O Estado de S. Paulo
Preservar a memória é o objetivo que une três novos e aparentemente distintos espaços culturais de São Paulo. Localizados em diferentes regiões da cidade, todos se propõem a realizar atividades gratuitas ou com baixo custo.
O primeiro dos três abriu em outubro, quando uma casa alugada na Vila Romana, na zona oeste, se transformou no Museu da Imprensa Automotiva (Miau). No mês passado, a Escola Técnica Estadual (Etec) Parque da Juventude voltou às origens com a abertura do Espaço Memória Carandiru, na zona norte. Em maio, por sua vez, a loja Casa da Bóia vai lançar o espaço Casa da Bóia Cultural, no centro.
Dentre eles, o Espaço Memória Carandiru é o mais focado na memória recente, até por sua localização: parte da antiga enfermaria do pavilhão 4 do complexo penitenciário a que dá nome, hoje atual Etec Parque da Juventude. O local reúne 519 objetos coletados entre os anos 1980 e 2002 pela fotógrafa Maureen Bisilliat, curadora da mostra de abertura – que teve uma edição no Museu da Casa Brasileira há três anos.
De animais em papel machê a imagens de santos e facas, os itens em exposição (e mais de 280 do acervo) foram catalogados por estudantes de Museologia da Etec. “Esses objetos acabam revelando a maneira de viver, a necessidade diária dessas pessoas, até mesmo de produção artística”, comenta a coordenadora, Cecília Machado. A mostra também exibe fotografias e mais de mais de cem horas de vídeos feitos por Maureen e ex-detentos.
Mediadora do espaço, a estudante Nádia Lima, de 24 anos, comenta que alguns visitantes se surpreendem, por acreditar que o foco seria no Massacre do Carandiru. “Gostam da produção artística deles”, comenta.
Lembranças
Prestes a completar 120 anos, a Casa da Bóia preserva a memória de forma mais sutil, segundo a diretora da Casa da Bóia Cultural, Adriana Rizkallah, de 56 anos. Segundo ela, a fachada, a máquina de costura e o fogão dispostos na entrada, além dos moldes de peças (quase centenários), já atraem o olhar dos passantes e clientes da loja (de itens de metal e hidráulicos). “A Casa da Bóia está se reinventando para poder continuar, tentando trazer a comunidade que orbita no seu entorno”, explica.
Em maio, o espaço cultural terá acesso externo e a presença de monitores, além de realizar oficinas e reunir o acervo do Museu Rizkallah Jorge, criado pelo marido de Adriana e neto do fundador, Mário Rizkallah, de 66 anos, único dono da Casa da Bóia desde 1997. “Meu pai guardava tudo, e aprendi a guardar também. Aqui foi onde tudo começou”, diz ele, que coleciona até disquetes.
Suportes digitais antigos também integram o Miau, que reúne itens da imprensa automotiva que vão da primeira revista do tipo no Brasil até máquinas de escrever. O museu nasceu primeiro online, em 2013, e ganhou sede em outubro, quando a casa do jornalista automotivo Marcos Rozen, de 44 anos, já não comportava tudo. Na mostra atual, o saudosismo ganha até uma versão de um drive-in, dentro de um Del Rey original. “O carro traz essa memória afetiva, já vi gente sair daqui com os olhos marejados”, diz ele. (O Estado de S. Paulo/Priscila Mengue)