Indústria Portugal vai começar a fabricar camiões elétricos em 2019

Diário de Notícias de Portugal

 

Há 55 anos que se produz caminhões no Tramagal. E a partir de 2019 esta unidade da Mitsubishi torna-se mais silenciosa, graças à produção em série dos primeiros camiões totalmente elétricos, com uma linha de montagem própria.

 

Desde 1964 que o Tramagal é conhecido pela sua fábrica de pesados. Os camiões que transportaram os militares portugueses em Angola, Moçambique e Guiné na Guerra Colonial saíram destas linhas de montagem. A inauguração, na altura, teve honras de Estado – Jorge Rosa, o presidente da Mitsubishi Fuso, lembra-se ainda de ver o Presidente da República Américo Thomaz a cortar a fita. Cinquenta e cinco anos depois, o barulho do motor a gasóleo foi trocado pelo silêncio das baterias.

 

É a partir de Portugal que vão sair os primeiros camiões totalmente elétricos do mundo. A produção em série dos eCanter vai começar no final de 2019 na fábrica da Mitsubishi Fuso, no Tramagal. Este veículo vai servir, sobretudo o mercado europeu, que procura cada vez mais estes pesados por causa das normas anti poluição nas cidades. Antes disso, a empresa vai reforçar, em setembro, a produção dos Canter híbridos e a gasóleo e contratar mais 40 pessoas para a linha de montagem. Passará a dar emprego a mais de 500 operários.

 

“A partir de setembro vamos admitir mais 40 pessoas para a produção, porque a procura o exige”, adianta o próprio Jorge Rosa, o líder da fábrica, em entrevista ao Dinheiro Vivo. A unidade do concelho de Abrantes também vai passar a montar mais camiões por dia: 54, em vez dos atuais 46.

 

O reforço de produção irá levar a Mitsubishi Fuso a produzir dez mil camiões neste ano, aproximando-se do recorde das 11 714 unidades fabricadas em 2000. E a faturação deverá aproximar-se dos 250 milhões de euros, o que compara com os 230 milhões de receitas do ano passado.

 

Mais de 90% dos camiões vão para o estrangeiro. Além de 30 países europeus, os Canter chegam a países como Marrocos e Turquia. Há ainda uma versão especial para os EUA, que apenas se distingue pelas luzes amarelas na parte superior da cabina e pela falta de motor.

 

Dentro da fábrica, no entanto, os camiões seguem a mesma linha de montagem, desde a construção do chassis aos acabamentos. Há muitas peças suspensas a circular dentro de calhas e muitas máquinas. Mas os operários ainda têm um papel fundamental na hora de montar estes veículos. “A produção de dez mil unidades por ano não exige a automação necessária noutro tipo de fábricas.” E também permite criar várias versões da Canter, conforme o tipo de cabina, o peso e a distância entre eixos.

 

A produção de camiões é um hábito neste espaço mas já levou vá- voltas. A fábrica do Tramagal foi criada graças a uma parceria entre a metalúrgica local Duarte Ferreira e os franceses da Berliet (atual Renault Trucks). Depois da guerra, continuaram a sair camiões para consumo doméstico.

 

Só que a produção era escassa e foi preciso entrar capital estrangeiro: a Mitsubishi comprou a fábrica, em 1980, para produzir os camiões Canter e Fuso e os jipes L200, L300 e Pajero para consumo doméstico. A exportação chegou em 1996, com a unidade do Tramagal a concentrar a montagem dos Canter. Desde 2005 que a empresa é controlada pela Daimler, a dona da Mercedes-Benz.

 

A fábrica tem sobrevivido a todas as mudanças e aos difíceis acessos. Os camiões, que ocupam dois andares, têm de seguir por caminhos apertados e são obrigados a dar grandes voltas todos os dias.

 

“As transportadoras queixam-se muito das condições que têm até chegar cá. É um grande desafio”, assume Jorge Rosa.

 

Vários governos já anunciaram soluções. “Há quase 30 anos falou-se numa ponte sobre o Tejo junto à autoestrada. Em 2008, José Sócrates esteve cá para anunciar a sua construção.” Mas nada saiu do papel até hoje. E não há solução pela linha do comboio, mesmo com a estação junto à fábrica. “Isso só iria minimizar a situação, porque estamos a falar de veículos pesados. Uma estrada em condições é fundamental.”

 

Futuro sem emissões

 

A Mitsubishi Fuso também segue outro modelo de produção, diferente de fábricas de carros ligeiros: o chassi e a cabine são duas peças separadas que apenas são unidas na fase final. Nesta fase, para já, só são colocadas as Canter a gasóleo e híbridas.

 

Os camiões elétricos são feitos apenas em séries especiais, de 50 ou 100 unidades, “para atender a solicitações muito fortes de alguns municípios e cidades, que fazem questão de ter este veículo, mesmo que ainda não esteja na fase final”.

 

Os primeiros veículos foram entregues este mês em Lisboa, em conjunto com as cidades de Amsterdã, Berlim, Londres, Nova Iorque e Tóquio. Os volumes só não são maiores porque a fábrica do Tramagal está a “resistir à pressão de fazer mais carros. Não faz sentido injetar versões intermédias no mercado, porque não é economicamente muito viável”. Com a produção em série já no próximo ano, antecipam-se grandes transformações: a unidade vai ter uma linha de montagem para camiões elétricos e outra para os pesados a gasóleo. “Resta saber a que velocidade a transição será feita.”

 

A fábrica anda ocupada com um outro projeto que poderá representar até 30% da produção nos próximos meses. Há um camião Canter para os EUA que sai do Tramagal sem motor, a gasolina, que apenas é instalado assim que chega ao distribuidor norte-americano. Por causa disso, não é contabilizado nas vendas da ACAP – Associação Automóvel de Portugal. É com este tipo de projetos que Jorge Rosa quer manter a unidade da Mitsubishi Fuso na “linha avançada” da divisão de camiões da Daimler. A fábrica poderia produzir por ano 30 mil unidades em dois turnos: “Procuramos constantemente volume para preencher a capacidade. Estamos sempre atentos aos projetos no grupo”. (Diário de Notícias de Portugal/Diogo Ferreira Nunes)