Toyota, Caoa, BYD, GWM: como as montadoras asiáticas lideram corrida dos carros elétricos no Brasil

O Estado de S. Paulo

 

Empresas asiáticas, em especial as chinesas, estão liderando o processo de eletrificação dos automóveis no Brasil, com anúncios de fábricas para produção exclusiva de carros elétricos, híbridos e híbridos plug-in. Os grupos europeus e americanos mais tradicionais aguardam decisões sobre uma política industrial com foco na descarbonização e o aval das matrizes para investimentos locais nas novas tecnologias de mobilidade.

 

Líder global no desenvolvimento da tecnologia de veículos eletrificados e com eficiência na produção de baterias e semicondutores, a China registrou, em 2022, participação de quase 30% de eletrificados nas vendas totais de automóveis no mercado local, fatia inicialmente projetada para 2025.

 

Com o consumo em crescimento acelerado, as fabricantes chinesas passaram a escolher outros países para expandir a tecnologia elétrica, e o Brasil entrou nessa rota. A aposta dos asiáticos é de alta constante do mercado, apesar de o segmento participar de apenas 2,5% das vendas de automóveis e não ter subsídios governamentais para a compra, como em outros países. Além disso, tem o etanol, considerado um “combustível verde” para amenizar os índices de emissão de carbono.

 

A GWM (Great Wall Motor) e BYD anunciaram investimentos de R$ 10 bilhões e R$ 3 bilhões, respectivamente, em operações no País. A primeira comprou a fábrica da Mercedes-Benz em Iracemápolis (SP), e a segunda está prestes a fechar a aquisição da planta da Ford em Camaçari (BA), ambas desativadas. A Chery escolheu a vizinha Argentina e deve investir R$ 2 bilhões para produzir carros elétricos e baterias, segundo fontes locais.

 

Entre as montadoras instaladas no Brasil há mais tempo, só a japonesa Toyota e a Caoa Chery produzem modelos híbridos flex (com motor elétrico que auxilia o motor principal a etanol ou gasolina).

 

“Com políticas públicas eficientes, as empresas chinesas fomentaram e concentraram suas fichas nos elétricos a bateria e estão à frente nessa corrida tecnológica”, afirma Adalberto Maluf, presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE). “Isso fez com que o país ganhasse escala grande em produção e competitividade e está liderando o processo de eletrificação no mundo.”

 

Segundo Maluf, nos países em que há políticas públicas para fazer a transição para a eletrificação, como México, EUA e alguns europeus, as montadoras locais estão anunciando produção. No caso do Brasil, as marcas mais tradicionais devem aguardar a introdução de uma política industrial para definir investimentos. “Elas primeiro terão de ganhar escala nos próprios países de origem para depois pensar em mudar as fábricas secundárias.”

 

Maluf avalia que as chinesas, por serem competitivas, estarem à frente do ponto de vista tecnológico e produzirem as próprias baterias e semicondutores, não vão atrás apenas de mercados que têm estímulos e política pública, mas daquele que também não têm, como o Brasil. “Elas sabem que seus produtos podem competir inclusive com aqueles à combustão”, afirma.

 

Para Henrique Antunes, diretor de vendas e marketing da BYD, por mais que as montadoras tradicionais tentem retardar o processo de eletrificação no Brasil, terão de acompanhar o mercado. “Quem dita isso é o consumidor e, quando a oferta for maior, fará com que o preço caia e o mercado ganhe destaque”, diz. “Mas nós não vamos esperar, pois, quando a demanda estiver madura, já teremos condições produtivas para atender.”

 

Futuro da mobilidade

 

Por vários anos observando o mercado brasileiro, que entre 2009 e 2016 vendeu mais de 3 milhões de veículos ao ano, a indústria chinesa só agora chega ao País com investimentos relevantes, e não mais de olho nos carros compactos populares, mas nos eletrificados, vistos como o futuro da mobilidade no mundo.

 

A maior fabricante global de carros elétricos e híbridos, a BYD, que no passado vendeu 1,9 milhão de unidades apenas na China – quase o mercado total brasileiro –, pretende ir além e fabricar também no Brasil chassis de caminhões e ônibus, atuar no processamento de lítio e, futuramente fazer até células de baterias.

 

A previsão é que, acertada a compra da fábrica na Bahia, a produção comece no fim de 2024 ou início de 2025. “O certo é que vamos produzir veículos de alta tecnologia e desenvolver uma cadeia produtiva local”, informa Antunes. “Queremos estar na vanguarda da eletrificação brasileira.”

 

Antunes ressalta que, no Brasil, o mercado total vem encolhendo nos últimos anos, porém a participação dos eletrificados saiu de 0,2% em 2019 para 2,5% no ano passado, “ou seja, é um mercado em crescimento”. Para este ano, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) projeta vendas de 70 mil eletrificados, ou 3,5% do total previsto para automóveis e comerciais leves.

 

Liderar o desenvolvimento

 

Com a fábrica em Iracemápolis (SP) passando por adaptações, a GWM pretende iniciar a produção de híbridos flex na primeira metade do próximo ano. O Brasil entrou no radar de investimentos da companhia em razão de suas energias verdes, como a hidrelétrica e a solar, afirma James Yang, CEO da empresa no Brasil e na América Latina. “O País também tem importante cadeia e pode fornecer veículos para outros países da região”.

 

De acordo com executivo chinês, mais do que ser líder do mercado de carros eletrificados, a marca quer liderar o desenvolvimento da indústria nacional nesse segmento. “Queremos trazer toda a nossa tecnologia, desenvolver um ecossistema no Brasil e buscar fornecedores locais de componentes.”

 

Os carros que a marca vai produzir inicialmente serão híbridos flex na faixa de preço intermediária entre os de entrada (mais baratos) e os premium (mais caros). O primeiro modelo que chega ao País importado nas versões híbrida e híbrida plug-in, o SUV Haval H6, vai custar de R$ 209 mil a R$ 299 mil.

 

A BYD, por sua vez, já tem planos para a produção local de carros de entrada. Antunes lembra também que os preços dos eletrificados estão caindo à medida que a escala de produção aumenta e o preço da bateria cai. “Há três anos o preço médio de um híbrido era de R$ 300 mil, e hoje está um pouco abaixo de R$ 200 mil”, afirma Antunes.

 

O executivo ressalta que o veículo eletrificado “não é só um carro com bateria embaixo do banco que consome menos combustível, mas um produto mais tecnológico, mais conectado e mais seguro, além de propiciar maior prazer ao dirigir”. O grupo já oferece seis modelos importados da China – 700 unidades acabaram de chegar ao País – e, desde o mês passado, oferece as versões elétrica e híbrida plug-in do Yuan pelo mesmo preço, a R$ 270 mil.

 

A BYD já está presente no Brasil como fabricante há oito anos, quando iniciou a montagem de ônibus elétricos em Campinas (SP), onde hoje também produz, em outra instalação, painéis solares. A empresa tem ainda uma planta em Manaus (AM) para baterias de ônibus.

 

Espera por incentivos

 

Com mais de 50 anos de Brasil, a japonesa Toyota foi pioneira na produção local de eletrificados com os híbridos flex Corolla (lançando em 2019) e Corolla Cross (2021). Os dois respondem hoje por 10% das vendas da marca no País e por 30% do mercado nacional de eletrificados, que somou 49,3 mil unidades em 2022.

 

Cássio Pagliarini, da Bright Consulting, avalia que os híbridos são, por enquanto, a principal opção para as fabricantes mais antigas porque o custo da bateria, que é maior nos carros elétricos, ainda é alto e torna o produto menos acessível.

 

Em sua opinião, a produção local das marcas veteranas será mais voltada a modelos mais baratos em relação aos anúncios que têm sido feitos até agora, inclusive pelas chinesas. “Outra grande vantagem é que serão veículos híbridos flex que, quando abastecido com etanol, têm impacto reduzido no meio ambiente”, diz.

 

A Stellantis, dona das marcas Fiat, Jeep, Citroën e Peugeot, por enquanto importa o elétrico Fiat 500e e o Jeep Compass híbrido plug-in. A companhia trabalha no desenvolvimento da tecnologia híbrida flex, mas um carro com essa opção ainda não tem data para produção local.

 

Outras marcas também importam modelos elétricos e híbridos, como Renault, General Motors, Honda, Nissan e BMW, mas nenhuma anunciou plano efetivo de produção nacional. A Volkswagen, que também trabalha no desenvolvimento da propulsão híbrida flex, não tem nenhum produto importado à venda, embora teste no País há algum tempo o elétrico ID.4.

 

O grupo brasileiro Caoa também produz, em parceria com a chinesa Chery, dois híbridos em Anápolis (GO), o Tiggo 5 e o Tiggo 7, e seu presidente, Carlos Alberto de Oliveira Andrade Filho, afirma que haverá novos produtos dessa linha na fábrica de Goiás e de Jacareí (SP). A planta está parada desde o ano passado e deverá retomar operações em 2025. (O Estado de S. Paulo/Cleide Silva)