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Os prejuízos da greve dos caminhoneiros escancararam a dependência do Brasil dos combustíveis fósseis, especialmente o diesel. Porém, montadoras já trabalham para viabilizar, no médio e longo prazo no País, alternativas para veículos pesados, de elétricos a biocombustíveis, incluindo biometano, produzido à base de qualquer matéria orgânica.
A Scania vem desenvolvendo há três anos o motor a biometano, que pode ser produzido com qualquer matéria-prima orgânica fermentada – degradação anaeróbica. De acordo com o diretor de vendas de veículos da montadora no Brasil, Silvio Munhoz, a operação teria um custo relativamente baixo. “O processo de captação do gás é simplificado e como a matéria-prima é abundante, o custo do processo é baixo em comparação com um polo petroquímico, por exemplo”, explica.
A montadora está testando, no Brasil, ônibus movidos a biometano e Gás Natural Veicular (GNV) – ou a mistura de ambos. “Não são necessárias alterações significativas nos projetos das carrocerias”, garante Munhoz. Conforme o executivo, é necessária apenas a instalação dos cilindros de gás, que no caso dos veículos com piso normal são colocados nos espaços disponíveis entre as longarinas do chassi (abaixo do assoalho) e em opções com entrada baixa, a implantação é sobre o teto.
A grande vantagem, salienta Munhoz, é a disponibilidade do biometano. “Como a oferta de matéria-prima é muito vasta e o custo de operação é reduzido, a produção pode ser feita principalmente por pequenas e médias empresas, de maneira bastante pulverizada”, destaca. A alternativa ocorre em um momento que o Brasil discute formas de reduzir o preço dos combustíveis no mercado local, hoje fortemente concentrado nas mãos da Petrobras.
Porém, Munhoz alerta para o desafio da logística. “É preciso resolver como esses produtores poderão ter acesso para injetar o biometano na rede de gás”, esclarece o executivo.
A Scania informa que, hoje, o ônibus a biometano da marca está em testes em Campinas (SP). “O cliente está muito satisfeito”, garante. Posteriormente, o veículo seguirá para Florianópolis (SC) e outras cidades serão agendadas. “A procura é muito grande”, assegura.
O executivo pondera que tanto ônibus quanto caminhões podem utilizar a tecnologia do biometano. Porém, no caso do transporte urbano de passageiros, exigências de redução das emissões facilitam a adoção de alternativas mais sustentáveis que o diesel. “Os caminhões fazem parte de um sistema privado, por esse motivo temos que convencer o transportador dos benefícios do motor a biometano”, explica Munhoz. A Scania estima que o custo por quilômetro rodado com o combustível é cerca de 28% menor que o do diesel. “Esse é um bom argumento para a adoção do modelo”, reforça.
O diretor de vendas e marketing ônibus da Mercedes-Benz do Brasil, Walter Barbosa, acredita que o biocombustível de 2ª geração – obtido por meio de quebra da celulose – pode ser uma grande alternativa ao diesel. “Devido à abundância de matéria-prima no Brasil, já que a origem desse combustível pode ser vegetal ou animal, o potencial de sucesso dessa alternativa é enorme”, conta o executivo.
Ele pondera ainda que o biocombustível, na forma líquida, pode ser usado em todos os tipos de motores, desde o Euro 0 (primeira geração) até o Euro 5, vigente hoje no Brasil, inclusive em caminhões. “Mas o País precisa investir em escala para que o biocombustível se torne atrativo.”
A Mercedes afirma investir altas cifras em pesquisa e desenvolvimento do diesel proveniente da cana-de-açúcar (1ª geração) e biocombustível (2ª geração). “O Brasil não pode fixar uma rota e seguir somente por ela, se não ficaremos tão dependentes como do diesel convencional.”
Barbosa ressalta que, para reduzir a dependência do setor automotivo dos combustíveis fósseis, é preciso começar a estruturar o mercado para receber novos veículos. “Todas as nossas tecnologias alternativas já estão sendo testadas”, argumenta.
Elétricos emissões
Apesar dos investimentos em novos projetos de veículos elétricos ao redor do mundo, o ônibus movido a eletricidade já é uma realidade antiga no Brasil. Os chamados trólebus circulam na capital paulista desde 1949, em um sistema que o veículo é conectado a cabos de energia nos postes da cidade. “Cerca de 90% da frota de trólebus de São Paulo é da Mercedes”, relata o diretor da montadora.
Diversas marcas estão apostando na tendência. “A Scania trabalha com todas as alternativas, passando por híbridos, elétricos, entre outros”, conta Munhoz. Barbosa, da Mercedes, assinala que no longo prazo, a introdução de veículos elétricos será primordial em todos os mercados, inclusive no Brasil. “Já estamos trabalhando no segmento e temos muito know-how”, pondera.
Outra montadora que está investindo para introduzir o caminhão elétrico no Brasil é a MAN Latin America, fabricante dos veículos pesados Volkswagen. Em outubro do ano passado, a montadora apresentou detalhes do e-delivery, veículo leve destinado à distribuição nos grandes centros. O modelo é 100% elétrico e possui 200 quilômetros de autonomia.
O projeto piloto foi implementado em parceria com a Ambev e a perspectiva da MAN é começar a produzir o e-delivery, em série, na planta de Resende (RJ), a partir de meados de 2020. Em entrevista recente ao DCI, executivos afirmaram que a ideia é oferecer o caminhão elétrico em toda a linha urbana, que vai de 3,5 toneladas até 13 toneladas. “O investimento do cliente precisa se pagar, por isso estamos buscando desenvolver o projeto da maneira mais eficiente possível”, disse o vice-presidente de vendas da MAN, Ricardo Alouche.
Além da redução da dependência de combustíveis fósseis, a adoção de alternativas ao diesel traria uma diminuição importante das emissões. De acordo com a Scania, em comparação com um veículo similar a diesel, o ônibus a gás emite 85% menos gases se abastecido com biometano e 70% menos se estiver com GNV. “Adicionalmente, os modelos garantem importante redução de emissões de CO2 e poluição sonora”, diz Munhoz.
Para Barbosa, da Mercedes, o diesel continua sendo uma boa opção para veículos pesados. “Este combustível passou por um processo importante de evolução e a versão atual é muito menos poluente”, destaca. “Mas temos que olhar para soluções alternativas”, complementa o executivo. (DCI/Juliana Estigarríbia)