Portal da Autopeças/Balcão Automotivo
Em 2022, as vendas de veículos seminovos e usados somaram mais de 13 milhões de unidades. A maior participação foi dos produzidos há 13 anos ou mais, com 33,3% do total, seguidos pelos com 4 a 8 anos de idade (26,4%). Já a fatia dos veículos com 9 a 12 anos de uso, os chamados usados maduros representaram 24,1%, e os mais novos de 0 a 3 anos, 16% do total.
Questionado se os consumidores estão adquirindo veículos com mais anos de uso, o presidente da Fenauto, Enilson Sales, respondeu: “não podemos fazer esta afirmativa, mas sim, que o consumo vem se mantendo sempre em uma proporção muito similar ano a ano. Exceto em 2021, quando faltou carro novo e as vendas de seminovos cresceram muito”.
Ele acrescenta que a sociedade tem um comportamento que varia muito pouco em termos percentuais para o consumo de carros. “Dentro das faixas econômicas da sociedade, percebemos claramente que elas se colocam muito alinhadas: o seu poder de compra com o ano do veículo”. Sobre o envelhecimento da frota, Enilson comenta que isso se dá basicamente pelo consumidor estar se afastando dos veículos novos.
“Seja pelo preço e a ausência dos novos no passado por falta de componentes eletrônicos e hoje basicamente por uma escolha das montadoras por trabalharem com modelos mais nobres, mais completos, o que faz com que o consumidor se afaste dos veículos novos e opte pelo seminovo ou pelo usado maduro”.
Sobre o balanço de vendas de 2022, ele diz que o resultado estava dentro do previsto e que para este ano, o volume de transações pode chegar a 15 milhões de unidades. “Se as condições forem razoavelmente normais, a gente pode dizer que 15 milhões de veículos para 2023 é razoavelmente dentro das nossas expectativas. Podemos fazer este número se não tivermos grandes solavancos na economia”.
Segundo Márcio de Lima Leite, presidente da Anfavea, com a atual taxa Selic de 13,75% ao ano é impossível pensar em retomada. “Com essa taxa de juros o nosso mercado não cresce. É uma característica do Brasil juros elevados, mas talvez haja espaço para alguma adequação, tanto que os próprios bancos e os grandes economistas não trabalham com essa taxa atual para o futuro. Nós desejamos que o novo presidente, Lula, no que ele tem mencionado sobre a redução da taxa, que ela ocorra no menor tempo possível”.
A taxa de juro alta impacta diretamente no volume de financiamentos, tanto que no ano passado, 75% das vendas de veículos novos foram à vista, um cenário oposto do que foi há três anos. Trata-se de um setor que depende muito do crédito. Para ilustrar, em 2022 foram emplacados 2,1 milhões de veículos, 0,7% menos que no ano anterior. A participação dos veículos leves (automóveis, picapes, vans e furgões) foi de 1,9 milhão de unidades, resultado 0,8% inferior a 2021. Para este ano, a Anfavea estima que sejam emplacados 2,168 milhões de veículos leves e pesados, se confirmado, o crescimento será de apenas 3% no comparativo com 2022.
Presidente da Fenabrave, Andreta Jr. conta que a preferência do consumidor sempre foi por veículos mais novos, com até 3 anos de fabricação. Porém, com a falta de peças para a fabricação e oferta de veículos novos, o mercado apresentou uma alta na transação de usados no ano passado. “A idade média da frota, apenas considerando autos e leves, é de 16 anos, mas a idade média dos veículos que vêm sendo transacionados, nos últimos anos, é de 12 anos”.
Ele ressalta que tem sido notado um certo padrão nas “ondas de troca”. “20% das transações ocorrem com veículos com até 4 anos de fabricação, 15% da comercialização de usados são de veículos entre 5 e 7 anos de idade e 10% das vendas, com veículos até 10 anos de fabricação. Por uma questão de política comercial, considerando que quanto mais velho mais difícil é revender um veículo usado, a maior parte dos comerciantes opera com usados na faixa até 7 anos de fabricação, que representam 35% do mercado de usados”.
No País são cerca de 7.300 concessionárias. A Fenabrave não tem estatísticas sobre a participação dessa rede nas vendas de usados e seminovos. “Mas vale ressaltar que a maior parte dos veículos novos, comercializados pelas concessionárias, têm um usado envolvido na negociação, o que eleva, proporcionalmente, a participação das concessionárias na comercialização de veículos usados”, afirma Andreta Jr.
No que tange à manutenção, o executivo diz que “a tendência do consumidor é cuidar cada vez melhor de seus veículos, embora a maior incidência de manutenção regular se dê enquanto duram as garantias de fábrica” e que as concessionárias sempre estiveram preparadas para atuar na manutenção e comercialização de veículos usados. “Pois, na maior parte das negociações, usados são ofertados como parte de pagamento de veículos novos”.
Em 2022, o faturamento da indústria de autopeças foi de R$ 191 bilhões, sendo 65,1% para montadoras, 18,4% para o segmento da reposição, 13%, exportações, e 4,3% as vendas intrassetoriais (um fabricante de autopeças fornecendo para outro). “Percebe-se de que há alguma variação estatística, mas a participação de cada segmento na distribuição do faturamento da indústria de autopeças mantém-se praticamente a mesma, com as vendas para montadoras na liderança”, comenta Cláudio Sahad, presidente do Sindipeças.
Com base no levantamento do Sindipeças de 2021, em breve a entidade apresentará os números de 2022, a frota circulante de automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus foi de 46,6 milhões de unidades. O crescimento sobre o ano anterior foi de 0,7%. A idade média, de 10 anos e 3 meses, vem aumentando desde 2014. Em quase uma década, de 2013 a 2021, o envelhecimento elevou-se em 1 ano e 10 meses.
Para atender esta frota, Claúdio afirma que as indústrias associadas à entidade estão preparadas. “Nossos associados fornecem para a montagem de veículos e atuam no mercado de reposição de autopeças, uma vez que o setor é responsável pela manutenção da frota circulante brasileira e esteve sempre preparado para isso. Não há problema com o fornecimento de peças para manutenção dessa frota”. E se o envelhecimento da frota pode refletir numa mudança de produção nas indústrias de autopeças, ele respondeu que não é possível dar uma resposta conclusiva a essa pergunta.
“Nos últimos anos, a busca das montadoras pelo aumento do ticket médio dos veículos, com maior volume de conteúdo importado, somada ao crescimento das taxas de juros nos financiamentos, impactou no envelhecimento da frota nacional. Porém, não é possível dar uma resposta conclusiva a essa pergunta. A variedade de produtos é imensa e a participação das empresas no mercado é bastante variada. É bom considerar que as vendas para o mercado de reposição têm representado de 18% a 19% das vendas totais do setor”.
Para finalizar, o presidente da entidade diz que o envelhecimento da frota é ruim para o País pelos problemas que pode causar ao meio ambiente e à segurança de motoristas, passageiros e pedestres, mas que é possível manter essa frota bem conservada. “Por isso, além de um Programa Nacional de Renovação de Frota, também defendemos a ITV (Inspeção Técnica Veicular). É importante frisar que os associados do Sindipeças fornecem para a montagem e também atuam no mercado de reposição de autopeças, sendo que nosso setor é responsável pela manutenção da frota circulante brasileira e esteve sempre preparado para isso”.
Diretor Geral da GiPA do Brasil, Laurent Guerinaud, avalia que para o setor de reposição automotiva o envelhecimento da frota tem um impacto positivo na manutenção e negativo na parte de funilaria. “Conforme a frota de veículos envelhece, ela traz um faturamento maior para o aftermarket. Os carros com mais de 15 anos de uso têm um custo anual de manutenção 27% superior à média, porém, a tendência é de menos manutenção preventiva, o gasto maior é com a corretiva. Na parte de funilaria os impactos são negativos, pelo poder aquisitivo dos donos de carros antigos ser menor e por às vezes o valor do reparo não compensar quando comparado ao valor do carro”.
Laurent comenta que o envelhecimento da frota é uma tendência global e já existia antes da pandemia. “A GiPA tem uma ampla experiência de cálculo de frota circulante em mais de 35 países. Na maioria dos países onde a GiPA está presente, observamos, pontualmente, que a frota pode até rejuvenescer em alguns países. Porém, a tendência é de envelhecimento, pois 50% dos carros emplacados há 20 anos continuam em circulação”.
Para mudar esse cenário, ele diz que seria necessário um volume exponencial de emplacamentos e medidas governamentais. “Matematicamente é impossível sustentar o rejuvenescimento do parque em longo prazo, a menos que tenham medidas governamentais para reduzir o prazo de vida dos carros e excluir de circulação os mais antigos, mas isso não tem hoje no Brasil e até nos países onde tem tais medidas, o parque continua envelhecendo”.
Um envelhecimento que tem um impacto muito importante para o aftermarket e Laurent destaca alguns pontos de atenção. “Não basta apenas olhar para a idade média do parque e a proporção de carros mais velhos. É interessante observar também a evolução do parque e a sua estrutura por idade, porque tem os veículos mais novos que frequentam as concessionárias, os que saíram do período de garantia e os veículos mais antigos”.
Essa análise, segundo ele, significa dizer que os donos de veículos que saíram da garantia têm um poder aquisitivo melhor do que os que têm carros mais antigos. “Para atender esse público de veículos mais antigos, é preciso ter uma oferta muito adequada de peças e serviços. Os intermediários que deixaram de frequentar as concessionárias têm um certo poder aquisitivo e o desafio das concessionárias é aumentar a fidelização deles. As montadoras estão trabalhando muito fortemente nisso, após anos seguidos de “maus” emplacamentos. Outro canal que pode aproveitar isso são as oficinas”.
Nas palavras de Heloisa Monzani, diretora da TecAlliance para o Brasil e América do Sul, são vários os fatores para os consumidores adquirirem veículos com mais anos de uso nos últimos 10 anos. “Em 2022, podemos citar alguns pontos importantes, tais como: a queda de produção de veículos novos pela falta de componentes, o aumento do preço dos veículos novos ou seminovos, a inflação que voltou a preocupar o Brasil e que tem sido um problema para diversos países que não sofriam deste mal há décadas”.
Ela explica que a combinação de inflação acima da expectativa, alta nos preços dos veículos e a incerteza política e econômica levaram os consumidores a buscarem veículos mais antigos e mais baratos. “Com a particularidade de que em alguns Estados, veículos entre 10 e 20 anos são isentos do IPVA, outro motivo que leva as pessoas a optarem pela compra dos ‘velhinhos’”.
E que o processo de envelhecimento da nossa frota foi acentuado nos últimos 10 anos, ao contrário da europeia, “que sofreu o impacto da crise de 2007/2008 muito mais duramente que nós, mas o fenômeno é global. Ainda assim, a idade média da frota do Brasil, de 11,8 anos, em 2022 é mais jovem que a média europeia. Nas cinco maiores frotas europeias, a idade média é: Alemanha, 9,8, França, 10,3, Itália, 11,8, Espanha, 13,1 e Polônia, 14,3. Cabe mencionar as políticas governamentais de cada país e da União europeia para a substituição da frota diesel para elétricos e híbridos minimizando a taxa de envelhecimento”.
Na avaliação de Heloísa, o envelhecimento da frota tem impactos negativos e positivos. “Negativos, porque a venda de veículos novos tem uma participação muito importante na nossa economia de forma geral e movimenta uma cadeia de negócios e oportunidades muito longa e importante. Positivos, porque nosso mercado vive da venda de peças para veículos fora da garantia e quando esta fatia aumenta, a reposição em geral é positivamente afetada, bastando observar os resultados do nosso mercado mesmo durante a pandemia”.
E que, logicamente, “as peças para os veículos novos, com mais tecnologia embarcada, são naturalmente mais caras e isto propicia um faturamento mais elevado, mas nos veículos mais antigos, as peças que se trocam também são peças mais técnicas: peças de motor, embreagem, transmissão, não ficando restrito somente as peças de revisão, como filtros, óleo e pastilhas”.
Para finalizar, ela ressalta que se não houver uma renovação da frota, em médio e longo prazos, os efeitos serão negativos para o setor e para a economia. “Precisamos que novos veículos entrem em circulação para manter e aumentar a nossa frota, principalmente de veículos que valham a pena fazer a manutenção e que não signifiquem um risco para a segurança dos condutores e os demais aspectos relacionados com a qualidade de vida e de mobilidade da sociedade”.
Um levantamento inédito da Mobiauto revelou que em 2022, entre os 100 modelos e versões mais clicados pelos potenciais compradores, 51 modelos não são mais produzidos, os chamados fora de linha. “Indiscutivelmente é uma imensa mudança. O consumidor brasileiro está mais maduro. E a própria diversidade de modelos e versões, ante o que tínhamos décadas atrás, promoveu essas mudanças de hábitos”, afirma Sant Clair Castro Jr., consultor automotivo e CEO da Mobiauto.
Uma diversidade que ele explica como funciona. “Há dez anos, quando eu resolvia comprar um SUV usado, compacto ou médio, as opções que existiam eram poucas: EcoSport, Blazer, Vitara e Tucson. Quando a Blazer saiu de linha, em um nicho tão estreito, isso ganhava uma relevância grande, pois os consumidores se assustavam com o risco da depreciação acentuada. Hoje, o mercado é muito mais pulverizado e qualquer escolha de SUV usado, para ficar no mesmo exemplo, permite que você encontre 10, 12 ou 15 veículos diferentes”.
Do levantamento, ele destaca outras constatações. “Há várias curiosidades que podem ser destacadas de acordo com esse levantamento, como o predomínio absoluto das picapes produzidas pela Fiat na preferência do consumidor (Strada e Toro), o final da maldição contra carros de origem francesa (principalmente da Renault, que têm se saído muito bem) ou a ascensão de marcas como Hyundai e Nissan na lista dos modelos mais procurados”.
Ainda de acordo com ele, o movimento de compra e venda no segmento de seminovos e usados foi bastante acentuado nos últimos anos. “O cliente A vende seu carro 2015 e adquire um 2020. O consumidor B pega esse 2015 e vende o 2011, que é passado às mãos do cliente C, que assume o 2011 e vende o 2002. E assim por diante. Como entraram menos unidades zero km nas ruas, devido à queda nas vendas, a idade média da frota acaba aumentando”.
Os chamados fora de linha continuam em circulação e Heloisa Monzani, diretora da TecAlliance para o Brasil e América do Sul, diz que é uma oportunidade para o mercado de reposição. “Nosso mercado, principalmente distribuidores e autopeças, via de regra possuem estoques de peças destes modelos que não mais produzidos e garantem o abastecimento da demanda existente. Este aumento nas vendas de veículos que não são mais produzidos estimula que os mesmos tenham que ser revisados, ou pelo vendedor ou pelo comprador, para circular de forma mais econômica e segura, ou seja, é uma oportunidade comercial importante de curto prazo”. (Portal da Autopeças/Balcão Automotivo/Karin Fuchs)