O Estado de S. Paulo/The New York Times
A Tesla, do empreendedor Elon Musk, já almejou reinventar o automóvel e a forma como a eletricidade é gerada para o consumo residencial. O fato de ainda não terem completado essas missões, no entanto, não impediu que a empresa se lançasse em outra jornada: recriar a multibilionária indústria dos caminhões.
Em uma apresentação noturna elaborada apresentada por Musk, presidente executivo da Tesla, a empresa revelou um protótipo para um caminhão semiautônomo, capaz de se dirigir sozinho em parte das longas viagens pelas estradas norte-americanas, e cujo sistema funciona a partir da energia elétrica.
Segundo a empresa, o veículo, chamado de Tesla Semi, pode ser mais eficiente e barato de ser operado que os caminhões a diesel que entregam produtos por todo os Estados Unidos, sem emitir poluentes. O Tesla Semi tem autonomia de cerca de 800 km, e pode ir de 0 a 100 km/h em vinte segundos, quando estiver transportando uma carga máxima de 36,7 toneladas – menos de um terço do tempo necessário para que um caminhão com motor a diesel faça o mesmo.
Para analistas, a autonomia de 800 km é uma marca difícil de ser atingida: o banco de investimentos Bernstein estimou que o Semi seria capaz de viajar no máximo 750 km antes de precisar de uma recarga. “É uma limitação significativa”, disse o banco em um relatório recente.
Roadster
O caminhão já havia sido antecipado pelo próprio Musk semanas antes do evento. Isso não fez a noite da quinta-feira passar sem surpresas: a Tesla também revelou o Roadster, um superesportivo que pode ir de 0 a 100 km/h em apenas 1,9 segundos, e viajar mais de 1 mil quilômetros sem precisar recarregar.
Vestindo uma jaqueta verde e jeans, Musk garantiu que o Roadster pode alcançar até 417 km/h. “Estamos fazendo isso para mostrar nosso poder contra os carros de gasolina”, disse Musk. “Com o Roadster, você será capaz de dirigir de Los Angeles a São Francisco e voltar” – a distância entre as duas principais cidades da Califórnia é de cerca de 600 km.
Compensação
Por enquanto, o Tesla Semi não tem preço, mas deve custar caro. “Os produtos da Tesla são caros”, disse Musk, no evento realizado em um campo aéreo, na zona metropolitana de Los Angeles. A expectativa é de que o veículo seja lançado em 2019.
O valor do produto, porém, será compensado ao longo do tempo: o Semi, promete a Tesla, será mais barato de se operar que um caminhão tradicional, porque tem menos componentes que exigem manutenção regular. No lugar de um motor, o veículo tem uma bateria gigante debaixo do capô, e dois motores elétricos em cada eixo – um para cada roda.
A estimativa de Musk é que o Semi consiga percorrer uma milha (1,67 km) com US$ 1,26, contra US$ 1,51 de um caminhão a diesel. O custo pode cair ainda mais – para US$ 0,85 por milha –, caso os caminhões andem em comboio, reduzindo perdas com aerodinâmica. “É um custo que bate as ferrovias”, disse Musk.
Além da Tesla, Musk tem uma companhia de foguetes, a Space X, e uma nova empreitada, a Boring Company, que quer fazer túneis para veículos futuristas capazes de levar pessoas em velocidades superiores a 1 mil km/h.
Design
Como em quase todo produto da Tesla, o caminhão tem um design bem diferente dos produtos tradicionais da indústria automotiva: a cabine é espaçosa para o motorista e um passageiro, e o assento do motorista fica no centro da cabine, e não do lado esquerdo. Além disso, o painel tem duas telas do tamanho de um laptop, com dados de navegação, bem como imagens de pontos cegos ao redor do caminhão.
O veículo terá sensores, câmeras e processadores que permitirão aos motoristas usar o Autopilot, recurso de pilotagem autônoma que é um prenúncio dos carros sem motorista, já presente nos veículos da Tesla, como o Model S e o novo sedã Model 3.
O Autopilot pode, sozinho, acelerar, frear e dar passagem para outros veículos, embora os motoristas devam manter seus olhos atentos na estrada e as mãos no volante enquanto usam a função.
“Acredito que o caminhão elétrico e autônomo é uma promessa promissora”, disse Michelle Krebs, analista da consultoria Autotrader.com. “Uma das minhas preocupações é que a Tesla está tentando fazer muitas coisas ao mesmo tempo. Eles não podem prometer mundos e fundos e fazer uma entrega abaixo do esperado.”
Competidores já começaram a testar caminhões elétricos e com direção autônoma. No mês passado, a Daimler mostrou um trator elétrico, enquanto a Embark, uma startup do Vale do Silício, disse nessa semana que pretende entregar um estoque de geladeiras percorrendo um percurso de 650 quilômetros na Califórnia.
Para Krebs, a competição no mercado de caminhões será mais feroz que em outros mercados que a Tesla já disputou, devido à falta de experiência da empresa e à base de usuários que rivais, como a Daimler, já têm.
“A questão mais crítica com os caminhões é que eles são uma ferramenta de trabalho”, disse. “Eles têm de funcionar todo o tempo, ao contrário de um carro esportivo, que pode ficar na garagem se está em manutenção.”
Além da Tesla, Musk tem uma companhia de foguetes, a Space X, e uma nova empreitada, a Boring Company, que quer fazer túneis para veículos futuristas capazes de levar pessoas em velocidades superiores a 1 mil km/h.
Dificuldades
A Tesla está tomando para si o desafio de produzir caminhões elétricos, ao mesmo tempo em que luta com uma série de problemas no seu negócio de carros. Em julho, a empresa começou a produção do Model 3, seu sedã “popular”, com a promessa de que o veículo popularizaria os carros elétricos. No entanto, apesar da meta de Musk de produzir 20 mil veículos por mês em dezembro, a Tesla só foi capaz de montar 260 no final do mês de setembro.
Para piorar, no mês passado a empresa demitiu centenas de funcionários por performance “abaixo dos padrões”, levantando a preocupação entre os acionistas da Tesla se Musk teria a capacidade de conseguir fechar seus objetivos de fabricação.
Vendido a US$ 35 mil, o Model 3 é a promessa de ser o carro mais vendido da Tesla. Os outros carros, vendidos acima de US$ 70 mil, são o Model S, um sedã de luxo, e o Model X, um esportivo utilitário. No ano passado, a Tesla fabricou 85 mil carros. Este ano, a empresa deve fazer cerca de 100 mil.
Por conta do preço mais baixo, o Model 3 deve interessar a mais consumidores – e a expectativa de Musk é levar as vendas da empresa para 500 mil unidades no ano que vem. Por enquanto, a empresa tem atribuído a lentidão no ritmo de produção do Model 3 a dificuldades na produção de baterias em sua fábrica de Nevada, a Gigafactory. (O Estado de S. Paulo/The New York Times/Neal E. Boudette, tradução de Bruno Capelas)