Mercado interno salva vendas das siderúrgicas no Brasil

O Tempo

 

As vendas internas de aço de 19,2 milhões de toneladas em 2020 apresentaram alta de 2,4% na comparação com 2019, confirmando – de acordo com dados do Instituto Aço Brasil – a recuperação do mercado interno a partir do segundo semestre. Por outro lado, as exportações, de 10,7 milhões de toneladas, ficaram 16,1% abaixo do total das vendas externas realizadas em 2019.

 

A musculatura do mercado interno é confirmada pelas empresas. A Usiminas informa que, desde o fim do ano passado, observa uma sólida retomada da economia do país registrando produção e vendas em patamares superiores aos do período pré-pandemia. “Nos últimos meses de outubro e novembro, observam-se uma retomada da economia brasileira e a participação do mercado interno nas vendas atingindo 97%”, disse.

 

Sobre os efeitos do câmbio na vida da Usiminas, a companhia conta que ele impacta os preços dos insumos dolarizados como minério de ferro, carvão e placas, básicos para a produção siderúrgica.

 

A Usiminas é uma das principais fornecedoras do mercado automotivo e tem atuação em diversos outros segmentos como os de maquinário agrícola, energias renováveis, construção civil e linha branca. Por isso, a Usiminas lamenta o encerramento das operações da Ford, que tinha uma parceria com a empresa. “Ainda assim, a Usiminas está confiante na recuperação do setor neste ano e seguirá como importante fornecedor da indústria automotiva nessa retomada”, comenta a companhia.

 

Outra gigante do aço que, em Minas Gerais, tem unidades de aços longos em João Monlevade, Juiz de Fora e Sabará, a ArcelorMittal afirma que está operando em plena capacidade e em processo de ajuste dos estoques, respondendo ao que considera surpreendente recuperação da demanda do mercado interno, que vem ocorrendo desde o início do segundo semestre de 2020.

 

A ArcelorMittal diz que o crescimento da demanda se dá em todos os segmentos nos quais a empresa atua, principalmente nas indústrias da construção civil, automotiva, de linha branca, máquinas e implementos agrícolas e rodoviários, os quais a produtora tem priorizado atender, inclusive por meio de seus canais de distribuição. Com relação à compra de insumos, além do câmbio, a empresa vê, principalmente, o aumento, em dólar, do preço de matérias-primas pressionadas pela alta na demanda mundial.

 

Confiante no crescimento da indústria e nos investimentos em infraestrutura nos próximos anos no Brasil, a ArcelorMittal também entende que o mercado rapidamente se adequará diante da recente mudança na dinâmica do segmento automotivo com a saída da Ford. A expectativa, de acordo com a companhia, é que não haja em longo prazo redução de demanda no consumo de aço.

 

Ex-ministro do Trabalho e do Planejamento, o professor associado da Fundação Dom Cabral Paulo Paiva avalia que, no segundo semestre de 2020, a economia brasileira voltou a crescer, sendo que, no terceiro trimestre, a alta foi de mais de 7%, e isso impulsionou o setor. “A construção civil foi o principal fator que demandou os produtos (de aço)”. Neste ano, a questão é se a economia vai responder à trajetória da pandemia: “O desempenho vai depender muito do primeiro semestre. Se tiver um programa de vacinação mais rápido, mais rapidamente a economia voltará a crescer”.

 

Análise

 

O professor Paulo Vicente, da Fundação Dom Cabral, diz que 2021 tem tudo para ser melhor que 2020. “Em 2021, haverá mais venda interna e mais venda externa. Isso é bom para os setores diversos da economia, porém com um câmbio menor”, observa.

 

Ele afirma que há três riscos expostos: o primeiro deles está na vacina, na velocidade com que ela vai se distribuir no mundo inteiro. O segundo risco é o conflito entre Estados Unidos e China, se ele vai continuar e quão intenso será. E o terceiro é se a injeção de dinheiro do Banco Central americano não vai superaquecer a economia mundial e gerar inflação em 2022. “O mercado internacional vai puxar o Brasil. Cenário é cenário, pode acontecer de tudo”, diz.

 

Quanto ao respingo de demanda nas siderúrgicas, o professor da Fundação Dom Cabral avalia que o efeito “Ford” não tem reflexo tão significativo. “Em vez de vender aço para fora, vende aço para as outras montadoras”, diz. “Mercado de carro é crescente, e vai ser melhor que 2020 e pior que 2019 no país”, acrescenta. O professor aposta em 50% de chance de o país registrar crescimento de 2% a 3% neste ano; 30% de crescer mais de 3%; e uns 20% de crescer menos que 2%. (O Tempo/Helenice Laguardia)