O Estado de S. Paulo
A mãe das decisões tomadas pelo governo no caso dos preços dos combustíveis não tem nada a ver com questões propriamente técnicas. Trata-se de impedir que uma disparada de preços ao consumidor inviabilize de uma vez a reeleição do presidente Bolsonaro. Mas o governo não sabe quem deve pagar a conta.
O próprio Bolsonaro já disse que o atual critério de formação de preços, atrelado ao mercado internacional, “está errado”. Mas não diz qual é o certo.
A decisão a ser tomada de achatar os preços de mercado é supostamente temporária. Essa “temporariedade” já não tem a ver com a duração da guerra. Tem a ver com o objetivo eleitoreiro dessa intervenção. Portanto, em princípio, não deverá avançar para além de novembro. Não está claro qual será o critério que prevalecerá a partir daí, de modo a que não volte a recair na “decisão errada”.
Os dois projetos-base em exame no Congresso não atendem à urgência, ainda que “temporária”. Uma das propostas prevê a criação de um fundo de compensação. Independentemente de onde sairão os recursos para esse fundo, no momento não há fundo nem de onde tirar os recursos destinados a pagar a conta que será poupada do bolso do consumidor de combustíveis.
A outra proposta prevê a cobrança de ICMS fixo por litro de combustível, e não mais sobre o preço final. Se, apesar da cerrada oposição dos governadores, esse projeto for aprovado, o alívio sobre a conta do consumidor será quase insignificante e talvez não sirva para a finalidade prevista pelo governo, que é garantir as boas graças do eleitor.
No curto prazo, as propostas oscilam de acordo com a maré determinante do dia. Ora sugerem que o subsídio dos combustíveis seja descarregado sobre o Tesouro. A ideia pressupõe que essas despesas extras não componham o teto dos gastos, portanto, equivaleriam à licença para criar novo rombo.
Outras propostas pretendem empurrar essa conta para a Petrobras. O impacto não se limitaria ao seu caixa. Seria entendido como grave intervenção nas finanças da Petrobras, fato que afugentaria novos investimentos em petróleo. Levando-se em conta que entre 20% e 25% dos combustíveis, principalmente diesel, são importados, obrigar a Petrobras a importar com prejuízo varreria do mapa esses importadores de combustíveis.
Se uma das propostas em discussão é usar os dividendos da Petrobras para composição do fundo de compensação, a perda de receitas acabaria por achatar seu lucro e, portanto, a distribuição de dividendos.
A solução ou o mix de soluções, quaisquer que sejam, podem produzir distorções até maiores do que as de descarregar sobre o consumidor o preço dolarizado dos combustíveis. (O Estado de S. Paulo/Celso Ming)