Parte da indústria automotiva faz pressão contra os veículos elétricos no Brasil, dizem fabricantes

Diário do Transporte

 

De acordo com dados do Renavan, o total de veículos elétricos no Brasil vem crescendo nos últimos anos. Em 2016, foram emplacadas em torno de mil unidades entre elétricos só com baterias e modelos híbridos (um motor a combustão + um motor elétrico). Em 2017, o número cresceu para 3,4 mil unidades e, em 2018, a quantidade deve ser maior, mas nada que se compare com o total de 1,3 milhão de veículos à combustão emplacados no acumulado somente entre janeiro e agosto, segundo o mais recente levantamento da Fenabrave, entidade que reúne as revendedoras de automóveis.

 

O crescimento de veículos elétricos no Brasil, entretanto, poderia se maior se não fossem alguns entraves, como a necessidade de mais incentivos fiscais e uma espécie de lobby que vem de alguns segmentos ligados à indústria automotiva instalada no País.

 

Para a vice-presidente de pesados da ABVE – Associação Brasileira do Veículo Elétrico, Ieda Oliveira, um exemplo tem ocorrido com o ônibus elétrico no Brasil.

 

Segundo a executiva, a entidade tem verificado uma pressão por parte da indústria de veículos pesados no País para atrasar a implantação de sistemas de transportes que contem com mais ônibus elétricos.

 

“A gente está mudando a tecnologia dos ônibus e você tem toda uma indústria instalada no país. Existe uma pressão muito forte para que isso não aconteça já, ou seja, que aconteça no tempo em que essa indústria esteja preparada para isso. Isso não facilita a entrada dos veículos elétricos.” – disse.

 

Ieda Oliveira destaca a possibilidade da criação de exigências para a homologação dos modelos elétricos que não são aplicadas para ônibus a diesel e que dificultariam a expansão das frotas menos poluentes.

 

“Está havendo a indicação de que para os sistemas que vão homologar essa tecnologia, adotem normas europeias que não são aplicadas nem nos ônibus a diesel hoje. Então não faz sentido se não tem essas normas aplicadas nos veículos a diesel, ter normas aplicadas nos veículos elétricos…. Normas que envolvem carroceria, chassi, o próprio sistema de tração do veículo. Então isso é uma situação atípica.” – relatou

 

Pegadinhas no Rota 2030

 

Além dos ônibus elétricos, outros veículos da mesma propulsão estariam sofrendo ainda em 2018 lobbys de parte da indústria automotiva no Brasil.

 

Segundo o diretor de marketing, sustentabilidade e negócios da BYD Brasil, empresa chinesa que fabrica placas fotovoltaicas (energia solar) e carros, caminhões e ônibus elétricos, Adalberto Maluf, até mesmo o Rota 2030, que define metas obrigatórias de eficiência energética, segurança veicular e de investimento em pesquisa e desenvolvimento, está cheio de “pegadinhas” contra os modelos movidos à eletricidade.

 

“Infelizmente existem montadoras que ainda não têm tecnologia ou não acham que o mercado brasileiro esteja pronto para tecnologia, então adoram ficar criando pegadinhas e pequenas coisas na legislação. A gente viu na aprovação do Rota 2030, o novo regime automotivo, que colocaram algumas pegadinhas lá que o elétrico que era para reduzir o imposto, na prática, para muitos híbridos vai aumentar o IPI” – disse Maluf, que ainda exemplificou.

 

“O Prius, carro híbrido da Toyota, de 13% vai para 14% de IPI. Híbridos de categorias maiores, como Volvo e Porsche, vão passar de 11%, 12% para 14%,15%. Para um totalmente elétrico como o nosso (BYD) as alíquotas de IPI vão cair de 25% para 8%,9%, alguns 13%, 14%, mas não vão cair para 7%, que é para carros Flex (álcool e gasolina). O flex, a combustão, sendo que a maior parte das pessoas ainda usa gasolina, vai pagar menos que os elétricos. O Governo criou ainda um outro incentivo para híbrido-flex, que vai pagar 2% a menos de IPI, então vai pagar 5%. E se a montadora cumprir a meta de eficiência energética no primeiro ciclo vai ganhar mais 2%. Então o híbrido-flex vai pagar 3% do IPI e o melhor elétrico, no melhor cenário, vai pagar 8%.” – relatou Maluf.

 

Para o representante da indústria chinesa no Brasil, o critério de redução de IPI baseado na cilindrada causa distorções tributárias entre os veículos à combustão e os elétricos.

 

“É uma situação de distorção pela qual as montadoras ainda ficam incentivando o governo a criar pegadinhas, impondo exigências para ônibus elétricos que os movidos a diesel não têm, mas se você quer, por exemplo, na questão do imposto, cobrar por eficiência energética, o híbrido e o elétrico vão pagar de acordo com a eficiência, maravilha, estamos dispostos, nossos veículos são mais eficientes, mas por que os veículos a gasolina e a diesel não pagam por eficiência, e sim pagam por uma fórmula diferente de cilindradas que é fácil de ser manipulada e todo mundo paga menos?” – questiona.

 

Avanços

 

Entretanto, apesar das pressões contrárias que relatou, a diretora de veículos pesados da ABVE, Ieda Oliveira, vê no caso dos ônibus, avanços e algumas boas perspectivas.

 

A executiva anunciou que a entidade está em negociações com o BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social e em breve deve ser anunciada uma linha de crédito para financiar ônibus elétricos, destinada a cidades que possuem legislações que contemplem modelos de coletivos menos poluentes, como a capital paulista.

 

“A gente vem discutindo no BNDES para que se possa ter uma linha de crédito específica, que motive, ou seja, que permita a entrada desses ônibus não somente na cidade de São Paulo, mas para todas as cidades que apresentarem legislações com esse foco de reduzir as emissões ou metas para zerar.” – adiantou Ieda ao Diário do Transporte.

 

A cidade de São Paulo aprovou no início do ano a lei 16.802 que estipula metas de redução de emissões pela frota de ônibus municipais em períodos de 10 anos e 20 anos.

 

Em 10 anos, as reduções de CO2 (gás carbônico) devem ser de 50% e, de 100%, em 20 anos. Já as reduções de MP (materiais particulados) devem ser de 90%, em 10 anos, e, de 95%, em 20 anos. As emissões de Óxidos de Nitrogênio devem ser de 80%, em 10 anos, e de 95% em 20 anos.

 

Mas a lei ainda não foi regulamentada e os editais da licitação dos serviços de ônibus, que contemplam estas metas, estão barrados pelo TCM – Tribunal de Contas do Município, sem previsão ainda de liberação. (Diário do Transporte/Adamo Bazani)