O Estado de S. Paulo
O Brasil seguirá em ritmo inferior à média global se não elevar o potencial produtivo.
O Brasil poderá crescer com mais vigor nos próximos dois anos, se a pauta de reformas avançar, mas as contas públicas permanecem desafiadoras, com uma dívida próxima de 80% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A economia brasileira deve expandir-se 0,8% neste ano, 1,7% no próximo e 1,8% em 2021, de acordo com as últimas estimativas. São números piores que aqueles publicados em outubro pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), projetando 0,9% de expansão em 2019 e 2% em 2020. Mas há uma coincidência especialmente importante entre os cálculos correntes no mercado e nas entidades multilaterais. Mesmo com alguma recuperação, o ritmo brasileiro seguirá bem abaixo da média mundial, a julgar pelos dados econômicos e políticos do País hoje conhecidos.
Os tons são geralmente sombrios no quadro mais amplo apresentado pela OCDE. O crescimento global estimado para este ano, de 2,9%, é o menor desde a crise de 2008. A estimativa para 2020 passou de 3% para 2,9%. Em 2021, o ritmo deve voltar a 3%, mas os números poderão piorar nos próximos anos, se as tensões comerciais aumentarem, afetando trocas e freando investimentos.
O relatório menciona a multiplicação de barreiras ao comércio, o aumento de subsídios e, de modo geral, a multiplicação de entraves ao funcionamento do mercado global.
Mudanças estruturais também poderão afetar o ritmo da economia. Exemplo: a continuação do ajuste iniciado há anos na China, com menor ênfase no investimento e maior expansão do consumo, poderá mexer em outros países. O crescimento chinês deverá passar de 6,2% neste ano para 5,7% em 2020 e 5,5% em 2021, segundo a OCDE. Não é preciso buscar detalhes no relatório para notar a importância desse dado para o Brasil. A China é o maior mercado importador de produtos brasileiros.
Neste momento, o tom sombrio do quadro divulgado pela OCDE vale principalmente como advertência. Os perigos poderão ser atenuados, se os governos deixarem de criar entraves ao comércio, se o Brexit (a saída do Reino Unido da União Europeia) ocorrer, afinal, sem trambolhões, se houver maior atenção à qualidade do crédito e se houver uma ação coordenada de incentivos fiscais à atividade econômica.
O documento da OCDE reforça a recomendação formulada pela direção do Banco Central Europeu e pelo FMI: governos com alguma folga em suas contas devem assumir a liderança na criação de estímulos, porque os incentivos monetários, até com juros negativos, chegaram ao limite. Essa mudança já foi claramente endossada pela Comissão Europeia.
Relaxamento fiscal está fora do alcance de alguns governos do mundo avançado, como o italiano, e também do brasileiro. No Brasil, o incentivo oficial mais importante ainda será, por longo tempo, a melhora das condições de crédito, com redução de juros e inovação das formas de financiamento. Na área governamental, a mobilização de recursos privados para obras de infraestrutura e a revitalização de programas habitacionais são exemplos de ações ainda com amplas possibilidades de exploração. Isso requer uma capacidade de planejamento e de execução demonstrada com modéstia, até agora, pelo governo federal.
Com a reativação ainda lenta, o desemprego tem diminuído muito devagar, como registra o material divulgado pela OCDE. A melhora do emprego provavelmente continuará vagarosa, se o crescimento brasileiro permanecer muito menor que o de grande parte das outras economias. No cenário da OCDE, os países do Grupo dos 20 (G-20), formado pelas maiores economias avançadas e emergentes, devem crescer em média 3,1% neste ano, 3,2% no próximo e 3,3% em 2021.
O Brasil seguirá, nesses anos, em ritmo bem inferior à média global e à do G-20 e bem atrás dos emergentes mais dinâmicos, como China, Índia e Indonésia. O atraso persistirá nos anos seguintes, se o desafio de elevar o potencial produtivo continuar quase intocado, como até agora. (O Estado de S. Paulo)