Caminhão Euro 6 terá dois sistemas para tratar poluentes

Carga Pesada

 

A fase 8 do Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve), ou Euro 6, que traz novas regras ambientais para motores de veículos, será um desafio muito maior para o transportador que a fase 7, ou Euro 5, implantada em 2012. Atualmente, na fase Euro 5, os caminhões são equipados com apenas um de dois sistemas existentes para tratamento de gases, o SCR ou o EGR. No Euro 6, terão de conjugar as duas tecnologias.

 

As novas regras estão previstas para terem início no início do próximo anos, mas a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) espera que o prazo seja adiado. Leia mais clicando aqui.

 

Segundo Wilson Rebello, consultor na área de transportes e assessor do Sindicato das Empresas de Transporte de Carga do Paraná (Setcepar), os frotistas terão de redobrar cuidados com a qualidade dos combustíveis, lubrificantes e do arla 32 que utilizam. O caminhão vai ficar um pouco mais pesado e mais complexo, exigindo das empresas uma “reengenharia de processos” internos.

 

Ele alerta que cabe aos sindicatos que representam as transportadoras “tocarem a buzina” para alertar sobre os desafios do Euro 6, de modo que ninguém seja “pego de surpresa” com a entrada em vigor das novas regras.

 

Rebello explica como funcionam os dois sistemas usados para reduzir a emissão de poluentes:

 

Uma das principais características do SCR (Selective Catalytic Reduction ou Redução Catalítica Seletiva) é a necessidade de abastecer o caminhão com um composto de ureia chamado arla 32. O veículo conta com um sensor que mede em tempo real como está a emissão do óxido de nitrogênio (NOx) no escapamento. “A central eletrônica do arla regula a mistura entre o arla e o nível de NOx. Quando o nível de NOx sobe ou desce, imediatamente o sistema adéqua a quantidade de arla, que, ao se misturar com os gases de escape, faz a redução catalítica seletiva, convertendo as partículas de NOx em nitrogênio e água”, conta.

 

Já o EGR (Exhaust Gas Recirculation ou Recirculação de Gases de Exaustão) não utiliza arla. O sistema faz com que até 30% do gás de escape volte para dentro da câmara de combustão e assim “empobrece” a mistura, tornando a queima menos eficiente e diminuindo a temperatura. “Dessa forma, o sistema promove uma significativa redução nos níveis de NOx, mas gera mais material particulado”, explica. Um filtro chamado DPF retém mais de 90% deste material particulado, liberando “gases limpos” para a atmosfera.

 

Rebello alerta que, em ambos os sistemas, é necessário fazer o processo de regeneração ativa ou passiva do catalisador do arla (no SCR) e do filtro DFP (no EGR). “Em alguns casos, um procedimento externo de limpeza será necessário e, em casos extremos, esses elementos deverão ser substituídos”, explica.

 

Complexidade

 

No Euro 6, os dois sistemas conjugados vão tornar o motor mais complexo. “Não vai dar mais para chamar o mecânico da esquina. Ele não vai saber sequer pôr a mão no motor”, afirma o consultor.

 

Além de mais caros – ainda não se sabe quanto -, os veículos ficarão mais pesados em até 200 quilos, aumentando a tara e reduzindo a capacidade de carga no eixo dianteiro. Se o peso exceder o limite legal nesse eixo, será preciso rearranjar a carga, modificar a arrumação, ou até mesmo deslocar a 5ª roda do caminhão para trás. “Mas isso, as montadoras, com suas engenharias, já sabem e certamente vão apresentar soluções para uma nova redistribuição de pesos.”

 

Rebello ressalta que os motores Euro 6 terão uma série de novos componentes. Entre eles, um radiador instalado junto ao bloco do motor para refrigerar o gás de escape que, em parte, será reinserido para queima na câmara de combustão. “Não se pode pegar um gás que está saindo a 700 graus e jogar na câmara de combustão sem refrigerá-lo porque esse gás vai encontrar o ar vindo do sistema de admissão a uma temperatura muito mais baixa, que acabou de passar pelo intercooler. A dinâmica de interação dos gases tem que ser perfeita”, afirma.

 

O consultor estima que, em vez de 45 litros de água em média usados no sistema de arrefecimento de um veículo de 500 cavalos, serão necessários entre 55 e 60 litros, dependendo da engenharia aplicada no motor.

 

Uma coisa leva a outra. “Você não pode ter um radiador para refrigerar os gases de escape e manter o mesmo dimensional volumétrico do sistema de refrigeração antigo”, explica Rebello. É preciso redesenhá-lo. “Então, o caminhão Euro 6 também terá um novo sistema de arrefecimento, com radiador maior, mais eficiente, e uma ventoinha proporcional. Isso não será traduzido em maior consumo de combustível porque as montadoras possuem uma série de recursos para gerenciar essa operação de refrigeração”, conta.

 

Esse sistema, segundo ele, tende a deixar o freio motor mais eficiente, tornando o caminhão mais seguro, já que a ventoinha também pode ser usada na frenagem, nas descidas.

 

O consultor ressalta que, além de resfriar o gás de escape a ser reinserido na combustão, será necessário fazer com que esse gás ganhe pressão para “competir” com o ar que entra na câmara. Para isso, o sistema requer dois turbos ou então um turbo de geometria variável, que é “extremamente eficiente” e já utilizado nos novos caminhões da DAF. “Por conta desse turbo, a DAF tem um dos melhores freios motor do mercado.”

 

Também serão necessários dois filtros, um para o sistema EGR e outro para o arla 32. “São dois filtros conjugados que custam cerca de R$ 50 mil”, conta.

 

Em ambos os sistemas, haverá a presença do catalisador para eliminar o NOx, como já existe no SCR. “O sistema será certamente mais eficiente. Entretanto, a expectativa é que ficará mais caro”, alega.

 

A estimativa é de que os dois filtros conjugados custem próximo a R$ 40 mil, dependendo da montadora.

 

Diesel

 

Se, no SCR, apesar de ilegal, é possível utilizar temporariamente um diesel mais poluente, como o S500, o EGR exige S10. “O caminhão ficará muito mais sensível. Se alguém arriscar usar o diesel mais poluente, com maior porcentagem de enxofre, vai comprometer todo o veículo em três ou quatro abastecidas.”

 

Rebello ressalta que a mistura de biodiesel no diesel já é um desafio atualmente porque, em temperaturas baixas, ela tende a acumular uma camada de borra no fundo do tanque. E a expectativa é que a mistura aumente. “Com o Euro 6, essa situação vai ser mais complicada ainda.”

 

O cuidado com relação à drenagem da água que se acumula com o diesel será fundamental. “Quanto menos enxofre tem o diesel, mais água ele acumula”, justifica. Por isso, torna-se da maior importância que a transportadora desde já passe a verificar toda a rotina de compra de diesel, arla e também lubrificantes, além das estocagens na matriz e nas filiais”, aponta.

 

O especialista ressalta que tanques subterrâneos tendem a se oxidar e os aéreos predispõem a mais condensação de água. “A necessidade de cuidados rigorosos com esses elementos será potencializada com a entrada do Euro6. É preciso fazer uma revisão de toda a cadeia de processos, desde compra e estocagem, e criar uma rotina de análise em laboratórios para acompanhar o histórico de qualidade. Com o Euro6 não haverá espaço para amadorismo”, destaca o consultor.

 

Embora muita gente não saiba, o arla 32 tem somente seis meses de validade e pode se deteriorar bem antes disso caso armazenado de forma inadequada: exposto ao sol, por exemplo. “No Euro 6, um catalisador, que poderá custar cerca de R$ 40 mil, pode ser destruído em pouco tempo com a má qualidade do arla 32 ou do diesel.”

 

O transportador terá de ser rigoroso também na escolha dos postos de combustíveis que fazem parte da sua rotina de abastecimento. “Terá que ter certeza da qualidade do diesel e arla que ele coloca em caminhões. Lembrando que não é na primeira abastecida com diesel ruim que vai fazer o caminhão apresentar problemas, mas uma sequência de abastecimentos ruins. Os prejuízos serão altos”. (Carga Pesada/Nelson Bortolin)