O Estado de S. Paulo
A crise provocada pelo novo coronavírus está acelerando o segmento de locação de caminhões e contribuindo com montadoras na retomada da produção. Diante da falta de liquidez no mercado em razão da insegurança do setor financeiro em liberar crédito, várias empresas estão optando por essa modalidade.
Segundo locadoras, além de não imobilizar capital, o aluguel dispensa a empresa de serviços de manutenção. Para as fabricantes dos veículos, ajuda a amenizar a alta ociosidade das fábricas, que este ano deve ficar em cerca de 80% da capacidade instalada.
A Ouro Verde, de Curitiba (PR), é dona de uma frota de 5 mil caminhões e 3 mil equipamentos (carrocerias, máquinas agrícolas e para construção), dos quais 94% estão alugados. Neste ano, a empresa já registrou crescimento de 30% nos negócios em relação ao ano passado, impulsionado pelo setor do agronegócio, rodoviário, elétrico e de saneamento, informa o diretor comercial Manuel Silva.
“Neste período de pandemia, e com o consequente impacto negativo no caixa, a desmobilização dos ativos e o aluguel são demandas recorrentes para melhorar a situação das empresas”, afirma Silva. A empresa também opera com a chamada “Sale Lease Back”, modalidade de compra de frotas usadas para ser alugada aos antigos donos. “A empresa tem planos ambiciosos de ampliação da frota ainda neste ano, aproveitando a demanda e as boas oportunidades no mercado, bem como sua capacidade de investimento.”
A procura pela locação de caminhões começou a ganhar força nos últimos dois anos e teve empurrão extra na pandemia. “A crise atual acelerou a demanda por locação de caminhões, já que as empresas se viram obrigadas a estudar soluções para o curto prazo que pudessem reduzir custos e reforçar o caixa, sem afetar suas operações”, afirma Renato Vaz, diretor da Marbor Frotas Corporativas, de Mogi das Cruzes (SP), que tem 100 veículos alugados.
A empresa também lançou na semana seu plano de “Lease Back”, com pagamento à vista. “Compramos a frota e os clientes passam a alugar os veículos que antes eram próprios”, explica Vaz. “É uma forma de ajudar as empresas a recompor o caixa na crise.” Segundo a Marbor, nos últimos 12 meses o volume de locação de caminhões e utilitários aumentou 40%. O plano da Marbor é ampliar sua frota para 500 veículos em 2021, entre caminhões, vans e empilhadeiras.
Com 13,5 mil unidades para locação, o Grupo Vamos, da JSL, foi responsável nos últimos 12 meses por 4% das vendas de caminhões das montadoras, informa Gustavo Couto, presidente da locadora, a maior do Brasil no segmento. Criada no fim de 2015 em São Paulo, a empresa registrou crescimento de 30% ao ano, ritmo mantido mesmo no período de pandemia.
1% alugada
Couto afirma que, da frota total de caminhões em circulação no País, apenas 1% é alugada. Ele acredita que a participação da modalidade vai crescer, pois as empresas estão percebendo que não é preciso “carregar o custo de ter a propriedade do caminhão”, que implica, por exemplo, em ter equipe para administrar a frota e sua manutenção. Cálculos indicam que o custo do aluguel chega a ser 30% menor que o da aquisição.
O grupo tem mais de 400 contratos e também atua na locação de máquinas agrícolas. Os setores que mais demandam o serviço, segundo Couto, são os de agronegócio, logística e transporte, varejo e serviços como de telefonia, distribuição de energia e coleta de lixo. Os preços de locação partem de R$ 3 mil ao mês.
Um dos principais fornecedores do Grupo Vamos, a Volkswagen Caminhões e Ônibus tem cerca de 15% de sua produção voltada às locadoras. Em 27 de abril, a empresa e a Scania foram as primeiras montadoras a retomar atividades após as paradas de mais de um mês em razão da pandemia.
O presidente da VWCO, Roberto Cortes, diz que a locação “está ganhando terreno em razão da falta de liquidez das empresas” para adquirir veículos próprios neste momento. O complexo da empresa em Resende (RJ) emprega 4,5 mil pessoas, e apenas 1 mil voltaram ao trabalho por enquanto.
A Mercedes-Benz espera um aumento de mais de 50% nas vendas de caminhões para clientes de locadoras neste ano em relação a 2019. Roberto Leoncini, vice-presidente da divisão de caminhões, afirma que a demanda está aquecida pois várias empresas passaram a ver o aluguel como nova alternativa. “O aluguel de caminhões torna-se opção para empresas com capacidade de caixa impactada neste momento para investimentos.” Em sua opinião, a demanda deve vir de atividades básicas como coleta de lixo, limpeza urbana e empresas de distribuição de energia, que precisam de caminhões para manter suas atividades.
A Scania informa que têm recebido muitas consultas de locadoras, mas não fechou nenhum negócio ainda. A empresa retomou atividades com equipe completa, dividida em dois turnos. Na semana passada, recebeu da PepsiCo encomenda de 18 caminhões movidos a GNV e/ou biometano, tecnologia lançada recentemente. As primeiras entregas estão previstas para agosto.
O presidente da Associação Brasileira de Locadoras de Automóveis (Abla), Paulo Miguel Junior, não tem números específicos da locação de caminhões neste ano, mas afirma que o segmento está crescendo bastante. Um dos setores que tem usado a modalidade, diz, é o da construção civil, que não suspendeu atividades na quarentena. (O Estado de S. Paulo/Cleide Silva)