O Estado de S. Paulo
O acordo fechado por Mercosul e União Europeia (UE) prevê que os países dos dois blocos vão poder elevar tarifas caso haja “aumento inesperado e significativo” na importação de produtos agrícolas e industriais. A medida terá de ser temporária (dois anos, prorrogáveis por mais dois anos), mas poderá ser tomada até 18 anos após a entrada em vigor do tratado.
O acordo de livre-comércio fechado entre Mercosul e União Europeia (UE) inclui uma cláusula de proteção que permitirá aos países signatários elevar tarifas novamente caso haja um “aumento inesperado e significativo” na importação de produtos agrícolas e industriais.
A medida poderá ser tomada em qualquer momento até 18 anos após a entrada em vigor do tratado, mas essa barreira terá de ser temporária: por dois anos, prorrogáveis mais dois anos. Na prática, isso significa que o cronograma para que as tarifas de importação sejam eliminadas pode atrasar para determinados produtos a depender da avaliação dos governos locais.
Para usar esse mecanismo, porém, será necessário comprovar por meio de critérios técnicos que o “surto de importação” está causando prejuízos ou ameaça a indústria e os produtores locais, segundo uma fonte do governo brasileiro.
Do lado dos europeus, esse processo de investigação será conduzido em bloco, pela União Europeia. Já no caso do Mercosul, cada um dos países poderá levantar a barreira de proteção individualmente.
O mecanismo vem sendo usado pelo Brasil em outros acordos bilaterais e sua inclusão foi vista como uma vitória pelos negociadores do País. Isso porque os europeus tentavam forçar a inclusão de um tipo de salvaguarda agrícola mais abrangente, que poderia ser levantada com mais facilidade, criando barreiras ao agronegócio brasileiro. Foi possível barrar na negociação esse pleito, de acordo com integrantes do governo brasileiro.
O tratado estabelece que o Mercosul vai zerar as alíquotas para 91% das importações da UE em até 15 anos. As mercadorias foram divididas em cinco grupos: os que terão tarifas eliminadas de imediato, os que terão as tarifas zeradas em quatro anos, sete anos, dez anos e 15 anos. Nesse prazo mais elástico, estão, por exemplo, automóveis, autopeças e produtos químicos como os farmacêuticos.
Os europeus vão cortar as tarifas de 92% das mercadorias trazidas do Mercosul em até dez anos, com produtos zerados imediatamente, em até quatro anos, sete anos, e dez anos.
Para que as cláusulas comerciais do acordo entrem em vigor, será preciso que o Parlamento Europeu aprove o tratado. O secretário especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia, Marcos Troyjo, minimizou as resistências que pode haver em Parlamentos europeus sobre a aprovação do acordo, sobretudo pelas pressões de ruralistas franceses e metalúrgicos alemães. “A União Europeia tem ganhos significativos com o acordo, equivalentes aos nossos”, respondeu a jornalistas ontem.
Há negociação dentro do Mercosul para que a ratificação ocorra aqui de forma bilateral: ou seja, quando o Brasil aprovar, ele já passa a valer entre brasileiros e europeus – sem que seja necessário aguardar Argentina, Paraguai e Uruguai.
Vitórias
O texto negociado garante que o Mercosul poderá manter os regimes especiais de exportação. Essa era uma questão especialmente importante para o Brasil, pois atualmente um terço dos embarques do País para o bloco europeu ocorre por meio do chamado “drawback”, regime aduaneiro pelo qual a importação de insumos tem isenção de tarifa para a produção de produtos que serão exportados. No ano passado, foram cerca de US$ 15 bilhões em vendas nesse tipo de regime.
Sem a preservação desse instrumento, a Zona Franca de Manaus seria fortemente prejudicada, por exemplo.
Outro ponto considerado uma vitória pelo Brasil foi a preservação de cláusulas que protegem o programa de genéricos. Para os europeus, havia a demanda de incluir dois tipos de proteção: a extensão de patentes e a exclusividade de dados para testes clínicos. Os dois pontos não emplacaram.
O acordo vai facilitar ainda que empresas europeias participem de licitações no Brasil, um mercado de US$ 78 bilhões em 2017. As empresas brasileiras também terão mais facilidade de disputar as compras governamentais na Europa. (O Estado de S. Paulo/Renata Agostini Julia Lindner, Lorenna Rodrigues e Eduardo Rodrigues)