O Estado de S. Paulo Online
O setor automotivo brasileiro tem condições de atingir metas de descarbonização com investimentos inferiores aos necessários em países da Europa, Estados Unidos e China, que também precisam de elevados aportes para mudar suas fontes de energia, a maioria delas baseada em fontes fósseis.
Com o etanol, o País está à frente no processo, inclusive no desenvolvimento de veículos a hidrogênio, visto como o futuro global após os carros 100% elétricos. O aproveitamento mais intenso de um produto já disponível e em abundância no mercado brasileiro foi defendido por participantes do Summit Estadão Indústria Automotiva, que ocorreu na manhã desta quinta-feira, 10, em São Paulo.
Tecnologias que utilizam a molécula do etanol para a geração de hidrogênio já estão em desenvolvimento por empresas como a Stellantis, dona das marcas Fiat, Jeep, Peugeot, Citroën e RAM. O grupo já traçou sua estratégia de eletrificação até 2030, quase todas elas com uso do etanol.
Em sua apresentação sobre Rota estratégica e plano para descarbonização, o presidente da empresa na América do Sul, Antonio Filosa, falou sobre quatro plataformas de produtos a serem produzidas principalmente na fábrica de Goiana (PE), uma das mais modernas do grupo globalmente, inaugurada em 2015.
“O País tem uma riqueza única que não pode ser desprezada, que é o etanol”, disse o executivo. Segundo ele, em termos de emissão de CO₂, o uso do etanol é tão ou mais eficiente que um carro elétrico europeu, cuja matriz energética é baseada no carvão.
A estratégia da Stellantis começa com o incentivo do uso apenas de etanol nos carros híbridos atuais, que já reduziria significativamente as emissões em comparação à gasolina. O uso de etanol em toda a frota atual de modelos flex reduziria as emissões de CO₂ em 30 toneladas ao ano, segundo Besaliel Botelho, membro do conselho da Bosch.
A sequência das novas plataformas da Stellantis passa pelo primeiro carro híbrido flex da marca, já em 2024, segue para a produção dos elétricos, a partir de 2030, até chegar à célula de combustível a etanol.
“Todas essas tecnologias estão sendo desenvolvidas no Brasil; só a elétrica terá participação também de outros países da região”, disse Filosa. Ele ressaltou que, no caso do carro a célula de combustível, o processo de extração da molécula do etanol, que contém muito hidrogênio, é mais barato em relação a outras alternativas em estudos em outros países, “o que dará maior competitividade ao País”.
Ao falar sobre os Desafios atuais da indústria automotiva, Botelho, da Bosch, citou que o desenvolvimento dos carros flex já foi um processo importante de descarbonização, mas também ressaltou a necessidade do uso do etanol nos veículos flex em uso atualmente. “Não adianta ter a tecnologia e não usá-la”, disse.
Suas projeções são que, em 2030, apenas 7,3% das vendas de veículos no Brasil serão de modelos 100% elétricos, e 33% serão híbridos que podem ter a combinação do etanol com o motor elétrico ou bateria. “O futuro tem de ser por caminhos de diferentes tecnologias, e a hibridização com etanol é a rota certa para o Brasil”, avalia Besaliel.
No painel com o tema Eletrificação ou etanol: qual é o melhor caminho para a descarbonização, Flávia Consoni, professora do programa de pós-graduação em Política Científica e Tecnológica da Unicamp, chamou a atenção para a eletrificação dos ônibus para o transporte público. “É preciso apresentar às pessoas como o uso desse transporte limpo traz qualidade de vida, com menos poluição e menos barulho.”
Paulo Cardamone, CEO da Bright Consultoria, falou da mudança que já começa a ocorrer no rastreamento dos produtos, não só de automóveis, para comprovar a origem “limpa” em todo o processo produtivo. “Todos os produtos terão um DNA”. Serão rastreados, por exemplo, toda a cadeia de produção do automóvel, desde a produção da matéria-prima, do combustível, da bateria e o processo de reciclagem.
Também participaram do debate o presidente da União Nacional dos Produtores de Cana de Açúcar (Unica), Evandro Gussi — para quem não vai faltar etanol para abastecer a frota brasileira —, o vice-presidente da Stellantis, João Irineu Medeiros e Gustavo Noronha, da SAE, entidade de engenharia automotiva.
Sobre o impacto da tecnologia do 5G nos automóveis, Marcos Ferrari, da Telebrasil e Conexis, afirmou que o 4G provocou uma revolução na conexão entre as pessoas, e o 5G vai provocar uma revolução entre as coisas (máquinas, eletrodomésticos etc).
“O ganho de produtividade das empresas será potencializado e a possibilidade de erro humano será praticamente zero”. Também participaram do painel Adriano Rosa, da Embratel; Débora Bortolasi, da B2B da Vivo e Marcelo Gallao, da Scania, que comentou sobre os ganhos do uso da tecnologia nos caminhões, tanto em produtividade como em segurança. (O Estado de S. Paulo Online/Cleide Silva)