O Estado de S. Paulo
A fusão com a Fiat Chrysler Automobiles (FCA), que coloca a força de venda da Fiat, principalmente, como uma grande aliada, pode representar um marco de renascimento das marcas Peugeot e Citroën no Brasil. Com carros produzidos no País desde 2001, a dupla francesa tinha, uma década depois, mais de 5% do mercado nacional de veículos de passeio e utilitários leves, mas esta participação veio definhando até chegar a apenas 1,3% no ano passado.
A união no Brasil é entre desiguais: as marcas da FCA vendem 17 vezes mais do que as marcas que, agora com a fusão, são “irmãs”. Do total de 460 mil carros vendidos no Brasil em 2020, a FCA respondeu por 434 mil, contra 26 mil da Peugeot S.A. (PSA).
A diferença abissal – que não se repete nos mercados internacionais, onde há maior equilíbrio entre as marcas – joga, porém, a favor da PSA. A fusão na recém-criada Stellantis abriu a perspectiva para que tanto a Peugeot quanto a Citroën usufruam da capilaridade da rede de distribuição da FCA, com suas 640 concessionárias no País, o triplo da PSA (196).
Em entrevista ao Estadão/Broadcast, Carlos Tavares, CEO da Stellantis, deixou claro que haverá na nova organização uma rede de colaboração na qual uma marca dá apoio a outra.
A possibilidade de venda de carros da Peugeot e da Citroën pelas concessionárias da Fiat nutre, contudo, a principal discórdia das revendas das marcas francesas em relação à união dos grupos, a ponto de associações que as representam pedirem, até agora sem sucesso, a suspensão temporária da fusão no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
A acusação das associações é de que, antes mesmo de a fusão ser concretizada, a PSA vinha consultando revendedores da Fiat sobre dividir suas lojas com as novas marcas.
A estratégia parece fazer sentido pela perspectiva das marcas, que precisam aumentar vendas para reduzir a ociosidade das linhas de produção. Há, porém, um obstáculo legal. A venda de automóveis por lojas autorizadas é uma concessão regulada por lei.
A chamada Lei Ferrari, de 1979, estabelece que os contratos entre fabricante e revenda podem impedir a venda de automóveis de uma marca diferente daquela que a credenciou. Este seria, de acordo com as associações, o ponto da lei infringido pela PSA.
Diferenças
No Brasil, o quebra-cabeça da fusão tem na FCA uma peça maior, com seus grandes complexos industriais em Betim (MG), aberto em 1976, e Goiana (PE), além da unidade de produção de motores em Campo Largo (PR). A PSA conta com uma única fábrica, em Porto Real (RJ).
No País, a pandemia teve maior impacto na PSA. As vendas das marcas francesas caíram 45% em 2020, enquanto as da FCA tiveram retração bem menor, de 13%. O mercado brasileiro, como um todo, amargou baixa de 26,6% no período.
O baque da covid-19 chegou num momento em que, nas matrizes das grandes montadoras, uma série de mudanças estruturais as obriga a remanejar suas estruturas. A corrida pelo carro elétrico, que se tornou uma obrigação com as restrições de governos de países desenvolvidos aos motores à combustão interna, é uma delas. O fim do automóvel como objeto de desejo para as novas gerações é outra.
Uma pesquisa feita pela KPMG em 2019 mostrou que 90% dos consumidores brasileiros gostariam de ter automóveis elétricos disponíveis no País, embora apenas 19% dos executivos de montadoras mostrassem plena convicção de sua viabilidade. Em outro ponto, 40% dos consumidores mostraram interesse em serviços de assinatura de veículos – uma opção à compra do automóvel que não estava no radar das montadoras até pouco tempo atrás.
Essas mudanças induziram alianças, como a firmada entre a Renault-Nissan e a Mitsubishi, e fusões, como a que criou a Stellantis. “A fusão da FCA com a PSA é um modelo. E, no lado da FCA, não é a primeira nem a segunda tentativa”, diz Ricardo Bacellar, líder do setor automotivo da KPMG no Brasil. “A indústria passou a responder por investimentos cada vez mais agressivos, e não tem caixa para isso. Então, as montadoras começaram a juntar forças para juntar orçamentos.”
União
Considerado hoje como um mercado de risco por investidores, o setor automotivo passa por transformação tão profunda “que fica difícil para qualquer montadora sobreviver sozinha”, avalia Antônio Jorge Martins, coordenador dos cursos automotivos da FGV. Segundo ele, a necessidade de evolução tecnológica constante e fôlego financeiro para fazer isso vai ditar os rumos do setor. Por isso ele vê a fusão da PSA e da FCA como uma salvação para ambas, lá fora e no Brasil.
Martins ressalta que várias ações já estão ocorrendo. Uma delas é a parceria global anunciada ontem entre General Motors e Microsoft para acelerar a venda de veículos autônomos, assim como a aliança feita no ano passado entre Honda e GM para o compartilhamento de plataformas de carros elétricos e motores. Também há negociações da Hyundai com a Apple para a produção o carro elétrico da empresa de tecnologia. “Hoje são necessários grupos robustos para enfrentar os desafios do setor”, afirma Martins.
Em entrevista ao Estadão/broadcast, Carlos Tavares, CEO da Stellantis, deixou claro que haverá na nova organização uma rede de colaboração na qual uma marca dá apoio a outra.
A possibilidade de venda de carros da Peugeot e da Citroën pelas concessionárias da Fiat nutre, contudo, a principal discórdia das revendas das marcas francesas em relação à união dos grupos, a ponto de associações que as representam pedirem, até agora sem sucesso, a suspensão temporária da fusão no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
A acusação das associações é de que, antes mesmo de a fusão ser concretizada, a PSA vinha consultando revendedores da Fiat sobre dividir suas lojas com as novas marcas.
A estratégia parece fazer sentido pela perspectiva das marcas, que precisam aumentar vendas para reduzir a ociosidade das linhas de produção. Há, porém, um obstáculo legal. A venda de automóveis por lojas autorizadas é uma concessão regulada por lei.
A chamada Lei Ferrari, de 1979, estabelece que os contratos entre fabricante e revenda podem impedir a venda de automóveis de uma marca diferente daquela que a credenciou. Este seria, de acordo com as associações, o ponto da lei infringido pela PSA.
Diferenças. No Brasil, o quebra-cabeça da fusão tem na FCA uma peça maior, com seus grandes complexos industriais em Betim (MG), aberto em 1976, e Goiana (PE), além da unidade de produção de motores em Campo Largo (PR). A PSA conta com uma única fábrica, em Porto Real (RJ).
No País, a pandemia teve maior impacto na PSA. As vendas das marcas francesas caíram 45% em 2020, enquanto as da FCA tiveram retração bem menor, de 13%. O mercado brasileiro, como um todo, amargou baixa de 26,6% no período.
O baque da covid-19 chegou num momento em que, nas matrizes das grandes montadoras, uma série de mudanças estruturais as obriga a remanejar suas estruturas. A corrida pelo carro elétrico, que se tornou uma obrigação com as restrições de governos de países desenvolvidos aos motores à combustão interna, é uma delas. O fim do automóvel como objeto de desejo para as novas gerações é outra.
Uma pesquisa feita pela KPMG em 2019 mostrou que 90% dos consumidores brasileiros gostariam de ter automóveis elétricos disponíveis no País, embora apenas 19% dos executivos de montadoras mostrassem plena convicção de sua viabilidade. Em outro ponto, 40% dos consumidores mostraram interesse em serviços de assinatura de veículos – uma opção à compra do automóvel que não estava no radar das montadoras até pouco tempo atrás.
Essas mudanças induziram alianças, como a firmada entre a Renault-nissan e a Mitsubishi, e fusões, como a que criou a Stellantis. “A fusão da FCA com a PSA é um modelo. E, no lado da FCA, não é a primeira nem a segunda tentativa”, diz Ricardo Bacellar, líder do setor automotivo da KPMG no Brasil. “A indústria passou a responder por investimentos cada vez mais agressivos, e não tem caixa para isso. Então, as montadoras começaram a juntar forças para juntar orçamentos”. (O Estado de S. Paulo/Eduardo Laguna, Matheus Piovesana e Cleide Silva)