O Estado de S. Paulo
A fabricante de caminhões e ônibus Volvo, com fábrica em Curitiba (PR), apresentou ontem um caminhão autônomo desenvolvido no País, com ajuda da matriz sueca, especialmente para uso na colheita de cana-de-açúcar. O sistema de automação foi aplicado em um veículo à venda no mercado brasileiro, o semipesado VM, já equipado com vários itens tecnológicos. A empresa estima que a produção comercial se tornará viável em até três anos.
O VM Autônomo utiliza sistemas similares aos adotados nos veículos que a Volvo testa desde o ano passado em minas de carvão na Suécia e, mais recentemente, na coleta de lixo. Os níveis de autonomia é que variam, informa o diretor global de automação da Volvo sueca, Hayden Wokil. O caminhão brasileiro precisa de um motorista para levá-lo até a área de plantio onde recebe a cana cortada por colheitadeiras. Uma vez na linha do plantio, o serviço é feito sem interferência humana.
A vantagem, explica o presidente da Volvo América Latina, Wilson Lirmann, é a redução das perdas no processo, que podem chegar a 20% da colheita. Segundo ele, o projeto teve início justamente quando um grande cliente da montadora, a usina Santa Terezinha, terceira maior exportadora de açúcar do Brasil, procurou a empresa para estudar alternativas para reduzir esse tipo de prejuízo.
As 10 unidades do grupo, todas no Paraná, processam 18 milhões de toneladas de cana-de-açúcar por ano. “A cada cinco anos, perdemos em média uma colheita quando operamos com veículos sem nenhuma automação”, disse Paulo Meneguetti, diretor presidente do grupo Santa Terezinha, também conhecido como Usaçúcar.
A principal perda ocorre quando o caminhão que recolhe a cana retirada pela colheitadeira passa por cima das mudas da safra seguinte. Outro problema é que o solo pisoteado fica cada vez mais compactado, o que reduz sua produtividade.
O caminhão autônomo consegue seguir o traçado sem pisotear a área plantada, em velocidade constante, de dia e de noite.
O veículo vem sendo testado há dois anos e tem duas antenas de GPS e sensores em diferentes partes. O sistema adotado é o de RTK, que faz a correção de posicionamento em tempo real. Por operar em área restrita, o veículo dispensa sensores de detecção de pessoas e objetos.
Tendo como base a Santa Terezinha, se toda a sua frota de 400 caminhões usados na colheita (ou transbordo) fosse de autônomos, a economia anual seria de cerca de R$ 50 milhões, calcula Bernardo Fedalto, diretor comercial da Volvo.
Segundo Lirmann, o consumidor poderá adquirir um ‘kit’ para adaptar os caminhões VM para a automação básica. O veículo normal usado nessa operação custa cerca de R$ 250 mil. O preço na versão autônoma não está definido. “O que posso adiantar é que o sistema (sem incluir o veículo) vai se pagar com um pouco mais de uma safra.”
Legislação
Como o VM será usado apenas em área restrita, não há necessidade de legislação, como ocorre em caso de uso em ruas e estradas públicas. Ele recebe a cana cortada e a transfere para os caminhões de grande porte que fazem o transporte externo até a usina de processamento.
Wokil diz que, globalmente, as empresas atuam junto aos governos para que haja uma legislação única para que, no futuro, veículos autônomos possam trafegar em todos os países com as mesmas especificações.
Segundo Lirmann, antes de iniciar a venda do autônomo, a Volvo vai lançar neste ano um sistema de assistência que informa as coordenadas para que o condutor se mantenha no trajeto onde não há plantação. O investimento nesse sistema, assim como no VM Autônomo, está inserido no plano de R$ 1 bilhão que o grupo vai aplicar na América Latina entre 2017 e 2019. Também está integrado ao plano global de desenvolvimento de novas tecnologias da matriz.
Meneguetti, do Santa Terezinha, diz que pretende adquirir veículos autônomos na medida em que precisar renovar sua frota, mas ressalta que dependerá também da disponibilidade de linhas financiamento. “Hoje, por exemplo, os bancos estão restritivos e não há crédito viável”. O grupo emprega 17,5 mil funcionários. A usina produz açúcar apenas para exportação e, em 2016, registrou aumento de 25,6% nas vendas externas.
Outras fabricantes de caminhões, como Mercedes-Benz, MAN e Scania, também estão testando caminhões autônomos, mas fora do País. (O Estado de S. Paulo/Cleide Silva)