Eletrificação dos ônibus no transporte público é morosa

O Estado de S. Paulo

 

Nas ruas históricas de Salvador (BA), dois ônibus elétricos entraram em circulação na última semana. No Paraná, a Expresso Princesa dos Campos lançou “o primeiro ônibus rodoviário intermunicipal 100% elétrico do Brasil”, no trajeto Curitiba–ponta Grossa. Em São José dos Campos (SP), começam a circular, até o final do ano, os 12 primeiros ônibus articulados elétricos do País, o VLP (veículo leve sobre pneus) Verde.

 

Em fase de testes ou em implementação, a eletromobilidade no transporte público avança lentamente no Brasil, em descompasso com o resto do mundo. Reduzir a emissão de poluentes gerados no transporte, melhorar a qualidade dos serviços para recuperar passageiros e reduzir o número de carros particulares nas ruas são um caminho sem volta.

 

“A eletrificação é possível, mas custa muito. No modelo atual, é impossível pensar um transporte público com energia limpa, no Brasil”, afirma Otávio Vieira da Cunha Filho, presidente da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU).

 

Mudanças na infraestrutura das cidades, com mais corredores e faixas exclusivas para ônibus, uso intensivo de tecnologias digitais nos serviços e mudança do modelo de negócio são essenciais, segundo especialistas e empresários do setor.

 

Sistema em risco

 

“O quadro do transporte público, no Brasil, é o de um tabuleiro de xadrez, em xeque. O setor não tem muita alternativa. Se for mantido esse quadro, o transporte terá que ser assumido pelo Poder Público”, afirma o presidente da NTU.

 

No País, são 107 mil ônibus e 40,4 milhões de viagens por dia, segundo a NTU. Antes mesmo da pandemia, houve redução de até 50% no volume de passageiros. Nem 1% da frota entrou na era da eletromobilidade. São, pelo menos, 350 ônibus eletrificados em operação.

 

Reestruturação

 

A eletrificação dos ônibus, sem melhorar a qualidade dos serviços, não vai resolver o problema de mobilidade. Tempo de viagem menor, maior confiabilidade e conforto aos usuários são fundamentais. Afinal, nesse quesito, um ônibus movido a eletricidade preso no congestionamento é quase igual a um ônibus a diesel preso no congestionamento. Nada muda nada.

 

Segundo Otávio Cunha, “é inviável imaginar o futuro, na mudança de matriz energética, sem nenhuma política estabelecida. É preciso reestruturar todo o sistema. O mundo está trabalhando na eletrificação. O caminho do futuro é esse, mas precisamos de uma reestruturação no modelo. Só assim, podemos pensar em ter ônibus elétrico, com matriz energética mais limpa”.

 

Atraso

 

São 421 mil ônibus elétricos no mundo, a grande maioria na China. O Brasil, que possui a maior frota de ônibus das Américas, tem ficado atrás nessa corrida. O Relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) mostra que o País estagnou na eletrificação dos ônibus do transporte público, enquanto cidades como Bogotá (Colômbia) e Cidade do México (México) se tornaram bons exemplos.

 

A plataforma E-BUS Radar, que monitora frotas de ônibus elétricos no transporte público em várias cidades latino-americanas, registrou, em julho, que 2.473 veículos zero emissão de carbono estavam em circulação em 12 países. No Brasil, São Paulo, Brasília, Santos, Maringá e Volta Redonda são cidades monitoradas pelo radar. (O Estado de S. Paulo/Ricardo Brandt)