Empresas dobram produção própria de energia e apostam em fontes renováveis

O Estado de S. Paulo

 

Enquanto o País vive a maior crise elétrica desde 2001, empresas dobraram produção própria de energia e voltaram as apostas para usinas eólicas e solares, motivadas por baixo custo e apelo ambiental. As duas fontes deverão responder por 17% da matriz elétrica em 2025, segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico.

 

O volume de energia gerada por grandes empresas para consumo próprio dobrou desde 2009 e deve dar novo salto com a pressão da sociedade em torno de uma agenda mais sustentável. Dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) mostram que a capacidade instalada dos chamados autoprodutores cresceu de 12.834 megawatts (MW), em 2009, para 25.314 MW em 2020.

 

Nesse primeiro momento, a escalada se deveu ao avanço de térmicas, sobretudo as movidas por biomassa. Só o potencial de geração do setor de açúcar e álcool cresceu 181%, segundo a EPE. Daqui para frente, no entanto, o avanço da autoprodução deve ser pautado pela aposta de empresas como Vale, Braskem, Votorantim e Hydro em projetos eólicos e solares.

 

Segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), nos próximos anos as duas fontes vão aumentar sua participação na matriz elétrica e reduzir a dependência do País das hidrelétricas. O Brasil vive hoje a maior crise elétrica desde 2001, com risco de novo racionamento por causa da baixa dos reservatórios. Pelos cálculos do ONS, em 2025 quase 17% da matriz será de eólica e solar.

 

“O futuro é renovável, competitivo e sem subsídio”, diz a presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Elbia Gannoum. Segundo ela, fontes de energia sustentável podem ser um motor para a retomada econômica no pós-pandemia. “Há um enorme potencial a ser explorado Brasil afora.”

 

Por trás desse movimento está a falta de projetos hídricos – que hoje enfrentam inúmeras barreiras por causa dos impactos ambientais –, e a maior competitividade da energia renovável, durante anos chamada de alternativa.

 

Atualmente, eólica e solar têm preço médio abaixo de R$ 100 o MWH. Nos leilões de 2019, o preço médio da energia hídrica ficou acima de R$ 158 o MWH; da biomassa, R$ 187; e da térmica a gás natural, R$ 188. Mas o aumento das fontes intermitentes – que dependem das condições do tempo – exigirá maior preparo do ONS no planejamento do sistema.

 

Para planejar um sistema com mais energia intermitente, o ONS afirma ser necessário “aprimorar a capacidade de previsão da geração dessas fontes, uma vez que as variações são características da eólica e solar”.

 

Outro fator que tem influenciado a decisão das companhias em seguir esse caminho é a agenda das melhores práticas ambientais, sociais e de governança corporativa (ESG, na sigla em inglês). Várias empresas criaram metas de carbono zero antes do prazo estabelecido pelo Acordo de Paris, e os projetos renováveis se mostram a forma mais rápida para alcançar os índices.

 

Investimentos

 

Os novos projetos das empresas integrantes da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape) são exemplos dessa transformação. Segundo o presidente da entidade, Mario Menel, há cerca de R$ 24 bilhões em investimentos programados para os próximos anos. Todos de empreendimentos eólico, solar e de biomassa – e nenhum hídrico até o momento.

 

Esses projetos deverão acrescentar mais de 5 mil MW (apenas de autoprodução). “Essa é a tendência a partir de agora porque, além de competitiva, é mais fácil de licenciar”, diz Menel.

 

Com a demanda em alta, a Weg, fabricante de turbinas eólicas e demais itens do sistema de geração de energia pelo vento, está com a produção tomada até o fim de 2022. “Já fechamos contratos e não temos condições de atender mais nada antes do fim do próximo ano”, informa João Paulo da Silva, diretor de Energia da empresa. Pelos contratos, a Weg se encarrega também de operar e fazer a manutenção dos equipamentos por 10 a 20 anos.

 

A empresa também é a maior distribuidora de sistemas de energia solar no Brasil para geração distribuída – até 5 MW, suficientes para abastecer, por exemplo, comércios, postos de combustíveis e residências.

 

“O interesse está crescendo, não só pela economia na conta de luz, mas também pela segurança de abastecimento diante da possibilidade de falta de energia elétrica”, diz Silva. De acordo com ele, hoje as energias eólica e solar custam, por Mw/hora, cerca de 40% menos que a hídrica e metade do valor daquela gerada por térmicas a gás. (O Estado de S. Paulo/Renée Pereira e Cleide Silva)