União Europeia se prepara para o caos do Brexit

O Estado de S. Paulo/The New York Times

 

O governo holandês determinou a contratação de mil funcionários da alfândega. A Agência de Saúde da Grã-Bretanha estuda como garantir fornecimentos de remédios, enquanto a Irlanda prepara inspeções de fronteira para as remessas de alimentos e até mesmo cavalos de corrida.

 

A primeira-ministra Theresa May enfrenta dificuldades para concluir o rompimento da Grã-Bretanha da União Europeia, e o desarranjo amplia a necessidade de os governos disporem de planos de reserva para uma variedade de possibilidades caóticas.

 

No dia 19 de julho, a Comissão Europeia, braço executivo da União Europeia, emitiu um comunicado urgente para que os países da região acelerem os preparativos “em todos os níveis e para todos os resultados”. E avisou que a saída da Grã-Bretanha afetará as cadeias de suprimentos, o comércio, os transportes e o pessoal.

 

Os bancos transferiram equipes da Grã-Bretanha, e companhias como a Airbus estão aumentando os estoques para evitar falta de produtos.

 

Mas os países que comercializam com a segunda maior economia da Europa enfrentarão um desafio: administrar o fluxo constante de TVs, peças automotivas, medicamentos e outros produtos que cruzam suas fronteiras indo e voltando da Grã-Bretanha.

 

O processo instaurou um certo tumulto porque os partidários mais ferrenhos de um rompimento nítido da União Europeia se revoltam contra o plano de May de implementar o chamado Brexit brando. No dia 17 de julho, ela evitou por pouco uma derrota no Parlamento de seu projeto para este Brexit, o que pôs em duvida a possibilidade de negociar um acordo aceitável para seu governo, e muito menos com a União Europeia, antes de a Grã-Bretanha se retirar do bloco no dia 19 de março.

 

Na Holanda, um dos principais parceiros comerciais europeus da Grã-Bretanha, estão sendo contratados mil funcionários da alfândega em Roterdã, o maior porto da Europa, bem como nos aeroportos, em vista do aumento da burocracia na implementação do Brexit.

 

O chamado Brexit duro exigirá novos e rigorosos controles aduaneiros e um emaranhado de tarifas para cada barra de chocolate, peças de computador ou de automóvel que passarem pelo porto de Roterdã. O governo holandês também está contratando 90 veterinários para as inspeções de animais e de produtos alimentícios. Novos agentes necessitarão de uniformes e outros equipamentos. Além disso, serão necessários galpões para os produtos destinados às inspeções, o que representará um aumento de gastos de 35 milhões de euros, ou US$ 40 milhões.

 

Na Bélgica, o governo está contratando mais agentes para o porto de Antuérpia, e avaliando a necessidade de scanners, cães farejadores, armas e drones para intensificar a vigilância.

 

O primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar, ordenou ao governo que intensifique os preparativos nos portos e aeroportos do país. O que inclui mais mil agentes da alfândega e postos de inspeção para os cavalos de corrida que viajam para competir na Grã-Bretanha.

 

Ao mesmo tempo, a Irlanda avalia também se trará de volta parte dos seus estoques de petróleo de emergência, costumeiramente armazenados nas refinarias britânicas ou se os enviará para outros países da União, informou o jornal “Sunday Independent”.

 

O Brexit poderá provocar a paralisia do trânsito no cruzamento do Túnel do Canal entre França e Grã-Bretanha. Na cidade francesa de Calais, o vice-prefeito, Philippe Mignonet, alertou que o Brexit poderá produzir engarrafamentos de trânsito e aumentar o risco de os migrantes tentarem entrar no país introduzindo-se no meio da carga que aguarda para a travessia.

 

A França está acelerando a contratação de 700 funcionários da aduana antes do Brexit. “Quanto mais pensamos que o pior deveria ser evitado, mais achamos que não será impossível que isso possa acontecer”, disse o primeiro-ministro Édouard Philippe. Do lado britânico, o governo estudou a possibilidade de converter parte da rodovia M20 no Kent, que vai à cidade costeira de Dover, em um enorme estacionamento para caminhões. Como a Grã-Bretanha deixará de pertencer à união aduaneira, novas demoras no processamento da chegada dos caminhões poderão causar filas de veículos de até 30 quilômetros, segundo as autoridades.

 

A gigante aeroespacial europeia Airbus emprega mais de 14 mil pessoas na Grã-Bretanha na fabricação das enormes asas de seus aviões. Algumas peças vão e vêm entre a Grã-Bretanha e a União Europeia antes da montagem final. Por isso, qualquer contratempo poderia criar o caos na produção. Tom Enders, diretor-executivo da companhia, que ameaçou em junho deixar a Grã-Bretanha se não houvesse mais clareza no Brexit, disse que o Plano B da Airbus prevê a criação de estoques de material para poder continuar fabricando depois do Brexit.

 

O espaço nos armazéns da Grã-Bretanha está se enchendo a um ritmo recorde porque as companhias estocam suas mercadorias a fim de atender à demanda no caso de não poderem receber os suprimentos com rapidez, informou a KPMG, empresa de serviços profissionais.

 

O Departamento de Saúde pretende garantir a continuidade do fornecimento de remédios, vacinas, radioisótopos e equipamentos médicos.

 

“Ninguém está sugerindo que a situação em que nos encontramos seja desejável”, comentou Simon Stevens, diretor-executivo do Serviço Nacional de Saúde da Grã-Bretanha. (O Estado de S. Paulo/The New York Times/Liz Alderman)