AutoIndústria
Com a missão de combinar rentabilidade com crescimento das vendas e participação de mercado, o alemão Achim Puchert, 42 anos, assumiu seu posto esta semana na sala da presidência da Mercedes-Benz do Brasil em São Bernardo do Campo, SP, em substituição a Karl Deppen, que após 15 meses no País foi transferido ao comando das operações da Daimler Trucks na Ásia.
O novo presidente chega no momento em que a fabricante perdeu a liderança nas vendas de caminhões no mercado interno após cinco anos no topo. A montadora teve dificuldades para atender todos os pedidos devido à falta de peças para produzir e encerrou 2021 com 33 mil caminhões entregues, expansão de 23,7%, bastante abaixo da média do mercado, que cresceu 43,5%.
A boa notícia é que as previsões são de crescimento continuado em 2022 — as fábricas de Juiz de Fora, MG, e São Bernardo têm trabalhado em três turnos para dar conta da demanda. Já a divisão de chassis de ônibus deve seguir estagnada após queda de 9,6% nas vendas em 2021, para 5,8 mil unidades. O volume foi suficiente para sustentar a liderança do segmento que já dura mais de seis décadas, ainda que o desempenho também tenha sido inferior ao do setor, que ficou praticamente estacionado em relação a 2020.
“Precisamos encontrar o balanço entre rentabilidade e market share para ter um negócio sustentável, o ideal é a combinação dos dois fatores. Mas temos uma operação bastante competitiva no Brasil”, afirmou Achim Puchert em seu primeiro contato com a imprensa brasileira nesta quinta-feira, 13, apenas dois dias após desembarcar no País.
Ao lado do novo presidente, também em sua primeira visita à operação brasileira desde que assumiu no ano passado o posto de CEO global da Mercedes-Benz Trucks, a sueca Karin Rådström reafirmou que a subsidiária vem fazendo avanços na busca por rentabilidade.
“Temos muitos desafios pela frente, não está tudo resolvido ainda, mas estamos em um bom caminho para consolidar um negócio robusto, dentro da meta global de aumentar market share com faturamento crescente”, ponderou.
Rådström também destacou que a nova gestão no Brasil começa em uma nova fase da companhia, formalmente separada em duas no mundo todo desde dezembro, com a divisão de caminhões e ônibus Daimler Trucks & Buses agora dirigida como empresa independente da Mercedes-Benz Cars & Vans.
Segundo ela, a nova configuração deverá aumentar as sinergias entre as diversas subsidiárias e acelerar processos. “Quando você fica menor o sistema decisório se torna mais rápido. Este é um dos benefícios da cisão que terminamos no mês passado”, afirma.
A executiva aponta ainda que a subsidiária brasileira tem contribuições a dar à gestão global da Daimler Trucks. “O negócio de caminhões no Brasil é centrado nas necessidades dos clientes. Temos colaboração estreita com a rede, os problemas deles também são nossos. Essa relação tem valor e serve de exemplo para nossas operações no mundo todo”, ela diz.
Investimentos
Puchert chega no último ano do programa de investimentos da Mercedes-Benz no Brasil, que envolve aportes de R$ 2,4 bilhões de 2018 a 2022. Pouco mais de R$ 2 bilhões já foram gastos: R$ 1,4 bilhão no desenvolvimento da nova geração do caminhão pesado Actros, que começou a ser vendido em 2020 no mercado brasileiro, R$ 300 milhões para lançar ano passado o Arocs no Brasil – para operações de mineração –, R$ 100 milhões no chassi de ônibus elétrico urbano eO500U, que deve ser lançado este ano, além de R$ 207 milhões já direcionados para a adoção de novas linhas de manufatura digitalizadas de cabines e chassis.
Os aportes devem terminar este ano com a digitalização dos processos de produção de motores e transmissões, além do desenvolvimento de motores Euro 6 que vão equipar os veículos diesel no País com a nova fase da legislação de controle de emissões para veículos pesados, o Proconve P8, que entra em vigor a partir de janeiro de 2023.
Segundo o novo presidente, ainda não há planos para um novo ciclo. “Primeiro vamos esperar a materialização dos investimentos já feitos, só depois disso estudaremos a necessidade de um novo programa”, afirma — em recente apresentação a analistas, o Grupo Daimler informou que trabalha para reduzir os aportes, com “alocação de capital mais inteligente”.
Para Puchert, muito do que era necessário já foi feito: “Muita coisa mudou desde a última vez que estive no Brasil. Pelo pouco que já pude ver, temos uma linha competitiva de produtos e as linhas de produção foram completamente modernizadas, são muito produtivas”, destacou. Há quase 20 anos no Grupo Daimler, Puchert ocupou cargos internacionais de liderança em diversos países e no último ano comandou a divisão de mercados de exportação da Daimler Trucks & Buses. Com base nessa experiência, o executivo avalia que a operação brasileira tem condições de aumentar suas exportações.
“O foco do Brasil sempre foi atender primeiro o mercado local, mas temos oportunidades de exportar mais com um centro de desenvolvimento tecnológico que pode desenvolver modelos específicos. Antes disso, contudo, precisamos atender todos os clientes que estão esperando por caminhão aqui”, pondera.
De volta à liderança?
Roberto Leoncini, vice-presidente de vendas e marketing da Mercedes-Benz do Brasil, atribui a perda do primeiro lugar no mercado brasileiro de caminhões exclusivamente às dificuldades de produção impostas pela falta de componentes, principalmente semicondutores. “Sempre disse que a liderança é uma resposta do cliente ao que entregamos, mas no ano passado a questão foi a falta de peças, que nos fez perder muitas vendas”, explica.
“Demanda existe e estamos fazendo a nossa parte. A meta é recuperar a capacidade de produção e continuar a oferecer produtos e serviços ‘top of mind’. Temos condições de voltar à liderança, mas ainda temos muitos problemas de abastecimento, continuamos a lutar todos os dias por peças”, diz.
Diante dos vários problemas, Leoncini avalia que o resultado de 2021 foi bom para Mercedes, lembrando também que a empresa teve desemprenho expressivo na venda de peças, que cresceu 41%, e serviços – mais da metade dos caminhões foram vendidos atrelados a contratos de manutenção e 60%, entregues com o sistema de conectividade FleetBoard ativado.
O executivo afirma que o mercado de caminhões segue muito aquecido em 2022, com as encomendas em alta do agronegócio, mineração, construção civil e comércio eletrônico. Por isso espera-se mais um ano de crescimento, em linha com as projeções apresentadas semana passada pela Anfavea, a associação dos fabricantes, que estima a venda de 140 mil caminhões este ano no Brasil, o que representará expansão de quase 9% sobre 2021.
Leoncini avalia ainda que o baixo crescimento econômico e alta nas taxas de juros vão ter impacto negativo na decisão de compra dos clientes em 2022, mas pondera que talvez esses não sejam os maiores problemas do setor de caminhões.
“O cliente está sendo mais impactado pelo preço do diesel (aumento de quase 50% no último ano), mas vai continuar a comprar mesmo assim, desde que exista um contrato de transporte por trás disso. Para ele a variação do PIB para baixo ou para cima importa menos se tiver 280 milhões de toneladas da safra brasileira de grãos para transportar”, indica. (AutoIndústria/Pedro Kutney)