Pontos de recarga são o oxigênio dos veículos elétricos

O Estado de S. Paulo

 

O lançamento de uma série de carros 100% elétricos no Brasil trouxe a reboque um elemento primordial para a “sobrevivência” dos modelos: os pontos de recarga de bateria. São uma espécie de “cilindro de oxigênio” dos motores eletrificados. Sem eles, os carros com esse tipo de propulsão não existiriam.

 

Quem possui um veículo elétrico não pode depender exclusivamente dos chamados eletropostos – locais de carregamento públicos mostrados nas páginas 1 e 2 desta edição – para reabastecer as baterias. O usuário sabe que terá de instalar na garagem de casa um recarregador doméstico de 11 kw ou 22 kw e que não é barato.

 

O wallbox do Nissan Leaf está incluído no preço do carro (R$ 220 mil). A General Motors cobra R$ 6.900 pelo recarregador do Chevrolet Bolt, valor que pode oscilar dependendo da complexidade da instalação. O da JAC Motors vai de R$ 3 mil a R$ 7 mil. “Ter o carregador doméstico é fundamental”, atesta Eduardo Sousa, presidente da Electric Mobility Brasil e diretor de infraestrutura da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE).

 

As marcas que vendem veículo elétrico no Brasil, em geral, firmam parceria com empresas de fornecimento de energia, que se incumbem da colocação do ponto de recarga na residência do proprietário. “É como recarregar bateria de celular. O ideal é fazer o processo mais lento, durante a noite, quando o automóvel não está sendo usado”, afirma Davi Bertoncello, presidente da Tupinambá Energia e Embaixador da Mobilidade (veja artigo na página 3).

 

As construtoras demonstram interesse em deixar seus empreendimentos com a infraestrutura adequada para o recarregamento do carro elétrico. O projeto de um imóvel que será entregue daqui a dois ou três anos prevê pontos de carregamento nas garagens, cobrando separadamente a energia elétrica consumida. “Alguns condomínios têm apenas um carregador. Não importa, já é um começo”, acredita Eduardo Sousa.

 

“Equipamentos inteligentes são capazes de individualizar a conta para não deixar um morador feliz e 99 bravos”, diz Bertoncello. Ele calcula que existem no Brasil em torno de mil pontos de carregamento, quase metade deles está em locais públicos, como rodovias, shopping centers e lojas de conveniência.

 

Transição de cinco a sete anos

 

A trajetória do veículo elétrico no País ainda está no começo, mas Bertoncello revela que o Brasil enfrenta, por enquanto, um déficit no abastecimento de energia. “São 25 donos de carro elétrico para cada posto de recarga, enquanto nos Estados Unidos a proporção é de quatro para um”, ressalta. “O cenário deverá mudar por aqui entre cinco e sete anos, quando essa transição estará bem acelerada, a ponto de haver quatro carregadores para cada bomba de combustível fóssil.”

 

O equipamento dos eletropostos não é igual ao dos pontos domésticos. Na garagem de casa ou dos condomínios, o tempo da operação leva, em média, oito horas, ao passo que nos locais públicos a espera é de 20 a 40 minutos, conforme o nível de carga acrescentado.

 

O conceito da utilização explica a diferença. Em casa, o reabastecimento é feito sem pressa, no horário em que a energia é mais barata. Os eletropostos, por sua vez, possuem equipamentos de carga ultrarrápidos, usados na maioria das vezes para dar uma carga extra na bateria, durante uma breve pausa na viagem.

 

Ou, se o motorista vai ao shopping, por que não adicionar um pouco mais de carga enquanto o carro está parado? “É o chamado abastecimento por conveniência. O eletroabastecimento é como o wi-fi, serve para dar um suporte adicional. Mas o correto é completar a carga em casa”, salienta Bertoncello.

 

O valor do equipamento é alto. Segundo Davi Bertoncello, a instalação do eletroposto de 22 kw (considerado semirrápido) é de R$ 20 mil, bem inferior aos R$ 220 mil da de 50 kw (ultrarrápido). “Os eletropostos exigem projetos de construção civil, fiação e alvarás, limitadores inexistentes nos postos das residências”, explica.

 

A instalação residencial é mais simples. Basicamente, requer só um cabo plugado no carro e que se conecta ao painel de recarga. “O equipamento nem sequer exige manutenção. Não tem dispositivos complexos e tampouco emite calor”, garante Eduardo Sousa.

 

Um dos receios do proprietário do carro elétrico é não encontrar oferta de energia ao longo de uma viagem mais longa. Estudos das empresas fornecedoras de energia, porém, já vislumbram a proliferação de eletrovias, uma malha abrangente interligando as cidades com a infraestrutura necessária. Além do corredor elétrico da Rodovia Presidente Dutra, há em Santa Catarina eletropostos em serviço entre Florianópolis e Joinville.

 

Utilização simples

 

Outra pergunta comum é se um quadro de recarga doméstico serve para modelos de marcas distintas. Afinal, com o tempo, o consumidor pode trocar seu veículo por um de fabricante concorrente. A resposta é sim. Há dois conectores em uso no mercado brasileiro: o Tipo 1 e o Tipo 2. Apenas o Nissan Leaf adota o Tipo 1, ao contrário de Renault, JAC, BMW, Volkswagen, General Motors e Porsche, que utilizam o Tipo 2. Dessa forma, o conector é compatível entre esses carros, o que dá mais flexibilidade na hora da compra.

 

Embora o grau de dificuldade no uso do carregador doméstico seja nulo, as montadoras sempre orientam os compradores sobre o manuseio do aparelho. No caso da Porsche, o modelo premium Taycan leva alguns dias até ser entregue ao proprietário. É nesse período que os técnicos contratados pela marca alemã fazem a preparação para a instalação definitiva de quadro e cabos e explicam todo o processo ao proprietário para que ele não fique com nenhuma dúvida.

 

Muito ativa nas questões da mobilidade urbana, a Porsche vem desenvolvendo um projeto batizado de “Carregamento no Destino”, que visa oferecer gratuitamente ao usuário 80 carregadores espalhados no país para veículos híbridos e elétricos, instalados em 51 estabelecimentos, como restaurantes, hotéis e shoppings. O serviço não é exclusivo aos clientes Porsche.

 

“Outra frente de atuação é a parceria com Audi, Volkswagen e EDP, empresa portuguesa de fornecimento de energia, para alimentar uma rota com rede de carga ultrarrápida, saindo de São Paulo e se conectando com capitais vizinhas, como Belo Horizonte e Curitiba”, afirma Rodrigo Fonseca, especialista de e-performance da Porsche. “A meta é concluir esse projeto em 2022 com um total de 30 postos e investimento de R$ 30 milhões.” São medidas que aproximam cada vez mais o consumidor brasileiro da realidade do carro elétrico. (O Estado de S. Paulo/Mário Sérgio Venditti)