O Estado de S. Paulo/Mobilidade
O mercado de automóveis usados – com até três anos – movimentou R$ 532 bilhões no Brasil, no ano passado, com a venda de 13,4 milhões de veículos. A expectativa da Federação Nacional das Associações dos Revendedores de Veículos Automotivos (Fenauto) é que sejam comercializadas 15 milhões de unidades em 2023. Uma parcela ainda ínfima desse montante tão significativo pertence aos carros eletrificados, que, aos poucos, vêm formando uma base interessante nesse segmento. Segundo balanço da entidade, no acumulado de janeiro a abril, 8.423 carros seminovos híbridos e movidos a bateria mudaram de dono. No mesmo período de 2022, esse número chegou a 4.238, o que representa crescimento de 98,7%. O desempenho de seminovos acompanha a curva do 0-km, que, no primeiro quadrimestre do ano, registrou aumento de vendas de 51%, em relação a 2022. “A notícia é boa para o comércio de usados porque, futuramente, esses carros novos abastecerão os estoques das lojas de segunda mão, aquecendo nosso setor”, comemora Enílson Sales, presidente da Fenauto. “É claro que as vendas de seminovos são irrisórias no universo de mais de 15 milhões”, diz Sales. “Mesmo assim, consideramos um volume bem relevante, na medida em que os eletrificados vão ocupando espaço no mercado.”
Depreciação difícil
Até o fim de ano, ele acredita que serão vendidos aproximadamente 17 mil veículos eletrificados seminovos no País. “Esse número ganha importância se considerarmos que são automóveis mais caros, inacessíveis para muita gente que busca um modelo de segunda mão”, pondera o executivo. Ele explica que, apesar dos índices de desvalorização calculados pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), ainda é difícil determinar a perda exata dos carros movidos a bateria e híbridos de um ano para outro. “Por enquanto, o mercado não tem essa resposta”, destaca. “Indústria, revendedores e consumidores estão inseridos em um aprendizado sobre essa nova tecnologia de propulsão. A autonomia do modelo, o modo como o motorista dirige e a condição da bateria são fatores que podem interferir no valor.”
Preços inacessíveis
Yago Almeida, sócio e cofundador da Olho no Carro, plataforma de consulta veicular, revela que já é possível perceber o impacto do crescimento nas consultas de carros eletrificados seminovos, embora seja um movimento tímido. “Normalmente, os usuários do nosso serviço estão em busca de modelos mais em conta. O carro elétrico usado ainda não é uma realidade no Brasil, onde o preço até nas configurações mais simples é de, no mínimo, R$ 100 mil”, revela. “Isso é que nos distancia de mercados como o norte-americano e o europeu, que têm veículos eletrificados a preços acessíveis e políticas de incentivo que ajudam a democratizar o acesso e, até mesmo, criar preferência por esse tipo de modelo”, completa. Ele não descarta a possibilidade de que os veículos movidos a energia elétrica cheguem a representar boa parte das consultas mensais. “O aumento nas pesquisas de seminovos elétricos foi de 300% em 12 meses. Ou seja, saltaram de 0,15% para 1% dos veículos buscados na Olho no Carro, que totaliza cerca de 1 milhão de consultas mensais”, diz. Segundo Almeida, a pesquisa feita na base de dados da plataforma aponta que Volvo XC 40, Caoa Chery Icar, JAC E-JS1 e Renault Kwid E-Tech são os automóveis mais consultados pelos usuários. A despeito dos preços altos, para quem pode investir R$ 100 mil, o seminovo eletrificado serve como degrau antes da intenção de aquisição de um 0-km. Mas Almeida faz a ressalva: “O custo-benefício na compra de um carro elétrico no Brasil está longe do ideal. Hoje, os veículos populares são os mais procurados pelo consumidor que procura veículos usados ou seminovos.”
Compra tranquila
Os valores, de fato, se impõem como obstáculo para o interessado. Tirando isso, não há com o que se preocupar na hora de comprar um eletrificado de segunda mão. Essa é a opinião de Márcio Severine, head de infraestrutura de mobilidade da Pontoon Clean Tech, empresa de gestão de frotas de veículos elétricos e soluções de eletromobilidade. “Muita gente fica na dúvida se a bateria do carro está em boas condições. A garantia dela é de oito anos, e a vida útil chega a dez”, lembra Severine. “Não é por causa desse componente que o consumidor deixará de comprar um seminovo.” Ele concorda com Enílson Sales, da Fenauto, de que, no momento, é difícil mensurar a depreciação do seminovo eletrificado. “O que ajuda a determinar o valor é a procura, a oferta e a quantidade de transações em que ele está envolvido. O carro elétrico ainda é muito recente”, diz. Para Severine, o mercado ganhará estímulo ainda maior quando houver produção local desse tipo de carro. “A Great Wall vai começar a fabricar no País e, depois dela, acredito que outras marcas seguirão o mesmo caminho. Isso trará mais tranquilidade ao proprietário na compra de peças e componentes nacionais”, salienta. (O Estado de S. Paulo/Mobilidade/Mário Sérgio Venditti)