Europa se mexe para encarar veículos elétricos chineses

O Estado de S. Paulo

 

Os veículos elétricos baratos da China já estão chegando à Europa, e causam estragos em um dos maiores setores industriais da região. A BYD, que ultrapassou a Tesla no fim do ano passado na produção de veículos elétricos, está prestes a aumentar as suas apostas.

 

A fabricante chinesa anunciou no mês passado planos para trazer seu hatchback compacto Seagull (Dolphin Mini no Brasil) para a Europa no próximo ano. O carro oferece recursos premium, como uma tela de toque giratória e carregamento de telefone sem fio, e é vendido por menos de US$ 10 mil (cerca de R$ 53,5 mil) na China. Mesmo após tarifas e modificações para atender aos padrões europeus, os executivos da BYD esperam vender o Seagull por menos de ¤ 20 mil (R$ 115 mil) no continente.

 

Isso faria com que o preço do veículo de quatro lugares ficasse bem mais em conta do que o dos carros elétricos mais baratos oferecidos pelas fabricantes locais. A chegada iminente do veículo chinês aumenta a pressão sobre as montadoras europeias pelo domínio na era pós-motor a combustão. Além disso, é improvável que uma investigação por parte da União Europeia contra subsídios acabe com essa ameaça.

 

“Estamos observando atentamente esse modelo (o Seagull) e outros que vêm dos fabricantes chineses de veículos elétricos”, disse Martin Sander, chefe do negócio europeu de veículos elétricos da Ford.

 

Avaliação

 

O Seagull recebeu elogios pela qualidade de construção, pelo design e pela tecnologia que a BYD incluiu no preço. E ele não é único: a empresa planeja introduzir um carro elétrico que custa ¤ 25 mil (R$ 143 mil) ainda mais sofisticado antes dele, disse o diretor administrativo europeu da empresa, Michael Shu, em um evento do setor em Londres no mês passado. Os planos da BYD para duas fábricas na região a ajudarão a atenuar os efeitos de quaisquer tarifas da União Europeia destinadas a desacelerar seu avanço.

 

O modelo já está se saindo bem em outros países. No México, onde o carro foi batizado de Dolphin Mini, os motoristas têm se aglomerado em torno do carro de US$ 19,7 mil (R$ 103 mil) desde seu lançamento, em fevereiro, apesar da infraestrutura de recarga irregular no país.

 

A BYD está na vanguarda das montadoras chinesas, que estão cada vez mais voltadas para as exportações. O CEO da Tesla, Elon Musk, alertou em janeiro que elas “praticamente demolirão” a maioria das outras montadoras se não forem erguidas barreiras comerciais.

 

Embora o presidente americano Joe Biden tenha decidido quase quadruplicar as tarifas dos EUA sobre os veículos elétricos chineses, as tarifas são mais complicadas para a Europa.

 

As montadoras da região são mais dependentes do mercado chinês do que as empresas americanas; por isso, o receio de medidas retaliatórias de Pequim. O plano da Europa de eliminar gradualmente as vendas de carros com motor a combustão também exigirá veículos mais baratos para impulsionar a adoção dos elétricos no mercado de massa.

 

A UE começou a investigar o setor de veículos elétricos da China no ano passado, e está perto de uma decisão sobre o aumento das taxas, mas alguns executivos e especialistas do setor têm resistido. “As tarifas não devem ser usadas para proteger nossos principais fabricantes de uma concorrência significativa”, disse Julia Poliscanova, diretora sênior de veículos e cadeias de suprimentos de mobilidade elétrica do grupo de lobby Transport & Environment.

 

As montadoras europeias já estabelecidas estão considerando medidas pouco ortodoxas para enfrentar o desafio, incluindo novas alianças. A Renault procura abertamente parceiros para cortar custos em uma plataforma de carros pequenos, enquanto a Stellantis iniciará as vendas em setembro de carros fabricados por meio de sua joint venture com a Zhejiang Leapmotor Technologies, da China.

 

“Não temos intenção de deixar essa faixa de preço aberta para nossos concorrentes chineses”, disse o CEO da Stellantis, Carlos Tavares, no mês passado. Ele, porém, rejeitou a ideia de sobretaxas. “Não achamos que o protecionismo nos dará uma saída de longo prazo”. (O Estado de S. Paulo)