Jornal do Comércio
A indústria de máquinas agrícolas voltou sua atenção para a acessibilidade. O campo, que demanda grande contingente de força de trabalho nas mais diversas frentes, geralmente fica à margem de iniciativas que contemplem a inserção de trabalhadores com algum tipo de deficiência física, que, de acordo com o IBGE, são 6,7% da população brasileira. Foi pensando nesse público que uma das maiores montadoras de tratores do País desenvolveu um projeto especial para quem tem problemas de mobilidade.
Apresentado como o primeiro trator agrícola feito por uma montadora visando um público com mobilidade reduzida, o TL5.80 da New Holland conta com uma plataforma de elevação equipada com um joystick, na qual o operador do trator pode fazer os movimentos para embarcar e desembarcar da máquina de maneira ergonômica. Pelo projeto, a empresa foi galardoada com o Prêmio REI (Reconhecimento à Excelência e Inovação), que reconhece os melhores no setor automotivo brasileiro, na categoria Máquinas Agrícolas e Construção.
De acordo com o diretor de Marketing de Produto da New Holland Agriculture para a América do Sul, Cláudio Calaça Júnior, o projeto ainda é tratado como trator-conceito, que precisa passar por uma série de testes e homologações para que possa finalmente chegar ao mercado, mas que a recepção nas feiras o deixou otimista em relação ao sucesso do produto. “Nos surpreendeu porque tivemos depoimentos e feedbacks de diversos clientes que perderam mobilidade e, ao se deparar com a máquina, eles mesmos se perguntavam ‘com o que estou vendo, posso voltar a utilizar o trator no campo?’ É um mercado muito grande e essas pessoas dependem de uma máquina, e agora vão ter essa possibilidade de trabalhar novamente”, conta.
O trator foi desenvolvido em parceria com a Elevittá, empresa especializada em soluções de acessibilidade sediada na cidade gaúcha de Aratiba, na região Norte do Rio Grande do Sul. A parceria entre as empresas já ocorreu antes, com adaptação de vans de transporte através da Iveco, subsidiária da CNH Industrial, e posteriormente máquinas de construção. Entretanto, é a primeira vez que uma máquina agrícola já vem com essas ferramentas de acessibilidade. “Pela repercussão, vimos que vamos ter que estender isso para outras linhas de produtos depois de análises de viabilidade econômica e desenvolvimento necessário”, afirma o diretor.
De acordo com Calaça, há tratores adaptados no campo, mas eles normalmente são ajustados pelos próprios agricultores para uso pessoal, sem contato com o fabricante. Uma adaptação também foi feita por uma estudante de Agronomia do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (Ifes), na cidade capixaba de Santa Teresa. O projeto de conclusão de curso da então aluna Ceziane Soares, um trator agrícola para portadores de deficiência motora, consistia também em adaptar uma plataforma de elevação para subir no equipamento. Posteriormente, o projeto saiu do papel e foi desenvolvido no próprio campus em um trator de modelo TL85E 4×2 TODA, também da New Holland.
O modelo foi apresentado ao público pela primeira vez em fevereiro no Show Rural Coopavel, na cidade paranaense de Cascavel, e depois em março, na Expodireto Cotrijal, em Não-Me-Toque, o último grande evento agropecuário brasileiro a ocorrer presencialmente antes da pandemia. Na Expodireto, a New Holland contratou o agricultor Ângelo Klein para demonstrar o produto. Natural de Almirante Tamandaré do Sul, Klein trabalha nos cultivos de aveia, trigo e soja e é amputado da perna esquerda. “Eu já sou um pouco privilegiado porque a maioria das máquinas já está vindo com transmissão hidro, como se fosse um carro automático”, explica Klein, notando que esse sistema já está presente na maioria dos pulverizadores e colheitadeiras. Na sua visão, o trator TL5.80 pode facilitar os trabalhos para todas as pessoas com mobilidade reduzida, incluindo idosos. “Pessoas com mais idade também pode se beneficiar disso”, explica. (Jornal do Comércio/Carlos Villela)