Jornal do Carro
Se o sonho de adquirir um carro novo move multidões – mesmo que a compra de um seminovo possa ser mais vantajosa financeiramente –, boa parte do poder de sedução dessa ideia vem daquele irresistível cheirinho que o cliente sente ao entrar na cabine do veículo, antes mesmo de fechar negócio.
E a importância desse detalhe não passa despercebida pelas montadoras. “Como o consumidor fica muito tempo dentro do carro, o cheiro e as outras experiências sensoriais têm grande influência na decisão de compra”, explica o supervisor do centro tecnológico de materiais da Volkswagen, Michael Matz.
Ao contrário do que muitos pensam, porém, as fabricantes em geral não desenvolvem um aroma específico para seus modelos. O que se sente é a combinação dos odores de diversos componentes da cabine: o couro ou tecido dos bancos, o plástico do painel e console, as forrações das portas e do teto, a borracha dos tapetes.
Assim, o que as marcas fazem é buscar, junto com seus fornecedores, que tais peças componham um cheiro ao mesmo tempo neutro e agradável. Os materiais são testados individualmente por profissionais dedicados a essa tarefa – se uma matéria-prima libera um cheiro forte ou pouco harmonioso, é descartada.
Há diversas variáveis que interferem no aroma resultante. Fatores climáticos, como temperatura, umidade e exposição ao sol, são importantes, assim como a forma de utilização do carro.
“Os ocupantes podem deixar as janelas abertas ou fechadas e trazer outros cheiros para a cabine: perfumes, alimentos, fumo”, diz o supervisor sênior de produtos da Hyundai, Flávio Cuarelli. “Tudo isso influi na durabilidade do cheiro.”
Identidade olfativa
Alguns aficionados sabem identificar a fabricante do carro pelo odor da cabine. “O cheiro ajuda o cliente a estabelecer uma relação de familiaridade com a marca, criando uma memória de conforto e bem-estar”, diz o gerente de materiais da Citroën, Fabien Darche.
A explicação para isso é simples: a montadora usa peças de acabamento dos mesmos fornecedores em diferentes modelos, o que faz com que eles tenham cheiros parecidos.
Algumas marcas, porém, se esforçam para desenvolver aromas que as identifiquem, como uma “assinatura olfativa”. A Citroën já criou fragrâncias para alguns produtos, como o C4 Pallas. Atualmente, os modelos da DS, divisão de luxo da marca francesa, também têm um perfume que é reaplicado na cabine a cada revisão.
Essa prática traz uma vantagem: recriar a sensação olfativa que o cliente sentiu ao receber o carro pela primeira vez. Enquanto isso, em outras marcas, depois que os odores exalados pelas peças enfraquecem, o tão desejado cheirinho de carro novo se perde para sempre.
Marcas têm profissionais dedicados
Para garantir que os carros tenham um cheiro agradável, as montadoras mantêm equipes dedicadas exclusivamente a avaliar amostras de peças da cabine, por meio de análises químicas e, sobretudo, usando o próprio olfato.
Esses profissionais de faro aguçado precisam cumprir uma série de requisitos. Eles não podem ser fumantes, ter alergias nem sinusite. Antes dos ensaios, nada de consumir pratos muito aromáticos.
Além disso, é vetado o uso de perfumes, xampus fortes, esmalte para unhas e até roupas de couro – tudo isso pode interferir nas avaliações olfativas.
A VW mantém um Centro Tecnológico de Materiais no Brasil, com engenheiros e analistas de laboratório que são treinados na Alemanha, para que seus critérios de avaliação de odores se harmonizem com o padrão mundial da marca.
Na Nissan, os especialistas seguem as especificações definidas pela Associação de Fabricantes de Automóveis do Japão.
Já a Ford tem laboratórios de odores em vários continentes, já que a forma como as pessoas sentem as fragrâncias variam com a genética, a cultura e os costumes locais – o cheiro de couro não é apreciado pelos orientais, por exemplo. (Jornal do Carro)