O Estado de S. Paulo
A fabricante de componentes elétricos Steck agora só exporta para ajudar a movimentar a fábrica. “Vou ter margem de lucro zero, mas ajuda a manter a carga e deixar o custo de produção mais baixo. Quem exporta hoje, faz isso por esporte. A gente até conseguiria se adaptar ao dólar mais baixo, mas ainda tem de se planejar com toda essa volatilidade”, diz Luis Valente, presidente da empresa.
Vistas como uma alternativa para ocupar parte da capacidade ociosa da indústria de transformação e repor as perdas de um mercado interno que ainda patina, as vendas ao exterior devem contribuir menos para as receitas do setor neste ano. Parte dos fabricantes diz já vender ao exterior com prejuízo.
Como não podem contar com o consumo interno, muito reprimido, eles também insistem em exportar para cumprir os contratos que fizeram no ano passado ou manter as marcas nos mercados estrangeiros, mais fechados e concorridos.
Em um ano, a moeda americana acumula uma desvalorização de mais de 18%.
Entidades representativas de dez segmentos da indústria ouvidas pelo Estado avaliam que a moeda americana deveria estar entre R$ 3,40 e R$ 3,80.
“É fato que a indústria hoje exporta para não ficar parada. No cenário atual, o fabricante olha para o mercado interno, ainda em frangalhos, e vê a janela para exportar estreita. Os custos de produção de manufaturados no País fazem com que o Brasil fique ainda menos competitivo”, avalia o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Casto. “Estamos acelerando a desindustrialização.”
Horizonte volátil
Com o câmbio apreciado, as empresas quebram de vez outra vez, diz o ex-ministro da Fazenda Luis Carlos Bresser Pereira. “O que permitiria a retomada da indústria seria o dólar a R$ 3,80 ou a R$ 4.”
Na visão de Bresser, o Banco Central precisa intervir para apreciar o câmbio. “Mas não é só intervir. Quais foram as políticas contracíclicas que este governo tomou? Não conheço nenhuma. Só se eu chamar de contracíclica afinal o Banco Central, depois de um imenso atraso, começar a baixar juros. Fora esses juros absolutamente escandalosos, não vimos nada”.
A calçadista West Coast teve de desativar uma de suas fábricas para compensar o freio da economia. “Agora, nossa meta é usar toda a capacidade instalada das cinco plantas em operação e contamos com as exportações para ajudar. Vamos conseguir exportar com certa margem pelos próximos meses, mas quando chegar o segundo semestre, não sei”, diz Eduardo Schefer, sócio da empresa.
“Quando o dólar deu aquele pico de R$ 4,15, a indústria de tratores voltou a ser competitiva lá fora. O problema é a incerteza. Mesmo que você já seja conhecido, leva um tempo para se consolidar no exterior”, diz Edson Martins, da Agrale.
A gerente de mercado externo da Abimaq (das fabricantes de máquinas e equipamentos), Patrícia Gomes, lembra que, quando o dólar estava baixo antes da crise, as empresas insistiam em vender para o exterior, mesmo sem lucro. “Usavam o bom momento do mercado interno para investir na abertura de praças para vender seus produtos. Esse movimento, agora, tornou-se inviável.”
“Grande parte da desaceleração econômica após 2011 se deu pela estagnação industrial. Se 2015 teve algo positivo foi o ajuste do câmbio, mas estamos perdendo isso”, analisa José Luis Oreiro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “O Banco Central deveria agir mais para reverter isso. A recuperação virá pela indústria”. (O Estado de S. Paulo/Douglas Gavras e Márcia de Chiara)