Leilão do 5G tem ágio de 250% e deve elevar concorrência no setor

O Estado de S. Paulo

 

As principais operadoras de telecomunicações do Brasil – Claro, Vivo e TIM – arremataram os blocos mais nobres e o leilão do 5G se tornou o segundo maior da história do País, atrás apenas do pré-sal. O governo arrecadou R$ 7,1 bilhões, um ágio médio de quase 250% sobre o lance mínimo das faixas ofertadas.

 

Empresas que atuam em mercados regionais arremataram blocos. O ministro Fábio Faria (Comunicações) disse que o agronegócio deve ser o primeiro setor beneficiado.

 

No maior leilão da história do País desde a licitação do présal, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) conseguiu vender ontem praticamente todos os lotes de frequências ofertadas do 5G.

 

No primeiro dia da licitação, o governo arrecadou R$ 7,1 bilhões, um ágio médio (valor adicional ao mínimo que era exigido no edital) de quase 250%, segundo levantamento da Conexis, associação que representa as maiores operadoras do País. Incluindo os investimentos que as empresas terão de fazer, o leilão já movimentou R$ 43,7 bilhões.

 

As principais operadoras arremataram os blocos mais nobres, mas quatro empresas conseguiram entrar no mercado de telecomunicações e devem ampliar a concorrência no setor. O leilão continua hoje, com a faixa de 26 GHz, por meio da qual funcionalidades para redes empresariais em setores como indústria, mineração e logística.

 

Com lances agressivos ao longo da disputa e a intenção de liderar o mercado de telefonia celular, a Claro comprou o principal lote da faixa de 3,5 GHz por R$ 338 milhões, ágio de 5%. Vivo e TIM arremataram os demais lotes de alcance nacional. A Vivo pagou R$ 420 milhões, ágio de 31% sobre o preço mínimo, e a TIM, de 9%. Havia expectativa de que a Highline, que comprou parte da Oi, ficaria com o quarto lote nacional, mas nem ela nem outra empresa apresentou propostas – foi o único lote que ficou vazio.

 

Consumidor final

 

A faixa de 3,5 GHZ é exclusiva para o 5G, com capacidade de transmissão de altíssima velocidade. É a mais usada no mundo inteiro para o 5G, com foco no varejo – consumidores finais – e na indústria, e considerada ideal para atender áreas urbanas. Claro, Vivo e TIM arremataram ainda lotes nacionais adicionais e terão 100 MHz para ofertar aos consumidores – quanto maior o espectro, maior a qualidade do serviço prestado. As operadoras também compraram lotes regionais na faixa de 2,3 GHz, por meio da qual poderão ofertar 4G e 5G.

 

Contrapartidas

 

Além do pagamento da outorga, as empresas deverão cumprir contrapartidas de investimento para ampliar a conectividade em áreas isoladas do Norte e em escolas. Elas também terão de construir uma rede de comunicações exclusiva para o governo.

 

O primeiro lote ofertado no leilão era remanescente de uma licitação de 2014, quando a Oi, já em dificuldades financeiras, não participou da disputa. Empresa criada pela gestora de recursos Pátria Investimentos há um ano, a Winity ofereceu R$ 1,427 bilhão, ágio de 805,84%. Por meio da frequência de 700 MHz, a empresa poderá ofertar 4G em todo o País e terá o desafio de implantar a cobertura em 31 mil km de rodovias federais.

 

O ministro das Comunicações, Fábio Faria, diz que o leilão do 5G permitirá ao Brasil se preparar para se tornar um “hub de inovação” na América Latina. Em entrevista ao Estadão, o ministro afirma que a tecnologia vai impactar gradualmente o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) a partir do ano que vem. O primeiro setor atingido, segundo ele, será o agronegócio.

 

De seu gabinete no Palácio do Planalto, o ministro, deputado licenciado pelo PSD do Rio Grande do Norte, alerta que o governo possui alternativas para pagar os R$ 400 de Auxílio Brasil planejados por Bolsonaro, como abrir crédito extraordinário ou editar um decreto de calamidade, caso a PEC dos precatórios seja derrotada.

 

O leilão do 5G demorou bastante a ser realizado. Que prejuízos o Brasil pode ter com isso?

 

Muitos países já têm a tecnologia, mas o Brasil será o primeiro da América Latina. Isso nos dá uma dianteira importante. Fizemos em tempo recorde, em 15 meses colocamos o leilão em pé.

 

O 5G vai se refletir em custos maiores para os consumidores ou essa ampliação da disputa no mercado vai compensar?

 

Não houve aumento de tarifas em nenhum país por causa do 5G. Há uma economia, o consumo é menor, a antena é menor, a implementação é mais barata, e as teles ganham muito dinheiro. O valor, para o cliente normal, não vai ter aumento.

 

“Com 5G vamos ver muito nas ruas carro sem motorista, ônibus escolar autônomo, conserto de um trator no meio da lavoura, com óculos de realidade aumentada. Um país analógico fica totalmente para trás.”

 

Que crescimento econômico podemos esperar?

 

Temos que parar para pensar, a partir do próximo ano, para rever o nosso PIB. O agronegócio a gente estima que cresça pelo menos 10% com o 5G. Se crescer, a gente vai colocar 2,6% do PIB, só no agro.

 

Que tipo de modelo de negócios podemos ter para telemedicina, carros autônomos, agro e indústria 4.0?

 

O aumento de velocidade já falamos em até 100 vezes. A grande diferença é a latência, o tempo de resposta. O 4G não permite telemedicina, veículos autônomos, drones autônomos, nada que precise de precisão no tempo de resposta. Com o 5G vamos ver muito nas ruas carro sem motorista, ônibus escolar autônomo, conserto de um trator no meio da lavoura, com óculos de realidade aumentada. Um país analógico fica para trás. O Brasil tem tudo para ser um hub de inovação.

 

O 5G é um salto tecnológico comparável a quê?

 

A chegada da internet foi um marco grande, mas era muito lento e pouca gente tinha acesso, computador enorme, caro… A chegada do celular foi muito marcante, e a chegada do 5G vai ser quase igual a isso. Tive apoio do governo. Tive apoio do ministro Paulo Guedes, que poderia pleitear um leilão arrecadatório. Se fosse arrecadatório, resolveria o problema do financiamento do Auxílio Brasil. Ainda bem que separamos isso lá atrás.

 

Separou, mas não solucionou. O governo dependeu de quatro votos da oposição para aprovar a PEC dos precatórios.

 

A discussão é a forma. A decisão de dar R$ 400 de auxílio está tomada. Se não for via PEC, vai ser via crédito extraordinário ou vai ser, como o próprio (ex-presidente Michel) Temer sugeriu, a calamidade. Tem 20 milhões de pessoas passando fome. Aí o Lula posta que, se fosse ele, faria em R$ 600. É uma discussão mais política, mas, se não for via a PEC dos precatórios, vai ser via crédito extraordinário. (O Estado de S. Paulo/Anne Warth, Amanda Pupo e Circe Bonatelli)