Brasil tem hoje a opção de seguir o próprio rumo para tornar a frota sustentável

O Estado de S. Paulo/Summite

 

As características brasileiras para a transição energética – matrizes limpas em abundância e infraestrutura para o combustível etanol pronta – são diferentes do restante do mundo. Por isso, explica Paulo Roberto Cardamone, CEO da Bright Consulting, não é apenas preciso entender o contexto atual como pactuar regulações que também olhem para o futuro no horizonte de pelo menos algumas décadas.

 

“Globalmente, o futuro, em poucas décadas, sem dúvida, é a eletrificação. Talvez, a gente nem esteja mais aqui, mas vamos ter coisas mais diretamente relacionadas à eletrificação”, explica o consultor, que participou do Estadão Summit Indústria Automotiva 2023. Apesar de a bússola de todos estar apontada para o cenário elétrico, segundo Cardamone, isso não significa que o Brasil tem de fazer o que está sendo orientado na regulação global. “Sempre bato nessa tecla. Não é o carro ‘baterizado’ que vai sobreviver, mas é o carro eletrificado que tem de ficar”, afirma.

 

Nesse sentido, diz o especialista, enquanto a Europa e a China, por não terem nenhuma opção, estão dando fim ao carro a combustão – e vários países vão proibir a circulação desse tipo de veículos em poucas décadas –, no Brasil existem subsídios para as estratégias nacionais seguirem um outro caminho. “O governo é muito bom de escrever regulamento, mas como ele não entende muito bem o dia a dia da indústria, nós, do setor, temos de explicar. No curto e médio prazo, não há dúvida de que a solução é partir para a hibridização do carro flex. É o caminho mais adequado para a infraestrutura industrial que temos hoje”, diz Cardamone.

 

O problema maior, diz ele, é que esse caminho, ou seja, de juntar eletricidade e etanol para serem os combustíveis do mesmo carro, está sendo percorrido no escuro. “Enquanto estamos desenvolvendo novos veículos, novas tecnologias, a regulação sobre esses processos ainda não saiu.”

 

Na frente

 

Se a China resolveu ser um grande inovador no processo de eletrificação automotiva e, para isso, fez um programa governamental específico, o Brasil deveria seguir o exemplo, mas ajustando toda a estratégia para as características nacionais. “Somos, provavelmente, o único grande agente da indústria que tem alternativas. Os outros não têm”, afirma Cardamone.

 

Uma regulação adequada, na visão do consultor, deve abarcar tanto o carro elétrico quanto o híbrido, a partir do etanol. “Temos de tomar cuidado com o passo que vamos dar em relação ao futuro”.

 

Ausência

 

Uma ação de governo eficaz é o que mais falta hoje no cenário nacional, afirma Flávia Consoni, professora do Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

 

“Com o pano de fundo das mudanças climáticas, e hoje, na Unicamp, usamos apenas o termo emergência climática, o grande impulsionador para a descarbonização é uma política pública adequada. Um planejamento de Estado com uma boa visão de futuro”, diz a pesquisadora. E, para isso, qualquer plano precisa combinar uma matriz com diversas soluções tecnológicas que, juntas, vão dar a solução que o País e o planeta precisam.

 

“Qual é o direcionamento? Qual é a segurança que o mercado tem para atrair investimentos no sentido de que se pretende chegar?”, questiona Flávia, fazendo referência a perguntas-chave que um bom projeto precisa responder. (O Estado de S. Paulo/Summite/Eduardo Geraque)