Mais energia limpa para um mundo melhor

O Estado de S. Paulo

 

Talvez ainda soem um tanto retóricas afirmações frequentes de dirigentes da Agência Internacional de Energia (AIE) de que está se consolidando uma nova economia mundial de energia, baseada em fontes renováveis e limpas, neutras do ponto de vista da emissão de gás carbônico. A forte participação de combustíveis fósseis na matriz energética do planeta alimenta o ceticismo. Dados recentes e projeções para os próximos anos, no entanto, fortalecem as previsões que esse novo mundo da energia, bem menos agressivo ao meio ambiente, pode ser alcançado. Políticas governamentais, metas climáticas mais rigorosas definidas em reuniões internacionais e oportunidades econômicas geradas pela preocupação mundial com a redução das emissões de carbono impulsionam a busca por energia sustentável.

 

A capacidade mundial de geração de energia elétrica renovável e limpa, como a eólica e a solar, teve aumento sem precedentes em 2021, de acordo com relatório da AIE. A Agência estima que o aumento em 2021 será maior do que o de 290 gigawatts (GW) registrado em 2020. Com essa previsão, a AIE elevou para 4.800 GW suas projeções para as instalações de energia limpa disponíveis até 2026.

 

Essa capacidade, se alcançada, será 60% maior do que a disponível em 2020 e equivalerá a toda a capacidade atual de geração de energia elétrica de origem nuclear e de energias fósseis juntas.

 

De todo o aumento da capacidade de energia nos próximos cinco anos, as energias renováveis devem responder por quase 95%. A energia solar responderá por metade de tudo o que o mundo ganhará de capacidade de geração de energia. Para o diretor executivo da AIE, Fatih Birol, esses recordes “são mais um sinal de que uma nova economia global de energia está emergindo”.

 

A China lidera a mudança e deverá responder por mais de 40% de todo o aumento da capacidade. Em seguida vêm a União Europeia, os Estados Unidos e a Índia.

 

Mudanças notáveis observam-se também no Brasil. A escassez de chuvas que gerou forte preocupação com a capacidade das usinas hidrelétricas e temor de racionamento ou de apagões – além de ter elevado o custo médio da energia elétrica em razão da utilização mais intensa de usinas termoelétricas – fortaleceu a percepção geral da urgência da diversificação de fontes, para a redução da dependência do País à geração hídrica.

 

Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), a energia eólica representa cerca de 11% da matriz elétrica brasileira. Essa participação pode chegar a cerca de 14% em três anos. Já a energia solar responde por mais de 2% da matriz elétrica. Seu crescimento tem sido rápido. Só em 2020, a capacidade instalada em energia solar fotovoltaica cresceu 66% no País.

 

Caminha-se para um mundo melhor, do ponto de vista da geração de energia. Mas o ritmo de crescimento da participação de fontes limpas na matriz energética ainda é insuficiente para que o mundo alcance a neutralidade de carbono por volta de 2050, adverte a AIE.

 

Criada em 1974, logo depois da primeira crise do petróleo, pelos principais países consumidores para discutir formas de reduzir a dependência mundial ao fornecimento de um grupo limitado de produtores, a Agência se transformou ao longo do tempo. A segurança energética mundial continua sendo seu foco, mas a AIE, da qual fazem parte 30 países, é hoje um centro de debate mundial sobre energia, buscando a variedade de fontes, ampliação do acesso, maior eficiência, proteção ambiental e atenção às mudanças climáticas. Suas análises e suas estatísticas balizam discussões sobre esses temas para muito além dos países que a integram.

 

No momento, a geração de energia renovável enfrenta o problema de alta de preços de componentes e materiais. Se o nível atual se mantiver ao longo de 2022, o custo dos investimentos voltaria ao nível de cinco ou seis anos atrás, eliminando os ganhos conquistados no período. A alta dos combustíveis fósseis, no entanto, pode manter a competitividade das fontes renováveis. No médio prazo, essa competitividade deve se manter. (O Estado de S. Paulo)