Bancos de montadoras devem ter destaque na retomada do mercado

DCI

 

A indústria automotiva continua registrando quedas acima do esperado. Para atravessar o profundo período de crise, a estratégia adotada por algumas montadoras tem sido apostar em campanhas agressivas de vendas através de seus braços financeiros.

 

“O ponto de inflexão das vendas do setor dificilmente virá dos bancos comerciais, que devem demorar pelo menos dois anos para flexibilizar a concessão de crédito”, explica o analista automotivo da Tendências Consultoria, João Morais.

 

O financiamento é responsável por quase 80% das vendas do setor automotivo no Brasil e, portanto, a concessão de crédito é um dos pontos cruciais para alavancar este mercado.

 

Morais destaca, entretanto, que no curto prazo a atuação dos bancos de montadoras deve surtir pouco efeito nos emplacamentos. “Existe intenção de compra, mas o consumidor continuará postergando a aquisição do bem diante do cenário negativo”, acrescenta o analista.

 

O diretor da Route Consultoria Automotiva, Wladimir Molinari, afirma que o volume de negócios dos bancos de montadoras vem caindo, após ter registrado crescimento importante em meio ao aperto do crédito por parte dos bancos comerciais.

 

“O desempenho do braço financeiro das montadoras caiu muito porque a crise atingiu o mercado como um todo”, pondera Molinari.

 

Contudo, ele observa que estas instituições vêm investindo em novos produtos para atrair o consumidor e ampliar a sua visibilidade, que ainda hoje é baixa no mercado brasileiro. “Os bancos de montadora estão tentando diversificar as linhas”, diz.

 

Mesmo diante da queda expressiva no mercado local, o que reduziu drasticamente a rentabilidade, montadoras vêm apostando em estratégias que, há alguns anos, raramente eram oferecidas.

 

A Volkswagen Financial Services, por exemplo, informa que, neste mês, irá oferecer condições de taxa zero (mediante entrada de 50% a 60%) e prazo de pagamento de 18 a 24 meses para alguns modelos, como Gol, Voyage e Saveiro.

 

Já a Renault oferece na campanha “Preço de fábrica e taxa zero” condições que variam entre 60% e 75% de entrada e parcelamentos de 24 a 36 meses. Entretanto, Molinari alerta que quase sempre a conhecida taxa zero não é totalmente livre de juros.

 

“Ainda assim, as condições são boas na comparação com bancos comerciais. Porém, as montadoras terão que ceder de alguma forma para ganhar a competição”, destaca diretor da Route Consultoria.

 

Ele ressalta ainda que os bancos de montadoras terão que fazer um forte trabalho na rede de concessionárias. “Os vendedores não têm vínculo algum com as marcas e, muitas vezes, recebem vantagens ao convencer o consumidor a contratar crédito de bancos comerciais”, revela.

 

Molinari elenca algumas vantagens dos braços financeiros das montadoras. “Além da associação direta à marca, os contratos têm menos burocracia”, pondera o executivo.

 

Viés de baixa

 

O analista da Tendências avalia que o desempenho do setor ficou muito abaixo do esperado em fevereiro. Conforme dados divulgados na sexta-feira (4) pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), os emplacamentos do período recuaram 21% na comparação anual, para 146,8 mil unidades, em leves e pesados.

 

“O resultado do mês fez com que colocássemos nossas projeções sob viés de baixa para o ano”, revela Morais. Segundo a consultoria, as vendas devem cair 17% em 2016. A previsão da Anfavea é de uma queda de 7,5% para o ano.

 

Apesar do aumento de 26,8% das exportações no primeiro bimestre, a produção de veículos continuou fortemente impactada, com retração de 31,6%, o pior resultado desde 2003. Com isso, a ociosidade nos dois primeiros meses do ano nas montadoras de veículos leves chegou a 62% e, em caminhões, 81%.

 

“A situação é dramática no setor e brutal para a saúde financeira de qualquer empresa”, declarou o presidente da Anfavea, Luiz Moan.

 

O dirigente credita boa parte da situação à crise de confiança. “O Brasil se encontra na atual situação porque as questões políticas estão contaminando a economia.”

 

Morais, da Tendências, acrescenta que o desemprego pode agravar ainda mais o quadro. “Os bancos já estão levando em consideração o desemprego, que deve atingir dois dígitos muito em breve.”

 

A Anfavea vem afirmando categoricamente que o setor iniciará um processo de retomada no quatro trimestre deste ano. No entanto, o cenário se mostra totalmente imprevisível. “Mesmo com todas as ações da indústria, devemos ter o quarto ano de forte recessão do setor”, prevê Morais. (DCI/Juliana Estigarríbia)