Diário do Transporte
A qualidade do ar na Grande São Paulo melhorou nos últimos 30 anos, mas a situação ainda não é nada confortável e a região metropolitana está bem atrás de grandes metrópoles mundiais em relação ao controle de emissões de poluentes.
É o que mostra um estudo realizado pela Fapesp – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, USP – Universidade de São Paulo e da Cesteb -Companhia Ambiental do Estado de São Paulo, que acompanhou a evolução das emissões de poluição nos últimos 30 anos na região metropolitana.
De acordo com o trabalho intitulado Air quality in the megacity of São Paulo: Evolution over the last 30 years and future perspectives, e que foi publicado em revistas internacionais, houve uma melhoria geral nas condições do ar da Grande São Paulo, mas a situação ainda é bastante preocupante, principalmente em relação aos veículos movidos a óleo diesel.
De acordo com o estudo, apesar do crescimento de 76% da frota total entre 2002 e 2012, com o número chegando a 11 milhões de veículos em 2014, as concentrações de poluentes diminuíram nos últimos 10 anos. Entretanto, o gás ozônio e os materiais particulados finos cresceram. Esses tipos de poluentes causam problemas de saúde e transtornos cognitivos, em especial nas crianças e idosos, e estão relacionados diretamente com as emissões por veículos a óleo diesel, como ônibus e caminhões.
A professora Maria de Fátima de Andrade, uma das autoras do estudo, disse à agência de notícias da Fapesp, que mesmo com a redução geral dos níveis de poluentes, a situação é preocupante e defende a implantação rápida de uma frota de ônibus que não sejam movidos a diesel.
“Estamos no limite de controle de emissão de poluentes por veículos leves. Se houver aumento da frota, e isso é o esperado, haverá um aumento da emissão e consequente aumento da concentração ambiental. A estratégia é diminuir a frota em circulação, ampliar o uso de transporte coletivo e buscar combustíveis mais limpos, principalmente para os veículos pesados, como ônibus, que usam diesel que ainda é altamente poluente e que podem ser substituídos, por exemplo, por combustíveis mais limpos, incluindo os elétricos ou híbridos” – defendeu a professora.
O estudo também faz comparações com realidades de outros países e mostra que a Grande São Paulo está atrasada em relação a cidades europeias e dos Estados Unidos.
O trabalho conclui que a poluição de São Paulo tem suas especificidades.
A Grande São Paulo, prossegue o levantamento, tem uma frota muito grande e antiga. A média de idade para veículos leves é de nove anos e de 10 anos para caminhões.
Já nos Estados Unidos e Europa, a média de idade dos carros é de sete anos e de oito anos para caminhões.
De acordo com o Projeto Temático Nuance-SPS, os veículos leves em São Paulo emitem 3,5 vezes mais formaldeídos e acetaldeídos que os veículos da Califórnia. As concentrações de hidrocarbonetos estão mais altas em São Paulo do que em outras cidades como Pequim, Londres, Los Angeles e Paris, mesmo com a redução desse tipo de poluente na região metropolitana.
Historicamente, o estudo mostra a importância do papel do estado, por meio de legislações e fiscalizações, para a redução da poluição.
Nos anos 1980, havia grande concentração de óxidos de enxofre (SOx), monóxido de carbono (CO), ozônio (O3), nitratos (NOX) e aldeídos (RCHO). Foi a partir dos anos de 1980, que começou de maneira mais enfática, o controle das emissões industriais com a obrigatoriedade do uso de combustíveis com baixo teor de enxofre e as alterações das fontes de combustível usadas nas caldeiras industriais. Foi nesta década também que houve a introdução do Proálcool, que passou a estimular a utilização do etanol.
Nos anos de 1990, foi registrada queda nas concentrações de enxofre, mas aumentou a quantidade de hidrocarbonetos, aldeídos e material particulado no ar. Por causa disso, foram implantadas medidas de controle nas indústrias para redução de poluição por enxofre e a instituição do rodízio de veículos somente na capital paulista.
Entretanto, as concentrações de hidrocarbonetos e material particulado ligadas ao aumento do consumo de combustíveis e da frota continuaram crescendo e a maior parte das metas de limite de emissões impostos pela legislação não foi alcançada.
Somente na década de 2000 é que começaram a ser sentidos os efeitos positivos do controle de emissões da frota de veículos leves por causa do Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores –Proconve, que teve início em 1986.
Apenas em 2010, foi registrada queda de praticamente todos os poluentes, exceto o de hidrocarbonetos e material particulado. De acordo com a professora à Agência da Fapesp, isso se deu por causa do aumento da frota e o consequente crescimento do uso de combustível.
“Apesar do controle das emissões por exaustão (dos escapamentos), houve um aumento das emissões por evaporação (abastecimento e cárter), o que explica a maior concentração de hidrocarbonetos. Já a manutenção da concentração de material particulado se deu em virtude do atraso na implementação da fase P7 do Proconve para controle de emissões de partículas pelos veículos pesados e também pelo aumento da frota”, disse.
O cálculo é de que ao menos 10 mil mortes por ano na Grande São Paulo estão atualmente ligadas à poluição por material particulado, muito encontrado no diesel, e que 17 mil mortes são relacionadas à poluição total.
Assim, é possível concluir que a demora na mudança da legislação dos padrões de emissões com base no Euro III para o Euro V pode ter custado milhares de vidas. Isso sem contar que a demora foi tanta, que a fase do Euro IV foi pulada.
A preocupação agora é saber se a demora vai se repetir para a transição do Euro V para o Euro VI, que já está em vigor nos EUA desde 2012 e na Europa desde 2015.
Estas normas obrigam medidas tecnológicas para reduzir as emissões por veículos a diesel.
Como foi provado na história, de acordo com o que próprio estudo constata, há um tempo considerável entre as mudanças de tecnologias e padrões de emissões de veículos e os resultados práticos na qualidade do ar, isso porque, a renovação da frota se dá de maneira gradativa.
Um exemplo é em relação aos ônibus. Levando em consideração que a maior parte das cidades da Grande São Paulo exige idade máxima de 10 anos para os veículos de transporte coletivo, se o ônibus mais poluente for comprado um ano antes da entrada das exigências de um novo padrão de emissões, esse veículo continuará em circulação por pelo menos nove anos até sua troca pelo modelo que já segue o novo padrão estipulado.
A pesquisadora conclui dizendo que já está provada a relação das emissões urbanas não apenas com a qualidade do ar, mas com as mudanças climáticas globais.
“Ganhamos em conhecimento da importância das emissões urbanas. Atualmente os inventários de emissões de poluentes em escala global reconhecem a importância das cidades. Em estudos anteriores era comum negligenciar emissões locais, como, por exemplo, do setor de transporte. Existem várias iniciativas mundiais para quantificar melhor a contribuição urbana … Antes existia uma estratégia de não considerar os poluentes locais urbanos como atuantes nos processos climáticos. Mais recentemente, a abordagem tem sido um pouco diferente. Os poluentes emitidos localmente e que estão relacionados com poluição do ar podem ter impacto climático também, é o caso do próprio ozônio e algumas partículas”. (Diário do Transporte/Adamo Bazani)