O Brasil e a Indústria 4.0

O Estado de S. Paulo

 

“Quando há uma revolução inelutável, a gente ou lidera, ou segue ou sai do caminho.” A afirmação é do diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Thomaz Zanotto, e foi feita durante o Fórum Público da Organização Mundial do Comércio (OMC), realizado recentemente em Genebra. Entre outros temas, o evento tratou de inteligência artificial e nanotecnologia.

 

Em sua intervenção, Zanotto discutiu um ponto polêmico registrado por uma pesquisa realizada em 2018 pela Fiesp em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial. Segundo o levantamento, 32% dos industriais entrevistados disseram que não sabem o que é a Quarta Revolução Industrial – a chamada Indústria 4.0. Essa revolução começou com a difusão das tecnologias de comunicação desenvolvidas nos anos 1970 e se intensificou com os avanços na inteligência artificial e na biotecnologia.

 

O estudo da Fiesp revela que o Brasil se encontra fora da nova economia mundial, não tendo relevância em nenhuma das áreas-chave da Indústria 4.0. A pesquisa mostrou que apenas 5% das empresas brasileiras se sentem “muito preparadas” para enfrentar os desafios da Indústria 4.0 e que 23% se consideram “nem um pouco preparadas”. Também apontou que somente 41% das empresas brasileiras utilizam o lean manufacturing – o sistema de produção enxuta. Por fim, revelou que as áreas com mais potencial para se beneficiar dos avanços tecnológicos são as de produção, controle de qualidade, planejamento e engenharia de desenvolvimento de novos produtos. Das 227 empresas pesquisadas, 55% são pequenas, 30% são de porte médio e as demais são grandes.

 

Em sua intervenção, Zanotto apontou os desafios que o Brasil tem de enfrentar para reduzir o atraso com relação à Indústria 4.0 e atribuiu o problema à recessão econômica. Também lembrou que o País está voltando a crescer, ainda que de modo lento, e que o setor industrial está acordando para o desenvolvimento de novas tecnologias. Apesar de seu otimismo, contudo, os problemas que o Brasil tem de enfrentar para reduzir o atraso tecnológico são enormes.

 

Os pedidos de registro de patente, por exemplo, continuam demorando muito tempo para serem avaliados e vêm crescendo num ritmo mais lento do que nas economias emergentes, as que competem diretamente com a indústria brasileira nos mercados mundiais. Dados do IBGE também mostram que, na última década, a introdução de tecnologias 4.0 no setor industrial brasileiro foi incipiente, sobretudo por causa de deficiências na infraestrutura de comunicação e do custo de importação de máquinas e equipamentos. Por seu lado, estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada mediram o uso de 16 tipos de habilidades nos empregos disponíveis no Brasil e constataram que elas vêm crescendo de “forma tímida”. Já a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico aponta, em seus relatórios, que o Brasil é um dos países que menos formam profissionais nas áreas de tecnologia, engenharias e matemática. Entre nós, além disso, a taxa de desistência nos cursos de graduação em tecnologia é de 69%.

 

Os números mostram que as novas gerações não têm preparo para acompanhar a revolução que a Indústria 4.0 vem causando no mundo. Sem condições de formar capital humano, o País continua incapaz de desenvolver mão de obra tão produtiva e adaptável quanto a de outras economias emergentes. Essa combinação entre gargalos estruturais em matéria de infraestrutura e falta de qualificação técnica das novas gerações dá a medida dos obstáculos que o Brasil tem de enfrentar para implementar sistemas industriais inteligentes.

 

A superação desses obstáculos depende não só de maior envolvimento da iniciativa privada com a Indústria 4.0, como mostra a pesquisa da Fiesp, mas, também, de políticas mais eficientes do poder público, especialmente na área da educação. (O Estado de S. Paulo)