Sabia que existe a capital do ovo no Brasil? Ela fica em Bastos, pequena cidade do centro-oeste do estado de São Paulo, onde anualmente acontece a Festa do Ovo. José Belo da Silva não perde a festividade por nada, afinal é nessa época do ano, todo início de julho, que ele aproveita para rever a família, saber notícias dos velhos amigos e passear por alguns dos lugares que marcaram a sua história. Até seus 16 anos, Belo viveu de granja em granja, cuidando das poedeiras e da produção diária de ovos. Hoje, calcula-se, a cidade tem o maior plantel de galinhas de postura do país, como capacidade diária para 15 milhões de unidades.
Pena que trabalhar com ovos, ou com a cultura do bicho de seda, outra de suas paixões de garoto, jamais garantiriam um futuro com conforto e dignidade, com o qual sonhava o jovem José Belo. Foi preciso aceitar o convite do amigo Cícero Ferreira, estabelecido em uma indústria na cidade de Jundiaí, quase 600 quilômetros distante de Bastos, para tentar um caminho novo, mais próximo da capital, do cinturão industrial e dos planos de Belo. Corria o ano de 1977, quando ele desembarcou na cidade e hospedou-se numa pensão modesta. Ali viveu dias de lágrimas, medo e saudades. “Eu nunca tinha saído de casa, pensei em desistir, os primeiros dias foram muito difíceis”, confessa.
O que empurrou a depressão e o desânimo para bem longe foi a infinidade de anúncios de vagas de empregos afixados nas portas das empresas da cidade. “Você praticamente podia escolher onde queria trabalhar”, lembra Belo. Atendendo ao chamado de um desses anúncios, ele chegou à Sifco como ajudante de produção, no setor de acabamento. Na inspeção de peças percebeu que tinha talento para a coisa, era rápido em identificar os problemas e aprovar ou refugar um item, com precisão de um técnico experiente. Ainda assim, ele tinha consciência de que poderia fazer um trabalho ainda melhor se entendesse um pouco mais de desenho, estrutura e de mecânica. Foi aconselhado a investir em um curso de aperfeiçoamento.
Belo tinha sede de conhecimento, porém, o salário para se manter em Jundiaí e ainda ajudar a família era insuficiente para o seu desenvolvimento pessoal. Mas por sorte, tinha um chefe daqueles que transformam a vida de um funcionário para sempre. Ele praticamente pegou Belo pelas mãos e o levou até o Colégio Duque de Caxias, em Jundiaí, pagou a matrícula e a primeira mensalidade no curso de desenho técnico mecânico e avisou “agora é com você”.
Era o empurrão que faltava. Logo Belo já assumia o posto de inspetor de qualidade e nunca mais deixou de investir na própria capacitação. Algumas vezes teve que pagar do próprio bolso, mas a maioria dos cursos foi ofertada dentro da Sifco. Ele calcula que nos primeiros 10 anos de empresa tenha participado de uns 50 cursos técnicos em várias áreas: “Fazia todos que apareciam”.
Com a base de conhecimento enriquecida, virou expert em verificar engrenagens, bielas, pontas de eixo, braços oscilantes e em quase todos os componentes do undercar. Passou a atuar também no campo, atendendo aos chamados da assistência técnica e assim viajou por montadoras espalhadas por vários pontos do Brasil. Entre 1990 e 1994 ficou lotado em Santa Luzia, numa forjaria adquirida pela Sifco que abastecia a linha de automóveis Fiat.
Retornou para Jundiaí com mais uma promoção: auditor de qualidade. Todas as segundas, quartas e sextas fazia bate-e-volta até a fábrica da Fiat, em Betim, um período de muita correria, mas muito aprendizado. Ainda nos anos 1990, quando a Sifco foi vendida para o Grupo Brasil, veio a promoção como supervisor de produção e a responsabilidade de gerenciar uma equipe de 230 funcionários em três turnos de trabalho. Hoje ele sente saudades não só do dia a dia movimentado, mas principalmente do pessoal do “chão de fábrica”, como ele gosta de frisar. “Essas pessoas é que fizeram a diferença na minha vida. E eu tentei fazer de tudo por elas, busquei treinamento, ministrei cursos, fiz de tudo para que evoluíssem na sua caminhada. Esse foi o meu legado”, acredita.
Um dos seus maiores orgulhos de Belo é ver a família Silva chegar à terceira geração trabalhando na mesma fábrica que ele começou há quase 50 anos. O filho Robson, é engenheiro na produção e a neta Maiara já está há cinco anos na área de Qualidade da Dana.
Esta etapa de sua feliz jornada na empresa chegou ao fim em 2010, depois de 34 anos de trabalho em seu único emprego com registro em carteira. Apesar do vigor e vontade para ir além, preferiu se abrigar na aposentadoria para ajudar no tratamento de saúde da esposa, Elza.
Hoje o que ele mais gosta é organizar os passeios ao lado de Elza, que está completamente curada e foi desde sempre a maior motivação para sua carreira. Viajam de carro para todo lado e pelo menos três vezes por ano vão até Vitória da Conquista, na Bahia, visitar a filha mais nova, Erica que é jornalista e trabalha para a prefeitura da cidade. Quando estão em Jundiaí, as atenções do casal se voltam para a mais velha, Helena, e para a netinha Yasmin.
“Acho que a gente plantou bons frutos, né?”, pergunta ele, modesto, sempre substituindo o “eu” por “nós” e sempre acreditando que o mundo fica melhor quando cada um capricha em fazer a sua parte.