O Estado de S. Paulo
Uma onda de casos de furtos de combustíveis na malha de oleodutos do País virou questão de segurança nacional e acendeu o alerta do Palácio do Planalto. Nos últimos três anos, quadrilhas especializadas perfuraram 578 pontos das tubulações para roubar gasolina e diesel. A escalada do crime já interrompeu o fluxo de combustíveis para Brasília por três dias em janeiro e levou o governo a estudar propostas para aumentar o rigor da legislação sobre o tema.
Dados levantados pela Transpetro, subsidiária da Petrobrás, revelam que o número de furtos de combustíveis ao longo da malha de 14 mil quilômetros de dutos (oleodutos e gasodutos) saltou de 72 em 2016 para 261 no ano passado. As informações foram repassadas ao governo para auxiliar nas investigações de órgãos de segurança
Investigação
De janeiro para cá, a empresa registrou 30 ocorrências de perfurações clandestinas de tubos. Foi numa delas, em Araras, no interior de São Paulo, que a ação dos criminosos interrompeu o fluxo de combustível do oleoduto Osbra, que liga a Refinaria de Paulínia ao terminal de Brasília, a 840 km de distância. A suspensão do fornecimento por mais de mais de 72 horas não chegou a causar desabastecimento, mas, porque algumas bandeiras, como a Shell levaram o produto em caminhões para atender à demanda dos postos.
Uma boa parte da tubulação de óleo da Transpetro passa perto de bairros residenciais e estradas de acesso de cerca de 600 cidades em todas as regiões do País. Apenas em São Paulo, 42 municípios têm suas áreas urbanas próximas a dutos. Das ações criminosas registradas no ano passado, 57% ocorreram no Estado, enquanto 26% aconteceram no Rio de Janeiro.
Em reunião na semana passada, o Conselho Administrativo da Petrobrás decidiu intensificar os investimentos para detectar, em tempo real, as perfurações clandestinas dos oleodutos. A empresa decidiu procurar as superintendências da Polícia Federal, as polícias estaduais e o Ministério Público para intensificar as investigações.
Ao Estado, o presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, afirmou que o furto de combustível tem sido alvo de grande “preocupação” e “mobilização”. Ele informou que lançará uma campanha de conscientização das comunidades para ajudar no monitoramento das tubulações. “Trata-se de um problema que gera prejuízos para a companhia, não só pelo furto em si, mas também pelo dano causado à infraestrutura e, mais do que isso, pelo risco às comunidades e ao meio ambiente”, declarou. “Em dois anos, as ocorrências em nossa infraestrutura quase quadruplicaram”.
No México, o furto no setor de dutos se transformou num “negócio estruturado”, destaca Castello Branco. “Não podemos deixar que isso aconteça no Brasil”, disse.
Risco de explosão é grande
A maior preocupação do governo com os roubos nos dutos é com a explosão que esse tipo de ação pode provocar. Neste ano, um desastre no México matou mais de 90 pessoas, depois da explosão de um oleoduto na cidade de Tlahuelilpan, no Estado de Hidalgo, na região central do país. A explosão ocorreu no dia 18 de janeiro, depois que o oleoduto Tula-Tuxpan foi perfurado por ladrões de combustíveis. Um grupo de até 800 pessoas foi até o local para coletar gasolina em galões. A presença do Exército não inibiu os moradores, que acabaram sendo atingidos.
Não há uma lei específica para o crime no setor de óleo e gás. Para um furto qualificado, a pena, de reclusão de dois a oito anos e multa, é considerada branda.
A escalada de furtos de óleo está no radar do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). A pasta da Presidência da República acompanha, por meio de informativos de vários órgãos, entre eles a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), dados considerados sensíveis à infraestrutura. Questionado pela reportagem sobre investigações dos grupos criminosos, o GSI respondeu que não se manifestaria por se tratar de tema “relacionado com a inteligência de Estado”.
O GSI, no entanto, ressaltou que “realiza, permanentemente, o acompanhamento de assuntos pertinentes às infraestruturas críticas, com prioridade aos que se referem à avaliação de riscos”. “Nesse contexto, incluem-se os dutos existentes pela importância que representam à logística do País, bem como pela segurança da sociedade brasileira, em função da possibilidade de sinistros, por diversas razões”, destacou.
Em 2018, o GSI esteve à frente do monitoramento da situação viária durante a greve dos caminhoneiros. A “infraestrutura crítica” citada na nota da assessoria do órgão é uma referência a portos, aeroportos, ferrovias, rodoanéis, termoelétricas e rodovias. (O Estado de S. Paulo/Tânia Monteiro)