirradas.

 

No primeiro caso, o benefício chegou a ser votado na Câmara, na primeira rodada da reforma na Casa, mas perdeu por um voto. O Senado não só inseriu a medida, como alargou o incentivo tributário para a fabricação de veículos movidos a combustão – a versão original era apenas para carros elétricos.

 

Ribeiro prevê que a divisão será resolvida no voto. “Eu acho que a gente vai ter uma disputa mais acirrada, porque teve gente que na Câmara estava desatenta (na hora da votação). Esse pode ser um dos pontos mais animados. Vai ser o Nordeste e o Centro-Oeste, e o Sul e o Sudeste do outro lado”, disse o relator, em entrevista ao Estadão/Broadcast.

 

Já a Cide da Zona Franca, uma inovação inserida pelo relator no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), é alvo de queixas de governadores do Sul e Sudeste, a exemplo de Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP). O tributo deverá ser cobrado de produtos que concorram com os fabricados no polo industrial de Manaus.

 

O governador de São Paulo afirmou que, sem a estipulação de um prazo, empresas podem no futuro se mudar para o Amazonas atrás de vantagens com o intuito de sobretaxar competidores. “É uma decisão quase concorrencial. O cara pode ir para lá para pegar o benefício e onerar o concorrente. Isso é o que São Paulo está alegando. Eu vou provocar a Fazenda, saber qual é a visão deles”, disse Ribeiro.

 

O deputado avalia outras possíveis supressões (retiradas) no texto aprovado no Senado. Uma nova redação é praticamente descartada pelo relator, uma vez que isso poderia fazer com que a reforma tivesse de passar por nova votação de senadores, afetando o calendário da promulgação esperada pelo governo. Para que os prazos da transição passem a valer como planejado, a votação tem de ser concluída e o texto, promulgado pelo Congresso até o dia 31 deste mês.

 

“Eu quero elaborar um texto que possa ser promulgado. Lógico que esse texto tem de ser preciso para a gente suprimir o que pode ser suprimido técnica e politicamente e ter a promulgação”, afirmou.

 

O limite desse pente-fino, diz ele, são os acordos políticos costurados e que permitiram a votação no Senado. “Nós tivemos um placar muito largo na Câmara, o que não ocorreu no Senado, onde o placar foi apertado, com uma diferença muito pequena”, disse. “Eu tenho de ter a arte de pacificar os temas dentro da Câmara, mas também isso tem de ser alinhado com o Senado.”

 

Exceções

 

A avaliação que ele faz neste momento é o impacto de cada uma das exceções inseridas pelos senadores na alíquota do novo IVA (Imposto sobre Valor Agregado), e se a sua retirada do regime geral de tributação faz sentido à luz da experiência de outros países.

 

O Ministério da Fazenda calculou que a alíquota ficaria em 27,5% com as exceções feitas pela Câmara. Como o Senado ampliou a lista, há a expectativa de que o número possa ser maior. Ribeiro disse que já solicitou o cálculo à Fazenda e espera recebê-lo nos próximos dias. A decisão final será dos líderes da Câmara, mas Ribeiro já adiantou que pretende defender tecnicamente algumas alterações.

 

Uma delas é a taxação da exploração de petróleo e minério via Imposto Seletivo, questionada pelas empresas. Para Ribeiro, isso representaria a criação de uma taxa sobre a exportação, o que é proibido pela Constituição. “Em tese, você cria uma possibilidade de questionamento, de judicialização”, afirmou.

 

Outro ponto é a redação sobre a cesta básica estendida, que o deputado entende como um prejuízo a consumidores de baixa renda que passarão a pagar imposto sobre produtos que hoje têm alíquota zerada. E também sobre o cashback, restrito à cesta básica estendida e a contas de luz e gás. Para ele, não vale a pena restringir a devolução de tributos a certos tipos de consumo, e o melhor seria retornar à redação da Câmara, que apenas criava o mecanismo e deixava a operação para lei complementar.

 

A remuneração dos auditores fiscais, que conseguiram emplacar no Senado a possibilidade de equiparação salarial com ministros do STF (R$ 41,6 mil), também é vista com críticas pelo relator e pode ter vida curta na nova rodada na Câmara. “Esse tema, na verdade, não é reforma tributária”, disse Ribeiro. “Os Estados e municípios estão reclamando que não têm receita, e aí vai ter aumento de teto (remuneratório)”. (O Estado de S. Paulo/Mariana Carneiro, Anna Carolina Papp e Iander Porcella)