O Estado de S. Paulo
Ricardo Barion trabalha com caminhões há mais de 25 anos. O engenheiro mecânico iniciou sua carreira na Ford, em marketing e produto, e continuou na mesma área por mais 17 anos, período no qual trabalhou na Volkswagen/man. Em 2015, ingressou na Iveco, onde ocupa atualmente o posto de diretor comercial. Barion sabe tanto do assunto que é comum ser destacado como porta-voz da marca italiana, que produz veículos em Sete Lagoas (MG). Ao Estadão, o executivo falou sobre a alta de 95% nas vendas de pesados em 2021, os desafios impostos pela falta de peças e os planos para 2022, que incluem o teste de 22 caminhões a gás para longas distâncias com clientes brasileiros.
Como foi o desempenho da Iveco no País em 2021?
Em 2021, a gente sofreu muito com problemas no fornecimento de peças, sobretudo de componentes eletrônicos, não só de semicondutores. Também tivemos dificuldades com outros insumos, como pneus e plásticos. Isso fez com que tivéssemos de ajustar a produção a ponto de ter de parar nossa linha. E, quando os componentes chegavam, tínhamos de acelerar a fábrica para atender a demanda. Seja como for, fizemos um trabalho muito bom porque, apesar das dificuldades, crescemos em todos os segmentos em que atuamos. No caso dos pesados, a gente cresceu 95%. Ou seja, quase dobramos as vendas. Então, eu diria que 2021 foi o ano de sustentação e consolidação da marca. A gente lançou a nova Daily em 2020. Então, já vínhamos em uma trajetória muito positiva. E acreditamos que em 2022 a gente deve manter esse ritmo de crescimento.
Em 1.º de janeiro, a Iveco passou a ter uma nova estrutura. Quais são os resultados práticos disso?
Antes, fazíamos parte do grupo CNH. Ou seja, juntamente com a Case e a New Holland, incluindo as áreas agrícola e de construção. Agora, junto com a FPT (motores), nos tornamos o Grupo Iveco e somos focados em veículos comerciais, ônibus e caminhões. A FPT fornece os motores de todos os nossos modelos. Na CNH, algumas áreas prestavam serviço para todas as marcas. A mudança nos deu mais agilidade.
Há planos de lançar veículos elétricos no Brasil?
Na Europa, temos diversos veículos movidos a combustíveis alternativos e elétricos, como a linha Daily (vans, furgões e caminhões leves). Também temos parceria com a Nikola (marca de caminhões dos EUA) e acabamos de produzir o primeiro modelo 100% elétrico. Ele vai ser produzido na nossa fábrica na Alemanha. Uma versão elétrica do (caminhão Iveco) Sway, baseado na mesma plataforma do Nikola, será lançada ainda neste ano. Além disso, somos líderes na venda de veículos a gás, e acreditamos que essa tecnologia é adequada para o Brasil. Vamos começar a testar caminhões pesados a gás com alguns clientes brasileiros neste ano. Os pesados a gás estão muito próximos da realidade brasileira. Isso não quer dizer que a Iveco não tenha intenção de lançar veículos elétricos no Brasil. Mas, neste momento, não é nossa prioridade.
São 20 Hi-way de longa distância a gás, certo? Quando o S-way virá ao Brasil?
Sim, são H-way feitos na planta de Sete Lagoas (MG) e com motor a gás. A gente tem pela frente uma mudança radical no controle de emissões de poluentes. Então, todos os nossos investimentos estão sendo feitos para mudar nossa linha de produtos que será vendida a partir de janeiro de 2023. Obviamente, o S-way (sucessor do Hi-way) vai ser vendido no Brasil. Mas não sei dizer se isso será já em 2023.
Há cada vez mais eletrônica e conectividade nos caminhões. O brasileiro está disposto a pagar por isso?
A telemetria e a conectividade ajudam a gestão de toda a operação. Temos uma sala de controle em Sete Lagoas onde a gente consegue ver como está a operação de cada cliente. O operador pode até entrar em contato com um motorista, por exemplo, e fazer recomendações para ele melhorar a forma de condução. Antigamente, a gente entregava o caminhão ao cliente e não tinha ideia de como ele operava. Agora, podemos oferecer, por exemplo, contratos de manutenção personalizados. Dá até para saber que tal componente precisa ser trocado e informar que ele precisa procurar o concessionário mais próximo. Ou seja, isso ajuda na manutenção preventiva e corretiva. Quando o cliente consegue enxergar esses benefícios, ele paga. Isso é mais comum no caso de donos de caminhões para longas distâncias, que são mais caros. Os donos de veículos leves estão mais familiarizados com sistemas de conectividade de automóveis. Assim, eles também valorizam essas soluções. Seja como for, são os donos de pesados que mais investem em novas tecnologias.
A Iveco lançou a nova linha Daily, para entregas urbanas. Como será o desempenho desse setor em 2022?
Em 2021, a linha Daily cresceu 50%. Fomos líderes em chassi cabine, entre caminhões de 3,5 a 8 toneladas. Com a Daily 35, fomos os primeiros do País a ter um modelo Euro 6, que é 100% alinhado com o vendido na Europa. Ele tem mais conforto e tecnologias que permitiram reduzir o consumo de combustível. Vamos acompanhar o crescimento do mercado, que deve ficar entre 5% e 10%. Os grandes clientes estão atentos a fatores como as mudanças de legislação. A antecipação das compras para evitar o aumento de preço também aconteceu na linha Daily.
Quando a cadeia de fornecimento vai se regularizar?
No momento, não temos essa visibilidade. O ano de 2022 começou com as mesmas dificuldades de 2021 e um agravante, o avanço da Ômicron aqui e no exterior. Isso impacta toda a cadeia produtiva, inclusive nossos fornecedores. A logística também continua complicada. Muitas vezes não há nem contêiner nem navio para trazer componentes. Fazemos reuniões diárias da gestão da produção e estamos muito atentos a esse movimento. Um ponto positivo é que em 2022 vai haver a Fenatran (maior feira do setor de transportes da América do Sul). E deve haver antecipação de compras por causa da mudança da legislação de emissões, no início de 2023. Isso deve causar aumentos nos preços. (O Estado de S. Paulo/Tião Oliveira)