Stellantis vê na América Latina o terceiro reator da montadora

O Tempo

 

O CEO mundial da Stellantis, Carlos Tavares, disse hoje a jornalistas brasileiros, dentre eles O Tempo e Rádio Super, que a multinacional vê na América Latina a possibilidade de transformar a região no terceiro reator da montadora que é a quarta maior do mundo.  A Stellantis é representada por 14 marcas resultado da fusão, há 1 anos, dos grupos Fiat Chrysler e PSA – Peugeot, Citroen. Ainda hoje, Tavares apresenta o plano estratégico de longo prazo da Stellantis para os próximos anos.

 

Para Tavares, a Stellantis na América Latina (incluindo países do Mercosul e o Brasil) é um exemplo de vitória para o resto da empresa com uma equipe que funciona, que sabe os objetivos que deve atingir, com capacidade e preço final, e que consegue os resultados. “Para nós, a Stellantis América Latina é um exemplo que todas as outras regiões podem seguir: operacional, resultados e compreensão das estratégias”, disse o CEO.

 

Tavares disse que a Stellantis está magnífica na Europa e na América do Norte. “Estas duas regiões representam cerca de 90% dos nossos lucros e é um movimento que queremos passar de um bireator para um trireator porque os aviões voam melhor com três reatores do que com dois.Temos dois reatores muito importantes que são a América do Norte, a Europa e lá atrás vem a região que é a América Latina. Estamos à procura de um terceiro reator e o primeiro candidato a ser esse reator (da Stellantis) é a América Latina que tem crescimento econômico que é grande”, avaliou Tavares.

 

Tavares contou que o mercado da América Latina é um mercado pequeno de 4 milhões a 5 milhões de unidades, mas que pode chegar de 7 milhões a 10 milhões de unidades para se aproximar do tamanho do mercado europeu ou americano.

 

Além disso, o CEO, de origem portuguesa, avaliou que o mercado europeu está abaixando: “um mercado que estava antes da Covid de 18 milhões e agora são 15 milhões. E não há muita expectativa de que esse mercado somente cresça muito. “Então pode haver uma terceira via: Temos um potencial na América Latina para aumentar, portanto estou vendo um reequilíbrio entre os dois mercados. Temos um potencial na América Latina para aumentar”, afirmou.

 

Na questão da sustentabilidade, principalmente na eletrificação e na neutralização das emissões de gás carbônico, Tavares disse que o investimento em eletrificação é uma opção tomada contra o combustível fóssil ou aceitando o fóssil como uma transição. “Isso quer dizer que vamos muito rapidamente para os veículos elétricos, mas se formos apenas para os veículos elétricos, com os carros elétricos, esquecemos da energia, esquecemos da pegada do carbono na fabricação da bateria, esquecemos da pegada de carbono na extração das matérias-primas, esquecemos da pegada de carbono na reciclagem das baterias. Se se é dogmático na mobilidade não querendo mais o fóssil, temos que ser rigorosos para que no ciclo completo da fabricação do veículo elétrico, esse ciclo tem que ser rigoroso”, explicou o CEO mundial da Stellantis.

 

Uma das consequências do veículo elétrico na Europa, de acordo com Tavares, é que ficou explícito a necessidade de mais centrais elétricas, senão não há energia. “Não podemos ser superficiais, nem dogmáticos”, disse.

 

No caso do veículo flex, Tavares afirmou que essa é uma solução local e faz muito sentido e permite baixar as emissões com volume de vendas muito importante. “Os carros (flex) podem ser comprados pelas classes médias com preços razoavelmente aceitáveis. Se os volumes de vendas forem importantes, vamos ter impacto benéfico na natureza, enquanto se for vender veículos elétricos só para ricos o volume será pequeno e o impacto na natureza será mínimo e tem que andar muitos quilômetros de veículo elétrico para compensar. Um veículo elétrico tem que andar 85 mil quilômetros para compensar a má performance da fabricação da bateria e a má performance do mix energético.  Se ficar só no nível dogmático as sociedades podem fazer muitos erros e isso é um risco”, criticou.

 

A seguir, a entrevista dada a O TEMPO e Rádio Super:

 

Helenice. Quais as importâncias das fábricas do grupo Stellantis, não somente em Minas Gerais, mas em todo o Brasil e em outros países da América Latina, para que a América do Sul seja um reator do grupo?

 

Carlos Tavares. Podemos evidenciar algumas prioridades: uma delas é, obviamente, tentar estabilizar a economia, o que tem sido muito difícil nas últimos décadas, tentando dar continuidade aos esforços que são feito para construir valor. Na indústria de automóvel nada acontece em menos de 5 anos, e quando são mudanças profundas são necessários dez anos. portanto temos que dar estabilidade na economia da América do Latina para que as empresas possam trabalhar nessa continuidade, com essa constância. Primeira coisa é tentar estabilizar a economia para que a riqueza criada pela América Latina possa aumentar. A partir do momento que a riqueza da America Latina aumentar, o poder econômico por habitante vai aumentar e obviamente estamos aqui para propor soluções de mobilidade que sejam seguras, limpas e que as pessoas possam comprar. Se os políticos conseguirem criar essa estabilidade econômica e esta trajetória, estamos aqui para oferecer a mobilidade. Obviamente, que toda vez que se faz uma mudança brutal de direção (no setor automobilístico) tem um custo. Tem o primeiro custo que são os investimentos que foram feitos no passado e não são utilizados até o fim da sua vida e tem que se investir muito mais para se mudar de direção à procura de um outro objetivo. As mudanças brutais de direção têm um custo para nós e para a sociedade no pós-investimento para a infraestrutura que acabam por ser parte dos impostos do cidadão. Então a primeira condição é a estabilidade econômica e a segunda condição é tentar dar uma direção fixa para um tipo que permita às empresas construir valor e oferecer esse valor as sociedades. E a terceira condição é ter a inteligência de desenvolver soluções locais que podem funcionar muito bem no Brasil ou no Mercosul ou na América Latina e podem não funcionar na Ásia, na Europa e nos Estados Unidos. Temos que aceitar que haja um gênio local que ponha em cima da mesa soluções locais. E essas questões eu recomendo que não haja pragmatismo e que haja uma abordagem premática do que deve fazer. Por outro lado temos que fazer com que essas soluções possam ser compradas pelos cidadãos porque se for só para ricos, vamos criar outro problema. Eu não sou político, nem quero ser político, mas é uma vontade de ajudar que eu digo isso.

 

Helenice. Nessa nova fase de tech company do grupo Stellantis, as montadoras da América do Sul vão ter protagonismo em lançamentos de veículos tecnológicos ou vão apenas montar projetos que são feitos na Europa ou América do Norte?

 

Carlos Tavares. Há oportunidades para a América Latina porque estamos a falar de educação científica. Desde que uma região tenha capacidade de oferecer a sua juventude uma educação científica de alto nível, desde que se criem condições para que pequenas e médias empresas possam ser criadas a partir do entusiasmo da imaginação e da competitividade de equipes jovens, obviamente, há uma oportunidade. Outra questão é: Por que chegamos a um ponto que precisamos proteger do ponto de vista fiscal as pequenas e médias empresas? Chegamos a um ponto que o nosso sistema está asfixiado nas pequenas empresas. Temos que criar esse contexto de educação cientifica para os jovens, de proteção fiscal de jovens empresas que podem se desenvolver. E quero terminar com mais um comentário: está na moda, nos nossos países, dizer que as grandes empresas multinacionais são o diabo, só pensam nos lucros. É um conceito obstruído. As grandes empresas são as que empurram tudo e levam conosco a pequenas e médias empresas. As grandes empresas são aquelas que oferecem um contexto de ecossistema que permitem as pequenas empresas se envolver.  Muitas vezes as multinacionais são criticadas por uma certa frieza e falta de compreensão no mundo em que estamos vivendo. Nós temos essa compreensão, somos seres humanos como os outros e estamos a ajudar muitas pequenas empresas. (O Tempo/Helenice Laguardia)