O Estado de S. Paulo/Jornal do Carro
Carro tem burrinho, macaco, cavalo, porca… E panela, pescador, flauta, cebolinha, chicote… Apesar de toda a tecnologia, mesmo automóveis modernos continuam a dar carona para itens com apelidos tão estranhos como antigos. A explicação mais aceita para isso é que, na tentativa de traduzir para leigos o complicado vocabulário técnico dos automóveis, mecânicos aos poucos foram colocando apelidos em diversos componentes. Assim, o cilindro mestre do sistema de freios, responsável por empurrar o óleo que fará as rodas pararem o carro, passou a ser conhecido apenas como “burrinho”.
Se não há nenhuma analogia entre cilindros e burros, por outro lado algumas peças receberam o mesmo nome de peças parecidas, encontradas na cozinha. Ou no zoológico. Foi assim com o tambor de freio, utilizado na traseira da maioria dos automóveis, especialmente os mais baratos. Por causa do formato circular, passou a ser conhecido como “panela”. É a mesma explicação do “chicote”. Por mais simpáticas que sejam as linhas de um automóvel, saiba que ele tem chicote. Trata-se de um emaranhado de fios, envoltos em uma espécie de capa, que distribui energia elétrica para todos os equipamentos do veículo. Mesmo sem castigar ninguém, o componente não demorou para ganhar o apelido.
Pescador
Carro também tem pescador. Esse é o nome popular da peça que fica no fundo do tanque e “pesca” o combustível que será enviado ao motor.
O servofreio, item cuja função é amplificar a potência de frenagem e reduzir o esforço do motorista ao pisar no pedal, acabou sendo conhecido também como “cuíca”, dada a ligeira semelhança com o instrumento musical.
Mas nem com toda imaginação e boa vontade do mundo é possível visualizar uma “cebolinha” olhando para o sensor de temperatura do motor. Trata-se de uma válvula responsável por abrir e fechar a passagem de água entre o motor e o radiador. Normalmente, ela fica fechada enquanto a água não chega à temperatura ideal de funcionamento do motor, e abre-se para que o líquido circule e refrigere o propulsor. Por alguma razão, ele recebeu esse apelido. Aliás, não só esse. Há também quem o conheça pelo aumentativo, “cebolão”.
Com vela, não há dúvida: é comprida, cilíndrica, branca e solta faísca – embora nesse caso o “fogo” apareça na parte debaixo, dentro da câmara de combustão, e não em cima.
Da mesma forma, a parte central do radiador tem mesmo o formato de “colmeia”. É por ali que a água circula e perde temperatura, antes de voltar ao motor para realizar mais uma vez a função de resfriamento da máquina.
E carro também tem flauta. Ela não emite nenhum ruído, mas tem formato cilíndrico e é longa (daí o apelido). É por ali que o combustível é distribuído pelos cilindros. Já o “pinhão” não tem muita explicação. Ele é um componente do sistema de direção, mas não tem nenhuma relação com a semente da pinha.
Brucutu
Embora a peça que direciona o esguicho de água para lavar o vidro não seja reconhecida pela falta de educação ou pelos modos grosseiros, por alguma razão passou a ser chamada de brucutu. Ou, no Rio de Janeiro, pela alcunha de carcará, mesmo não voando.
O macaco também tem origem envolta em mistério. A peça usada para levantar carros não tem nenhuma semelhança com primatas. Alguns, aliás, têm o formato de sanfona, mas nem assim trocaram o nome de animal pelo de instrumento musical. Esses passaram a ser conhecidos como “macaco sanfona”. Já nas oficinas mecânicas o macaco “jacaré” tem sua lógica: ele é comprido e possui uma articulação semelhante a uma enorme boca, que se abre não para comer, mas para elevar o veículo.
Outro mistério é a armação interna dos carros de corrida, conhecida como “Santo Antônio” ou “Santantônio”. A alusão a nome de santo tem algo a ver com proteção, já que ela está ali para proteger o piloto. Mas, nessa linha, o mais sensato seria invocar São Cristóvão, o padroeiro dos motoristas.
E o que dizer daquele apoio de mãos para os passageiros se segurarem? Poderia ser chamado, por exemplo, de “apoio de mãos”, mas no passado as pessoas devem ter recorrido a ele em momentos de tanta aflição e perigo que a peça passou a ser singelamente conhecida como (vamos manter apenas a abreviatura aqui) “pqp”.
Há também os casos de nome técnico, tal como cavalo-vapor (cv). Unidade de potência usada em mecânica, corresponde à força necessária para elevar, em um segundo, o peso de 75 kg a um metro de altura. O equivalente inglês, horse power (hp), vale um pouco mais: 1 hp corresponde a 1,014 cv. (O Estado de S. Paulo/Jornal do Carro/Hairton Ponciano)