Lentidão no trânsito de São Paulo continua em queda: efeitos da economia ou da engenharia?

Diário do Transporte

 

A frota de carros cresce e como consequência os congestionamentos aumentam. Esta lógica não tem feito sentido segundo revelam as estatísticas de trânsito da capital paulista. Mas a explicação também se vale de outra lógica: em época de crise e aumento do desemprego cai também a circulação de pessoas. Menos gente nas ruas, mais carros sem circular, em consequência menos trânsito nas vias.

 

Balanço da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) de São Paulo, divulgado nos últimos dias, traz os dados: apesar de a capital contar com uma frota registrada de 8,3 milhões, que cresce seguidamente, o índice oficial de lentidão caiu em 2016 pelo segundo ano consecutivo.

 

Os dados são coletados no centro expandido da capital, local de maior concentração de veículos. O índice de lentidão medido em 2016 foi de 58 km, 12% menor do que os 66 km medidos no ano anterior, registrando a maior queda nos últimos seis anos.

 

Olhando para a economia tem-se a explicação para o trânsito, mas há outros dados que também é preciso levar em conta nesta equação: a política de redução de velocidade implantada na capital nestes dois anos (2015 e 2016).

 

Enquanto os especialistas se dividem em explicar qual fator foi mais decisivo para a queda da lentidão no trânsito – se a crise, que retirou carros das ruas, ou a redução de velocidade, que permitiu um trânsito com maior fluidez –, a CET informa que em 2017 a tendência é de queda no índice.

 

E a questão da velocidade, antes em queda, em 2017 entrou em viés de alta, ao menos nas marginais, importantes vias de circulação da capital.

 

Em janeiro de 2017, início de seu mandato, o prefeito de São Paulo, João Doria, reverteu a política de redução dos limites de velocidade que vinha sendo implementada por seu antecessor, Fernando Haddad. As marginais Tietê e Pinheiros tiveram os limites máximos alterados de 70 km/h para 90 km/h (pista expressa), de 60 km/h para 70 km/h (central), e 50 km/h para 60 km/h (local). A única exceção foi a faixa mais à direita da pista local, que manteve o limite de 50 km/h.

 

Tribunal de justiça mantém aumento de velocidade nas marginais

 

Se na questão da queda dos índices de lentidão do trânsito os especialistas se dividem quanto aos motivos, na relação entre velocidade e acidentes a celeuma fica por conta das estatísticas.

 

Enquanto isso, longe do campo da engenharia de tráfego, o Tribunal de Justiça de SP manteve ontem a decisão da prefeitura de SP de aumentar os limites de velocidade nas marginais Pinheiros e Tietê. O processo judicial começou quando uma organização de ciclistas, a Ciclocidade (Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo), pediu a suspensão da medida.

 

A decisão ocorreu após a 13ª Câmara de Direito Público do Tribunal ter analisado o mérito da liminar favorável à mudança dos limites de velocidade. A decisão da desembargadora Flora Maria Nesi Tossi Silva foi favorável à prefeitura, ela que também é a relatora da ação.

 

Mas como velocidade e acidentes são funções diretamente proporcionais – quanto mais veloz um veículo, maior o risco de produzir acidentes com maior gravidade –, as estatísticas apresentadas na capital têm divergido.

 

Três fontes de dados apontam tendência de aumento dos acidentes de trânsito na cidade após a decisão da prefeitura de aumentar os limites nas marginais. Em períodos diferentes em 2017, as três instituições apontaram aumento na acidentalidade:

 

Polícia Militar – com base nos acidentes com vítimas registrados nos boletins operacionais da PM. A PM registrou, no período de fevereiro a abril de 2017, 396 acidentes, ante 277 em 2016 (mesmo período);

 

Samu – Serviço Municipal de Saúde a Vítimas de Acidentes (prefeitura SP) – que contabiliza os atendimentos, de 25 de janeiro a março deste ano detectou 186 acidentes, ante 65 em 2016 no mesmo intervalo de tempo.

 

CET/dados operacionais – acidentes registrados por agentes nas ruas (dados que a Companhia não trata como “oficiais”) apontaram 106 acidentes no curto período de 1 mês (de 25 de janeiro a 23 de fevereiro de 2017), ante 46 acidentes no mesmo período em 2016.

 

Apesar de todos esses dados, tomados em períodos diferentes, apontarem tendência de elevação na acidentalidade do trânsito da capital (apesar da redução do número de veículos nas ruas ocasionado pela retração da economia), os dados oficiais da CET apontaram curva oposta: os acidentes caíram no período entre fevereiro e abril.

 

Segundo a companhia, no comparativo com o mesmo período de 2016, foram registrados 18% menos acidentes na capital: 113 em 2017, contra 138 em 2016.

 

Enquanto os dados mais confundem que explicam, as mortes no trânsito, em queda ou não, continuam altíssimas segundo padrões de civilidade. O que é mais importante? A resposta parece óbvia: que nenhuma morte no trânsito possa ser tolerada, muito menos aceita como “fatalidade”, por mais que estatísticas e especialistas tentem nos dizer o contrário. (Diário do Transporte/Alexandre Pelegi)