O Estado de S. Paulo
Embora defenda a necessidade de regulamentação do mercado de carbono, o setor privado vê pontos de preocupação no Projeto de Lei 412/22 que tramita no Congresso. As empresas consideram, por exemplo, que há debates sobre a tributação desse mercado que ainda precisam ser feitos.
Pesquisa realizada este ano mostra que nove em cada dez empresas brasileiras têm interesse em poluir menos, mas dizem que o maior desafio é a falta de regulamentação clara sobre o assunto. O tema tem sido debatido por representantes do setor privado junto com o governo Lula.
O texto, relatado pela senadora Leila Barros (PDT-DF), deve ser votado na Comissão de Meio Ambiente do Senado nesta semana. “O PL (projeto de lei), como está hoje, já oferece os elementos basilares para seguir para sanção (do presidente)”, afirma Viviane Romeiro, diretora de Clima, Energia e Finanças Sustentáveis do Centro Empresarial Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável (Cebds).
A entidade reúne 111 grandes empresas, com faturamento conjunto que equivale a cerca de 50% do Produto Interno Bruto (PIB). O grupo também integra o World Business Council for Sustainable Development (WBCSD), uma rede que congrega 200 grupos empresariais em todos os continentes em torno do compromisso de crescimento sustentável.
“É um PL bom, precisamos de um mercado regulado para organizar as coisas internamente e para ter uma interlocução respeitada e respeitável com outros países. Se não temos o mercado regulado, teremos uma dificuldade imensa para continuar mantendo relações de comércio com outros países”, afirma a advogada Paula Mello, sócia do escritório Pinheiro Neto, na área ambiental.
Tributação
Um ponto acompanhado com especial atenção pelas empresas refere-se à tributação do mercado de crédito de carbono. “Inicialmente, a minuta do Executivo trazia (a natureza jurídica do crédito de carbono) como ativo intangível; depois, como ativo financeiro. Isso passou para valor mobiliário. O que traz preocupação é a consequência disso para a incidência tributária. Temos trabalhado justamente por uma menor incidência”, afirma Viviane.
“Houve ajustes no texto da semana passada. Tanto quem conhece a área quanto os desenvolvedores de projetos estavam preocupados. Já classificar, necessariamente, como ativo mobiliário traz, primeiro, impossibilidade de ser transacionado fora de instituições financeiras. Então, para desenvolvedores de projetos acostumados ao mercado voluntário (de carbono) é uma dificuldade”, diz Nathália Azevedo de Carvalho, advogada de direito ambiental do Pinheiro Neto.
O Congresso agora busca um meio-termo, para estabelecer que, caso seja comercializado no mercado de capitais, o crédito de carbono apareça como um valor regulado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). “Esse é um tom do PL como um todo, de dar uma diretriz geral e colocar esse arcabouço mais genérico”, afirma Nathália.
Lobby
Há receio no setor privado com relação à resistência da bancada ruralista ao projeto. Pela proposta do governo, instalações que emitem acima de 25 mil toneladas de CO2 equivalente por ano estarão sujeitas ao mercado regulado. Esse corte já atinge, em sua maioria, a indústria. Porém, há uma mobilização no Congresso para excluir o agronegócio do teto de emissões.
O governo Lula indica que irá trabalhar contra a proposta de excluir o agronegócio do mercado regulado de carbono. Na sexta-feira, em debate promovido pelo portal Jota, Rafael Dubeux, assessor especial do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, argumentou que o agronegócio “tende a ganhar” estando dentro do ambiente regulado, principalmente pela reputação internacional. “Isso vai ser conversado, para que a gente encontre a melhor solução para o Brasil.”
Na quarta-feira da semana passada, a relatora do projeto, senadora Leila Barros, contemplou parcialmente o pleito do agronegócio. O texto agora prevê que as obrigações previstas se aplicam apenas às atividades para as quais existam metodologias de mensuração e verificação consolidadas.
Apesar disso, a bancada ruralista ainda pressiona para que a exclusão do agronegócio do texto seja explícita. Dubeux argumenta que a parcela do agro que estaria sujeita ao teto, no recorte de 25 mil toneladas de CO2, é “muito pequena”, e que provavelmente 99% das unidades estariam fora do mercado regulado. (O Estado de S. Paulo/Beatriz Bulla e Amanda Pupo)