Jornal do Carro
Desde o início da pandemia, os preços dos carros novos, seminovos e usados dispararam no Brasil. Os constantes reajustes dos modelos 0-km, que recentemente fizeram o popular Volkswagen Gol chegar a R$ 86 mil em sua versão automática mais completa, acabaram por inflar também os preços dos seminovos e usados, que estão mais caros na Tabela Fipe. Mas a cereja do bolo ainda está por vir. Trata-se do IPVA 2022, que, daqui a poucos meses, chegará aos proprietários de veículos.
O cenário que se desenha é de alta na tarifa. Com a persistente falta de semicondutores, algumas montadoras estão sem produzir carros em agosto. No caso da General Motors, a escassez do componente culminou a falta de unidades em estoque dos modelos Onix e Onix Plus, dupla que, até março deste ano, era líder de mercado. Some-se a isso a disparada do dólar norte-americano. Assim, tudo aponta que um IPVA mais “salgado”.
Base de cálculo maior
O tributo é calculado com base nos preços de veículos praticados pelo varejo e medidos pela Tabela Fipe. A alta, em números, ainda não tem divulgação pela Secretaria da Fazenda (Sefaz). Afinal, os estudos saem apenas em novembro. As alíquotas são fixas, mas, com o aumento do valor de mercado, base de cálculo subirá.
Os donos de carros movidos a gasolina ou flexíveis, por exemplo, pagam 4% do valor de mercado em São Paulo. Já quem tem carro a álcool, elétrico ou a gás comprados antes de 15 de janeiro de 2021, paga 3% – a partir dessa data, a taxa também corresponde a 4%. Por causa disso, o governo também não consegue prever quanto vai arrecadar com o IPVA no ano que vem.
Ao Jornal do Carro, a Sefaz informa que ainda não possui os valores venais dos veículos que servirão de base de cálculo para o lançamento do IPVA 2022. “A tabela (de valores venais) deverá ser finalizada em novembro e publicada em dezembro de 2021”, diz a nota oficial. Ou seja, o calendário e as estimativas de arrecadação do imposto estão em elaboração.
O carro valorizou
Segundo a avaliação do consultor automotivo Paulo Garbossa, “o consumidor vai pagar mais porque, hoje, o carro dele vale mais que no passado”. “A gente está acostumado com a desvalorização de, ao menos, 15% do valor do carro assim que cruzamos a porta da concessionária. Contudo, recentemente, o patrimônio valorizou”, pontua Garbossa.
Garbossa conta que o mercado está seguindo, mais que nunca, a lei da oferta e da procura. Nesse sentido, “se antes os estoques das fabricantes eram para 45 dias, hoje, esse número caiu para 10 (dias)”, exemplifica. Ainda assim, ele afirma que é hora de esperar, afinal, não é possível precisar o tamanho dessa alta no mercado. “Só uma coisa é certa, não vai baixar! Isso não existe na indústria (automobilística). Pode haver promoções, mas queda de preços, impossível”, diz.
Outras vertentes do problema
Desde o início da pandemia, os preços dos carros novos dispararam no Brasil. Para completar, a falta de semicondutores forçou várias montadoras a pararem a produção de veículos. Consequentemente, os valores de modelos 0-km nas alturas – e a falta de tantos outros a pronta-entrega – fez aumentar a procura por usados e seminovos que, por sua vez, também subiram. E, nesse sentido, já refletem na média da tabela da Fipe.
Dessa maneira, as altas nos preços dos 0-km causaram reviravolta no mercado. Tem até seminovo mais caro que novo. Recentemente, o Jornal do Carro fez um levantamento exclusivo com base na Tabela Fipe que mostra o quanto alguns dos modelos mais vendidos encareceram desde o começo do ano. O Jeep Compass (anterior ao facelift), por exemplo, registrou alta de até R$ 20 mil entre janeiro e julho deste ano. E isso, evidentemente, deve encarecer o IPVA do modelo em 2022.
O Renault Kwid é outro exemplo. Tem unidades no mercado de seminovos por até R$ 1.000 a mais que os R$ 46.390 pedidos pela marca na versão de entrada do 0-km. No caso da GM, os modelos Onix e Onix Plus começaram a faltar. Por isso, a dupla sequer entrou no ranking dos dez mais vendidos. E algumas unidades seminovas estão à venda com preço de 0-km.
Sem serviços, população consome bens
Essa “inflação dos automóveis” é uma junção de fatores. Dentre eles, o economista Igor Mundstock, CEO da Mundstock Educacional, empresa que atua no setor educativo ensinando sobre economia e investimentos, destaca a ampla demanda durante a pandemia.
“Nos primeiros meses, as pessoas ficaram impedidas de consumir serviços. O setor global de turismo e transporte, por exemplo, sofreu forte impacto. Para se ter ideia, 70% do PIB do Brasil depende do setor de serviços. Então, enquanto as pessoas não podiam consumi-los, acabaram influenciadas a adquirir bens, como automóveis”, explica.
Para ele – além da necessidade de locomoção por transporte individual -, esse é o principal motivo pelo qual foi registrado aumento da demanda por carros durante a pandemia.
“As políticas monetárias foram tão expansionistas (realizadas pelos bancos centrais brasileiro, europeu e norte-americano), de juros tão baixos, e com inundação de recursos no sistema financeiro global, que as pessoas e as empresas (que dispunham de capital) voltaram a consumir num grau muito maior do que no período pré-pandemia”, pondera o economista.
Processo inflacionário
Igor Mundstock também aponta que, especificamente no setor de automóveis, houve efeito de alta na demanda e queda na oferta, o que gerou um processo inflacionário muito grande.
A disparada do dólar norte-americano consiste noutro ingrediente culpado por salgar o tempero do IPVA 2022. Afinal, muitas peças e carros vendidos no Brasil vêm de fora. Isso, em síntese, encarece bens e serviços, e acaba por influenciar a alta de preços dos veículos. (Jornal do Carro/Vagner Aquino)