Haddad quer R$ 30 bilhões da Petrobras para garantir ajuste fiscal em 2024

O Estado de S. Paulo

 

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, negocia com o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, um acordo para a companhia pagar pelo menos R$ 30 bilhões para encerrar litígios com a Receita Federal com base nas regras de projeto de lei para o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) em negociação no Congresso. O acordo é a principal fonte de arrecadação com que o governo conta para atingir a meta de zerar o rombo das contas públicas no ano que vem. O avanço, porém, depende da aprovação do projeto no Senado.

 

O Estadão apurou que o governo conta com cerca de R$ 90 bilhões no caixa decorrente da aprovação do projeto do Carf. O texto já teve o sinal verde dos deputados em junho e, por isso, a expectativa do governo é de que não seja contaminado pela crise aberta pelo próprio Haddad ao dizer que a Câmara tem hoje um “poder muito grande” – o que causou um mal-estar entre deputados.

 

Haddad e Prates negociam as condições e o prazo para o pagamento no momento em que a petrolífera também prepara a recompra de ações no mercado – processo que também vai consumir recursos da empresa. Os valores em discussão ainda não estão fechados, e no governo há a expectativa de que possam subir para até R$ 50 bilhões. Segundo pessoas envolvidas na negociação, Prates sinalizou que a companhia poderia arcar com 30% do valor total do passivo no Carf no curto prazo.

 

Voto de qualidade

 

O Carf é o tribunal administrativo que julga os recursos contra autuações da Receita Federal. O projeto de lei que tramita no Senado assegura a volta do chamado voto de qualidade (espécie de voto de Minerva) da Receita nas decisões em que houver empate, além de tratar das regras para as empresas regularizarem os débitos.

 

O projeto permite, entre outros pontos, o cancelamento de multas e representação fiscal para fins penais nos casos em que o julgamento foi favorável ao governo. Os débitos já inscritos em dívida ativa da União também poderão ser objeto de proposta de acordo de transação tributária específica, de iniciativa da empresa.

 

Na última sexta-feira, Haddad disse que, para 2024, um terço do ajuste fiscal prometido virá do projeto do Carf, no que fontes do governo atribuem à Petrobras. A estatal também pode fazer depósitos judiciais para continuar nos casos em que a companhia entender que pode vencer o litígio. Os depósitos entrariam, nesse caso, como receita primária.

 

Procurada pela reportagem desde segunda-feira, a Petrobras não se manifestou. Em comunicado ao mercado, disse que as notícias seriam “infundadas” e que “eventuais decisões relativas à gestão de seu passivo tributário são pautadas em análises criteriosas e estudos técnicos, considerando a análise de riscos de possíveis decisões desfavoráveis tanto na via administrativa quanto na via judicial”. Procurada, a Fazenda não retornou.

 

“Robin Hood”

 

O governo também conta com outras medidas para reforçar o caixa. Há uma necessidade em torno de R$ 130 bilhões de aumento de arrecadação. Entre as iniciativas, está a mudança na tributação de fundos exclusivos de investidores de alta renda e de investidores fora do País, conhecidos como offshore.

 

Essas propostas, que ganharam o apelido de “Robin Hood” no Congresso por terem como foco o contribuinte de renda mais alta, enfrentam resistências de parlamentares. Os fundos exclusivos podem render cerca de R$ 26 bilhões, mas o governo, ao enviar a proposta ao Congresso, deve fazer uma projeção mais conservadora, entre R$ 10 bilhões e os R$ 26 bilhões.

 

A equipe econômica também estuda mudanças no instrumento de Juros sobre Capital Próprio (JCP), mecanismo criado após o Plano Real com o fim da correção monetária sobre os balanços. O JCP é uma forma que as grandes empresas usam para remunerar seus acionistas – a despesa pode ser deduzida do IR a pagar.

 

Dessas iniciativas, apenas a que taxa investimentos no exterior teve sua discussão iniciada no Congresso. Por iniciativa do governo, a tributação foi incluída no relatório que tratou da nova regra de correção do salário-mínimo. (O Estado de S. Paulo/Adriana Fernandes e Mariana Carneiro)