Estudo aponta caminhos para a descarbonização

O Estado de S. Paulo/Mobilidade

 

O debate sobre a descarbonização de veículos leves e pesados e máquinas agrícolas tem provocado o engajamento de muitas empresas e entidades da cadeia automotiva brasileira.

 

Uma das mais recentes iniciativas chama-se Mobilidade de Baixo Carbono para o Brasil (MBCB), um acordo de cooperação formado por 28 companhias de bioenergia, montadoras, autopeças, pós-venda, entidades de tecnologia e engenharia, além de sindicatos de trabalhadores.

 

O movimento foi criado com o objetivo de fornecer subsídios e informações para difundir todas as rotas tecnológicas possíveis da mobilidade brasileira, incentivando o uso de biocombustíveis e bioeletrificação renováveis.

 

Para ter a dimensão real do cenário da transição energética no País e possíveis caminhos a seguir, o MBCB encomendou um estudo inédito para a LCA Consultores e MTempo Capital. O levantamento durou dez meses e aponta que não há uma solução única para reduzir as emissões de dióxido de carbono (CO2) dos veículos. Mas algumas soluções mostram-se mais efetivas que outras.

 

Vetor de sucesso

 

Segundo o estudo, a combinação de biocombustíveis com os modelos híbridos tende a apresentar resultados mais impactantes na economia e no meio ambiente, em comparação à projeção que privilegia os carros totalmente elétricos.

 

“Não há dúvida de que a mobilidade é um dos vetores mais importantes para a descarbonização na indústria automotiva nacional”, acredita Luciano Coutinho, diretor da MTempo Capital.

 

A pesquisa, batizada de “Trajetórias tecnológicas mais eficientes para a descarbonização da mobilidade”, adotou como ponto de partida três cenários para a eletrificação da frota brasileira até 2050.

 

O primeiro é chamado de status quo – em que não há alterações estruturais na situação atual. O segundo dá ênfase aos veículos híbridos e o terceiro apresenta a predominância dos elétricos puros.

 

Uma das conclusões é que a eletrificação veicular caminha mais fortemente na direção da tecnologia híbrida. O relatório aponta também que o Brasil pode assumir papel de protagonismo na transição energética global, graças às soluções limpas disponíveis, às tecnologias já existentes e as que estão em desenvolvimento.

 

“O País encontra-se na linha de frente no aperfeiçoamento de combustíveis de baixo carbono, como etanol, biodiesel, hidrogênio, biogás, biometano, diesel verde e baterias”, celebra Aroaldo Oliveira da Silva, integrante do conselho do MBCB.

 

Ciclo de vida

 

As soluções visam também estabelecer uma nova realidade aos veículos pesados. De acordo com o estudo, eles são responsáveis por 57% das emissões totais de CO2 no Brasil. “A estratégia de desenvolvimento econômico passa diretamente pela mobilidade e reduzir os gases de efeito estufa (GEE) é palavra de ordem”, diz Coutinho.

 

Segundo o MBCB, o debate acerca da descarbonização deve considerar um aspecto complexo sobre o ciclo de vida dos veículos. A metodologia adotada no Brasil, denominada “poço à roda”, considera as emissões de CO2 a partir da produção dos combustíveis até o uso do veículo, sistema que beneficia o carro elétrico. O movimento, porém, enfatiza que a literatura internacional especializada recomenda a medida de emissões no ciclo de vida completo, denominado “berço à roda”. Ele engloba também fases relevantes de produção, incluindo peças e componentes.

 

Dessa forma, no conceito “poço à roda”, o veículo 100% elétrico emite 13,3 gCO2/km (gramas de dióxido de carbono por quilômetro rodado), contra 75,4 gCO2/km do modelo híbrido flex, 91 gCO2/km do flex, 143,4 do gasolina e 202,8 gCO2/km do diesel.

 

O cenário muda quando se considera o ciclo “berço à roda”. Nesse caso, a vantagem é do híbrido flex (77,5 gCO2/km), à frente do elétrico (104,8 gCO2/km), flex (120 gCO2/km) e gasolina (269,3 gCO2/km).

 

Aumento do PIB

 

No aspecto econômico, as projeções até 2050 revelam que os veículos híbridos igualmente levam a melhor em relação aos elétricos, com aumento de R$ 877 bilhões no Produto Interno Bruto (PIB) e a geração de empregos na ordem de 1,06 milhão no setor de transporte.

 

“Tivemos o cuidado de não indicar um cenário vencedor, porque o estudo respeita as estratégias das empresas e as preferências dos consumidores”, destaca Coutinho. “O importante é que todas as alternativas de descarbonização sejam competitivas e conciliem sustentabilidade ambiental, social e econômica.”

 

Mesmo assim, ele ressalta que o quadro de predominância de veículos elétricos poderia causar perdas consideráveis para a economia brasileira, devido à queda de produção de peças e a dependência da importação de componentes estratégicos para as baterias. “Nesse caso, a previsão é de falta de escala e ausência de incentivos”, adverte. (O Estado de S. Paulo/Mobilidade/Mário Sérgio Venditti)