O Estado de S. Paulo
Aumenta entre os especialistas a aposta no hidrogênio verde como combustível do futuro. Pelo seu alto potencial na redução das emissões, será, para eles, a solução para uma economia ambientalmente limpa, especialmente em setores de descarbonização difícil, como a siderurgia, a indústria química e a mineração.
Parece opção paradoxal e um tanto quanto hermafrodita, digamos assim. A produção de hidrogênio se faz pela quebra da molécula da água por eletrólise. Ou seja, é preciso muita energia elétrica para produzir um combustível capaz de produzir energia elétrica. Como esse processo pode ser economicamente viável? A solução, outro aparente paradoxo, está num dos problemas apresentados pela energia limpa. Tanto a energia eólica como a de fonte solar são intermitentes e, em grande escala, impossíveis de serem armazenadas. A produção de energia nesses sistemas depende ou de ventos ou de sol. E, se produzida acima do consumo imediato, não pode ser armazenada, ao contrário da energia produzida por hidrelétricas: basta reduzir o volume na queda d’água para que o potencial se acumule na barragem.
A proposta consiste em usar a energia renovável excedente, inclusive a hidrelétrica ou a obtida por biomassa, no processo de eletrólise que, por sua vez, vai produzir hidrogênio, este sim, combustível que pode ser armazenado.
Carlos Martinez, professor do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, explica que a tecnologia, ainda em desenvolvimento, tem ganhado destaque por desempenhar papel de vetor energético flexível na transição energética: “Possui diversas aplicações que devem beneficiar vários segmentos da atividade econômica, desde a mobilidade até o desenvolvimento de dispositivos tecnológicos que podem usar o hidrogênio como combustível, aumentar a eficiência de sistemas de aquecimento e resfriamento e ser usado nas plantas de tratamento de água”.
Pelas condições favoráveis para a produção de energia renovável, o Brasil pode tornar-se grande player na produção e na exportação de hidrogênio verde. Em fevereiro, o governo do Ceará, em parceria com o Complexo do Pecém, lançou o projeto Hub de Hidrogênio Verde, que pretende incentivar a criação de um agrupamento de indústrias responsáveis por toda cadeia de valor do produto. O projeto já oficializou parcerias com a White Martins e a australiana Enegix. O plano é iniciar o projeto-piloto em dois anos e as plantas de maior escala, até 2025.
Otimismo à parte, o hidrogênio verde ainda enfrenta gargalos que podem comprometer o seu desenvolvimento. Um deles, como aponta Pedro Rodrigues, sócio do Centro Brasileiro de Infraestrutura, é sua ainda baixa viabilidade econômica em grandes escalas. E enfrenta o risco de que avanços nas baterias resolvam melhor o problema da intermitência da energia renovável e jogue a tecnologia do hidrogênio verde para escanteio.
Outro problema ainda sem solução é como levá-lo aos centros de consumo. Rodrigues lembra que o hidrogênio é de difícil compressão para poder ser transportado. Além disso, não pode ser transportado nem armazenado em temperatura ambiente sem ser mesclado com outro átomo, como o de nitrogênio, que resulta na amônia. (O Estado de S. Paulo/Celso Ming)