O Estado de S. Paulo
O secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, que permanecerá no cargo durante o governo de Jair Bolsonaro, criticou nesta quarta-feira a postura de montadoras instaladas no Brasil em relação a pedidos de incentivo fiscal. Segundo ele, as empresas pedem benefícios para cumprir a legislação ambiental.
A crítica surgiu enquanto o secretário contava, em um evento, de uma reunião que teve com executivos de uma montadora alemã que atua no mercado brasileiro durante as discussões para aprovação do Rota 2030, nova política do governo para o setor.
“Eles me perguntaram por que o programa estava demorando para sair e eu disse a eles que estava demorando para sair porque no Brasil vocês [as montadoras] pedem incentivo para cumprir legislação ambiental, e isso não faz sentido. Eu não posso dar incentivo a uma empresa de fora para ela cumprir a legislação ambiental”, relatou, em evento da FecomercioSP que discutiu o papel do Estado na economia. Ele não citou os nomes dos executivos nem da empresa.
O Rota 2030 começou a ser discutido no ano passado e foi aprovado pelo Congresso em novembro deste ano. As discussões foram marcadas por um embate entre o Ministério da Fazenda e o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC).
Enquanto a Fazenda resistia em conceder alguns benefícios pedidos pelas montadoras, com a justificativa de que isso atrapalharia o ajuste fiscal, o MDIC se posicionava ao lado das empresas. Almeida participou das conversas enquanto secretário de Acompanhamento Fiscal, Energia e Loteria, cargo que ocupou até abril, quando passou a comandar o Tesouro.
No fim das contas, o programa foi aprovado no Congresso com uma regra que prevê o abatimento no Imposto de Renda devido ou na Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) de 10% a 12% do valor investido pelas empresas em pesquisa e desenvolvimento.
O programa também envolve, entre outras medidas, descontos de até 2 pontos porcentuais no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para as fabricantes que superarem as metas estabelecidas para melhorar a eficiência energética (redução de consumo de combustível e de emissão de poluentes) e a segurança dos automóveis.
“Quando se coloca a proposta na mesa não há consenso”, diz Mansueto.
Mansueto também afirmou nesta quarta-feira que, embora pareça haver consenso sobre a necessidade da reforma da Previdência, ainda não há uma convergência sobre que tipo de proposta será enviada ao Congresso. De qualquer forma, considera que a chance de aprovação em 2019 é alta.
“Em finanças públicas, tudo parece ser consensual, mas não é. As reformas da Previdência e tributária parecem consensuais, mas quando se coloca a proposta na mesa não há consenso coisa alguma”, disse o secretário, durante sua palestra em evento que discute o papel do Estado na economia, realizado em São Paulo pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) em parceria com a Universidade Columbia, de Nova York, a Fundação Lemann, a Casa das Garças e o canal Um Brasil.
Depois, afirmou que, para construir consenso, é preciso insistir na explicação para a sociedade. “Temos de colocar esses dados sobre Previdência e ajuste fiscal de uma forma muito clara”, disse. “Queremos acreditar que há consenso para o ajuste, mas, pela minha experiência, esse consenso não existe”, ressaltou. “Mas há três anos não se falava de reforma da Previdência, o debate amadureceu”, disse.
Apesar de ainda não haver uma definição sobre como será a proposta, Mansueto acredita que é alta a chance de aprovação da reforma já no primeiro ano do governo de Bolsonaro, porque existe consenso em relação a algumas questões fundamentais, como, por exemplo, a criação da idade mínima.
No entanto, ele lembrou que o sucesso da reforma depende da capacidade política do próximo governo. “O governo tem o segundo maior partido do Congresso, mas precisa construir uma coalizão e isso não é simples”, disse. “No governo Temer, aprovamos algumas reformas, como o teto dos gastos, e, para isso, foram necessários muitos cafés, almoços e jantares”, afirmou.
O secretário destacou também que o poder Executivo vai precisar de um diálogo mais produtivo com o poder Judiciário porque as reformas passarão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e é importante que os ministros da corte conheçam o impacto econômico das medidas antes de tomar suas decisões. “E isso só ocorrerá com muito diálogo”, disse ele, para quem a interlocução entre esses poderes tem sido “muito pequena” nos últimos anos.
O secretário do Tesouro Nacional ainda afirmou que não vê problema algum no fatiamento da reforma da Previdência se isso representar uma proposta separada para o regime de capitalização. “Não está claro como seria o fatiamento, mas, se for um fatiamento com uma proposta para o regime de capitalização separada da reforma do INSS e para os funcionários públicos, não vejo problema algum”, disse. (O Estado de S. Paulo/André Ítalo Rocha)