‘Não é justo. O acordo era acabar agora’, diz presidente da Volks do Brasil sobre incentivos fiscais

O Estado de S. Paulo Online

 

O presidente da Volkswagen do Brasil, Ciro Possobom, criticou nesta quinta-feira, 9, a aprovação, pelo Senado, do texto da PEC da reforma tributária com emenda que prorroga, pela quinta vez, incentivos a montadoras especialmente do Nordeste e que, na prática, favoreceria apenas uma empresa, a Stellantis, com fábrica da Jeep em Goiana (PE). A Stellantis, por sua vez, diz que a interrupção daqui a dois anos prejudicaria projetos em andamento.

 

Na contramão do que vem sendo discutido em termos de sustentabilidade, a medida também vai favorecer a produção de veículos a combustão, numa jogada de última hora, incluída pelo senador Eduardo Braga, relator do projeto.

 

“Isso não faz sentido, pois o governo faz pressão por investimentos na eletrificação, mas aí vem essa medida que é contrária a isso, incentivando veículos a combustão, que têm impactos ambientais”, diz Possobom.

 

A intenção das fabricantes do Sul e Sudeste, que concentram a maior parte da produção automobilística no País, é tentar derrubar a medida no Congresso, onde já tinha sido recusada (por diferença de apenas um voto), antes de ir ao Senado.

 

O incentivo foi criado em 1997 para atrair montadoras e autopeças às regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. No Norte, porém, não há empresas do setor. No Centro-Oeste, estão as plantas da Caoa-Chery e da HPE-Mitsubishi que foram incluídas no programa já em um regime diferenciado e, por terem baixos volumes de produção, ficam com pequena parcela do montante. Também beneficia a Moura, fabricante de baterias também em Pernambuco.

 

Após quatro renovações, o incentivo estava previsto para terminar em 2025. O executivo lembra que ele foi criado para atrair empresas e elas já se instalaram, atraíram fornecedores e contrataram pessoal, então não é justo, pois foi acordado que acabaria agora.”

 

A medida, segundo Possobom, beneficia apenas uma empresa – a Stellantis, com fábrica em Pernambuco inaugurada em 2015, em detrimento de todas as demais empresas de outras regiões. Também não é benéfica aos demais Estados, que perdem repasse das verbas do fundo de participação dos Estados.

 

“Estamos em vias de anúncios importantes de investimentos e de emprego aqui para o Brasil, mas, ao deslocar todo esse recurso para uma empresa, pode mudar o jogo.” Segundo ele, o grupo já definiu os modelos de veículos eletrificados que serão fabricados localmente, assim como outras tecnologias mais eficientes em consumo. Com novas regras, no entanto, terá de voltar a falar com a matiz alemã. Ele citou que várias outras montadoras estão na mesma situação. “Fica totalmente desleal a forma como foi negociada a prorrogação.”

 

R$ 10 bi em créditos

 

Desde o início do programa, criado em 1997, foram concedidos R$ 75 bilhões em crédito presumido IPI. Além da Jeep, também são beneficiadas, mas com valores bem inferiores, as empresas Caoa/Chery e HPE/Mitsubishi, ambas em Goiás.

 

Só nos últimos dois anos, a Stellantis recebeu R$ 10 bilhões em créditos o que, nas contas das demais fabricantes, representa uma vantagem de 20% nos custos de produção da Jeep em Pernambuco.

 

A empresa alega que esse é praticamente o porcentual do custo maior de produção na região por causa de falta de infraestrutura e por estar distante dos maiores mercados consumidores do Estado.

 

Redução gradativa

 

A Stellantis diz que o grupo pode rever investimentos programados para a fábrica pernambucana caso o incentivo não seja prorrogado. A empresa concorda com a redução gradativa dos valores até 2032, mas avalia que a interrupção daqui a dois anos prejudicaria projetos em andamento.

 

No mês passado, a companhia anunciou que, a partir de 2024, vai iniciar em Goiana a produção dos seus primeiros veículos com tecnologias que associam eletrificação com motor flex e a etanol, além dos 100% elétricos desenvolvidos e produzidos no Brasil. (O Estado de S. Paulo Online/Cleide Silva)