O Estado de S. Paulo
A falta de semicondutores em todo o mundo pressiona as empresas brasileiras que montam as placas eletrônicas usadas hoje por praticamente qualquer equipamento eletrônico. Elas relatam aumento de preços que se aproximam de 280% e atraso de até seis meses na entrega das matérias-primas.
Na Standard America, que tem fábrica em Campinas e produz placas utilizadas pelas indústrias automotiva, agrícola, aeronáutica e médica, as linhas de produção tiveram de ser desligadas e religadas diversas vezes entre janeiro e março. “Teve semana que ficavam paradas um dia, em outra, quatro dias, sempre à espera de componente”, diz o presidente da empresa, Hidalgo Dal Colletto. “Agora, também estamos tendo muito desafio de compra. O mercado está de ponta cabeça.”
Segundo Dal Colletto, semicondutores que antes da pandemia custavam R$ 1,80 agora são vendidos a R$ 6,80, uma alta de 278%. Na média, porém, os reajustes ficam em 30%. O empresário afirma estar repassando esse aumento aos clientes.
Para o consultor Marcio Kanamaru, da KMPG no Brasil, esse incremento no preço dos componentes deve chegar à população também, mas de forma mais moderada. “Há uma expectativa de aumento de até 25% nos semicondutores neste semestre. Isso vai elevar a pressão sobre os fabricantes de celulares, que já têm buscado inúmeras eficiências operacionais para não repassar os aumentos aos clientes. Mas eles terão de repassar pelo menos uma parte, chegando a uma estimativa de aumento em até uns 15% nos celulares e eletrônicos.”
Além de mais caros, os componentes também demoram mais para chegar. Segundo Dal Colletto, os atrasos começaram há dez meses e, agora, o que era entregue por distribuidores em dois dias precisa de 180 dias. Quanto mais específico for o chip, maior o prazo de entrega.
Dal Colletto conta que os fornecedores não dão prazo para regularização, mas ele trabalha com a hipótese de começar a ver uma normalização apenas no início de 2023.
Com fábrica em Manaus e produção voltada sobretudo para as operadoras de telecomunicação, a Flex Industries passou a encomendar peças com um ano de antecedência – antes eram precisos seis meses. “Tem fornecedor que garante o abastecimento e, na data de entrega, diz que não vai cumprir com o prazo”, diz o diretor comercial da empresa, Decio Libertini.
Na Flex, linhas de produção também foram interrompidas por alguns dias entre novembro e janeiro devido à falta de semicondutores e hoje a empresa paga, em média, 20% a mais pelas peças. “O prejuízo é de milhões”, acrescenta Libertini.
Crise geral
O presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Humberto Barbato, destaca que todos os segmentos do setor estão sofrendo. As empresas mais afetadas são as que cancelaram encomendas no início da pandemia, imaginando que a demanda demoraria para retornar, como as montadoras. “Essas foram para o fim da fila. Informática e telecomunicações também estão sofrendo, mas menos, porque a demanda foi menor no ano passado.”
O executivo diz não ser possível precisar quando haverá uma normalização. “Deveremos ter esse problema, mas em uma situação menos grave, por dois anos, pelo menos. É uma indústria que exige investimento alto e poucos detêm a tecnologia.”
Apesar de a maior parte dos especialistas prever que o problema é de longo prazo, as montadoras de carros esperam não enfrentar mais paralisações por causa da falta de semicondutores a partir de 2022.
“O componente é sofisticado e tem casos de ter 600 semicondutores em um determinado automóvel. É possível acontecer (novas paralisações) no segundo semestre, mas a gente espera ter um sistema mais estabilizado até o fim do ano”, disse o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Luiz Carlos Moraes, no início do mês.
Desde o começo do ano, fábricas da Fiat, da GM, da Honda e da Volkswagen pararam linhas de montagem por não ter os disputados componentes. Toyota, Volvo, Renault e Mercedes-Benz tiveram paradas pontuais e redução ou atraso de produção. (O Estado de S. Paulo/Luciana Dyniewicz)