Mesmo sem isenções, modelos começam a atrair PCDs

O Estado de S. Paulo/Caderno Mobilidade

 

O público PCD (pessoas com deficiência) tem isenção de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para automóveis 0-km com preço máximo de R$ 70 mil. No entanto, o Senado deve votar, até o fim de junho, a Medida Provisória 1034/2021, que prevê o aumento desse limite para R$ 140 mil. Os veículos eletrificados no País custam muito mais que o teto vigente, mas algumas ações começam a se desenhar para beneficiar esse consumidor.

 

A Volvo foi a primeira marca a criar um programa destinado, também, às pessoas com deficiência, chamado de Volvo Lovers. A empresa cedeu, gratuitamente, seus carros para os interessados os avaliarem por quatro dias.

 

Em parceria com a Cavenaghi, empresa especializada em adaptações veiculares, a montadora preparou três modelos para que o consumidor PCD pudesse conhecer as vantagens das motorizações híbrida e 100% elétrica. Até abril, 14 motoristas portadores de alguma deficiência dirigiram os carros.

 

“Devemos promover oportunidades de acesso”, acredita João Oliveira, diretor-geral de operações e inovação da Volvo Brasil e também um dos embaixadores da Mobilidade do Estadão. “Por isso, adotamos a venda com alguma isenção a pessoas com deficiência e firmamos a parceria com a Cavenaghi para que os automóveis sejam adaptados, de acordo com as características individuais dos clientes.”

 

Questões técnicas 

 

Oliveira conta que o maior cuidado da Volvo é com a possibilidade de adaptação dos veículos e com a acessibilidade das instalações da marca. “Todos os clientes devem ter a mesma experiência com a marca nessa iniciativa de responsabilidade social”, afirma.

 

Atualmente, não existe demanda de nenhuma instituição ou organização com as autoridades de trânsito brasileiras no sentido de baratear um pouco o carro eletrificado às pessoas com deficiência. Mesmo assim, João Oliveira aposta que esse tipo de automóvel seria muito funcional para o público PCD. “São veículos versáteis que podem rodar grandes distâncias sem a necessidade de abastecimento de combustível. É possível recarregar a bateria em casa, no trabalho ou nos eletropostos espalhados em vários locais públicos”, completa.

 

Monica Cavenaghi, diretora comercial e de marketing da Cavenaghi, engrossa o coro: “É preciso entender que as pessoas com deficiência fazem parte da sociedade e uma parcela considerável tem alto poder aquisitivo”. No Volvo Lovers, a Cavenaghi adaptou o pedal de acelerador e o freio manual para atender os usuários PCDS.

 

Para Monica, uma das limitações do veículo elétrico ao consumidor com deficiência é a pouca capilaridade de postos de recarga no País. “O público PCD preocupa-se com a mobilidade reduzida. Se o combustível acaba, ele abre a porta e pede socorro. Mas imagine ficar sem carga na bateria em um local mais inacessível, como em cima de uma ponte”, ressalta. “Os eletropostos precisam se disseminar com maior rapidez.”

 

Embora o mercado de adaptações de carros elétricos ainda seja incipiente, Monica vislumbra os cuidados com questões técnicas que as empresas deverão ter no futuro. “O automóvel que transporta um portador de deficiência – e não o motorista – precisa ter o assoalho cortado para ganhar a altura necessária para acomodar a pessoa. No veículo elétrico, a bateria se aloja justamente no assoalho. Então, o desafio é como deslocar a bateria sem comprometer o desempenho e a originalidade do carro”, explica.

 

Mudança de paradigma 

 

Quem não está preocupado com as transformações dos carros é o enfermeiro Paulo Cândido de Souza, que usa uma prótese na perna esquerda desde 2010. Em 2019, ele comprou o utilitário esportivo JAC IEV40, modelo totalmente elétrico, e teve de se adaptar com a ameaça de ficar sem bateria na estrada, risco apontado por Monica.

 

Ele mora em Pires do Rio (GO) e, duas vezes por semana, viaja a Brasília para os plantões no Hospital Universitário, um percurso de 270 quilômetros. “Antes, eu tinha um Toyota Corolla e andava a 110 km/h tranquilamente, sem me preocupar com o combustível”, lembra. “Agora, a autonomia do IEV40 é de 300 quilômetros desde que eu dirija, no máximo, a 70 km/h”.

 

Em Brasília, Souza recarrega a bateria do carro em um supermercado próximo ao hospital, durante o expediente. Mas não deixar o ponteiro do velocímetro passar dos 70 km/h foi uma mudança de paradigma na sua vida de motorista. “É preciso planejar a viagem, que levava duas horas e meia. Hoje, demora quase quatro horas”, salienta.

 

O que motivou a compra do carro elétrico foi o modo de vida sustentável que o enfermeiro resolveu abraçar. Ele já tem, em sua casa, sistema de captação de água de chuva e painéis fotovoltaicos para o armazenamento de energia solar. “A questão ecológica é importante. Além disso, o carro elétrico é mais econômico”, garante. “Com o Corolla, eu gastava cerca de R$ 2 mil, por mês, de combustível. A economia feita em seis, sete anos pagará o que desembolsei na aquisição do IEV40.”

 

No entender de Souza, os veículos elétricos para o público PCD ainda são inviáveis devido aos preços, uma vez que os modelos não estão em programas de isenção de impostos. No entanto, ele vê potencial para atender as pessoas com deficiência.

 

“Futuramente, as baterias serão mais baratas, as recargas vão demorar menos tempo e a autonomia crescerá, ampliando o volume de vendas ao consumidor PCD”, acredita. “Dessa forma, os veículos poderiam ganhar incentivos de políticas governamentais por causa de seus benefícios imediatos ao meio ambiente”. (O Estado de S. Paulo/Caderno Mobilidade/Mário Sérgio Venditti)